As
questões de 02 e 03 referem-se ao texto O Auto da Compadecida.
João Grilo: Ah isso é comigo. Vou fazer um
chamado especial, em verso. Garanto que ela vem, querem ver? (Recitando.)
Valha-me Nossa Senhora, Mãe de Deus de Nazaré! A vaca mansa dá leite, a braba
dá quando quer. A mansa dá sossegada, a braba levanta o pé.
Já fui barco, fui navio, mas hoje sou escaler. Já fui menino, fui homem, só me
falta ser mulher.
Encourado: Vá vendo a falta de respeito, viu?
João Grilo: Falta de respeito nada, rapaz! Isso é o versinho de Canário
Pardo que minha mãe cantava para eu dormir. Isso tem nada de falta de respeito!
Já fui barco, fui navio, mas hoje sou escaler. Já fui menino, fui homem, só me
falta ser mulher. Valha-me.
Nossa Senhora, Mãe de Deus de Nazaré.
Cena igual à da aparição de Nosso Senhor, e Nossa Senhora, A compadecida,
entra.
Encourado, com raiva surda: Lá vem a compadecida! Mulher em tudo se mete!
João Grilo: Falta de respeito foi isso agora, viu? A senhora se zangou com
o verso que eu recitei?
A Compadecida: Não, João, porque eu iria me zangar? Aquele é o versinho
que Canário Pardo escreveu para mim e que eu agradeço. Não deixa de ser uma
oração, uma invocação. Tem umas graças, mas isso até a torna alegre e foi coisa
de que eu sempre gostei. Quem gosta de tristeza é o diabo.
João Grilo: É porque esse camarada aí, tudo o que se diz ele enrasca a
gente, dizendo que é falta de respeito.
A Compadecida: É máscara dele, João. Como todo fariseu, o diabo é muito
apegado às formas exteriores. É um fariseu consumado.
Encourado: Protesto.
Manuel: Eu já sei que você protesta, mas não tenho o que fazer, meu velho.
Discordar de minha mãe é que eu não vou.
(...)
Fonte: Auto
da Compadecida. 15 ed. Rio de Janeiro: Agir, 1979.
1. O texto de O auto da Compadecida usa denotação
ou conotação? Justifique.
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2. O texto O auto da Compadecida é um texto de
divulgação científica, um editorial ou texto teatral? __________________________________________________
3.O texto em estudo usa:
a) Discurso direto, mostrando as falas das
personagens diretamente.
b) Discurso indireto, mostrando as falas das
personagens indiretamente.
c) Discurso direto, mostrando as falas das
personagens indiretamente.
d) Discurso indireto, mostrando as falas das
personagens diretamente.
Leia o texto e faça o que se pede:
Vida em
família
[...]
Julinho provoca o pai que mal desviou o olhar do
prato à sua chegada.
A provocação dissimulada era uma das táticas
preferidas de guerrilha familiar no confronto não-declarado com Alberto, em
constante desacordo sobre sua forma de viver e pensar o mundo.
O garoto permanecia ali, imóvel, expondo-se como
um manequim de vitrine e nem Vera nem Alberto percebiam seus pés descalços.
Entre dentadas e comentários tão triviais quanto
o repasto, a mãe anunciou uma surpresa, mas antes que pudesse dizê-la, o filho
agitou os dedos do pé, acenando para sua desatenção.
— Você está sem sapatos, filho! Que houve?
Julinho esboçou um sorriso sarcástico,
agradecendo enfim pela observação, fixou o polegar esquerdo na palma da mão
direita e girou os dedos
no clássico gesto que significa “roubo”. Vera
pulou da cadeira:
— Meu Deus! Você foi assaltado!
— De novo? — reagiu o pai, largando o osso e
chupando os dedos.
— Foi agora? Como? Onde? Fala! Diz!
— O pivete me abordou ali na ciclovia da Lagoa e
com uma faca nas mãos mandou que eu tirasse o tênis.
— Tênis? Aquele tênis que eu trouxe dos Estados
Unidos mês passado?
– assombrou-se o pai. — Que custou uma
fortuna...?
O garoto concordou com a cabeça, sem dizer
palavra, sem alargar os gestos, represando emoção. Era o terceiro assalto que
sofria e, para quem
acabara de ver o brilho de uma lâmina
espetando-lhe as costelas, demonstrava uma tranquilidade irritante. Talvez por
entender que os assaltos são parte da rotina
da vida. Talvez por desconhecer o preço de um
tênis Platinum, de série limitada.
Julinho tornava-se espectador da sua própria
cena. Enquanto os pais discutiam o melhor comportamento a seguir diante de um
assaltante empunhando
uma arma branca, ele revia seu algoz na telinha
da imaginação. Uma visão parcial, encoberta pelas sombras da noite que não lhe
permitiam distinguir outros traços
além dos olhos verdes e a cara de lua cheia. O
garoto já o percebera antes, no mesmo local, sempre sozinho, a olhar o céu,
distraído demais para infundir
temor aos passantes. Desta vez, o mulato alto e
magro como Julinho fazia-se acompanhar por um bando de meninos maltrapilhos
que, bem mais baixos,
lembravam jogadores de um time infantil à volta
de um treinador adulto. O garoto surpreendeu-se com a abordagem, é fato, mas
muito mais com o comportamento
do assaltante que parecia ensinar aos pirralhos o
modo correto de praticar um assalto.
— E vai ficar por isso mesmo? — a voz de Alberto
adquiriu um tom de afronta.
Julinho respondeu com um leve movimento de
ombros, murmurando por entre os dentes: “Deixa pra lá, pai”. Foi o que faltava
para Alberto pôr sua raiva em movimento:
— Deixa pra lá? Você fala assim porque o
dinheiro não sai do seu bolso. É por isso que a violência não diminui.
Ninguém dá queixa. Ninguém faz nada. Todo mundo
deixa pra lá! Eu não vou deixar! Eu não vou deixar! — e repetiu escandindo as
sílabas:
— Não vou deixar!
O garoto ouviu-o impassível, sem autoridade para
contestá-lo, mas Vera reagiu chamando o marido à razão:
— Alberto! Você não vai sair por aí feito um
maluco por causa de um par de tênis!
— Podia ser um grampo! — esbravejou. — De hoje
em diante, vou atrás do que é meu, seja lá o que for. Não aguento mais ser
saqueado por essa bandidagem. Já foi carro, relógio, bolsa, rádio...
Alberto ajeitou-se na cadeira e, assumindo ares
de delegado de polícia, espetou o dedo indicador na mesa perguntando ao filho
em que ponto da ciclovia exatamente ocorreu o assalto. Julinho preferiu baixar
os olhos e
continuar em silêncio, que ele conhecia muito
bem o temperamento do pai e não queria vê-lo envolvido em mais violência.
Alberto aguardou a resposta e, sem obtê-la, ergueu-se impetuoso:
— Muito bem! Você não diz, mas eu vou descobrir.
Vou à Polícia, à Interpol, ao Exército, onde for preciso, mas vou trazer esse
tênis de volta ou não me chamo Alberto Calmon! De agora em diante, vai ser na
lei do cão!
Julinho olhou para os pés descalços e, por
alguma razão, pensou no tênis, apenas um calçado para ele, talvez um pequeno
sonho para o pivete. Estranho pensamento. [...]
Carlos Eduardo Novaes. O Imperador da Ursa
Maior. São Paulo: Ática, 2000. (Fragmento).
Vocabulário:
repasto - refeição
algoz - aquele que trata outro com crueldade,
carrasco
4. Julinho e o pai não se entendiam muito
bem. Qual fato pode comprovar essa afirmação?
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5. Segundo o texto, a tensão familiar
concentrava-se na relação entre Julinho e seu pai, Alberto. De que maneira
Julinho provocava o pai?
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6. Por que Alberto e o filho não se davam bem?
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7. Apesar do susto, Julinho mantinha-se
aparentemente calmo e ironizava a situação. Por que Julinho procurou não
revelar suas emoções?
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8. O narrador descreve a tranquilidade do menino
como 'irritante'. Ela era irritante para quem?
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9. "Julinho tornava-se espectador da sua
própria cena". De que cena ele estava sendo espectador?
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10. Por que o narrador classifica o pensamento
de Julinho como "estranho"?
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Boa
Prova!
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