Pré-Modernismo
1. Contexto histórico
Na Europa, começo do século foi
uma época de conturbação política. A disputa das nações desenvolvidas por
mercados e por fontes de matéria-prima acabaria por conduzir a I Guerra Mundial,
em 1914. O panorama social brasileiro, embora um pouco distante desse âmbito de
luta internacional , não era menos complexo .
Os fatos falam por si. Uma série
de revoltas eclodiram em todo o país. Os motivos eram diversos, as situações
eram bem diferentes, as reivindicações eram várias. Mas esses acontecimentos
tiveram um papel decisivo na passagem da República da Espada (primeiros governos
republicanos, que eram militares ) para a República do café-com-leite
(predominantemente civil ) e no enfraquecimento da República Velha ( 1889-1930
) .
Em 1893, tem lugar no Rio de
Janeiro a Revolta da Armada, levante de uma facção monarquista da Marinha brasileira,
que, insatisfeita, com a República recém-proclamada (1889), exigia a renúncia
do presidente Floriano Peixoto. O restante das Forças Armadas, contudo,
colocou-se ao lado do governante, que contava anda com forte apoio civil,
graças à sua imensa popularidade. A revolta foi sufocada após seis meses.
Em 1896, estourou na Bahia a
revolta de sertanejos que ficou conhecida como Guerra de Canudos. Inicialmente,
foi encarada com desprezo pelo governo federal. Mas a persistência dos
revoltosos e o arraigado apego à terra que demonstravam, obrigaram o Exército a
uma ação mais dura. A propaganda oficial divulgava o fato como um levante de monarquistas,
tentando, com isso, angariar a simpatia da população e o auxílio de forças
militares dos diversos estados. No entanto, as causas mais profundas da Guerra
eram outras: a miséria, o subdesenvolvimento, a opressão, o abandono a que a
população da região estava relegada. Depois de um ano de renhida resistência,
Canudos caiu em outubro de 1897. Mas os problemas sociais não foram resolvidos,
e o misticismo e o cangaço continuaram sendo respostas populares à opressão e à
miséria.
Nos primeiros anos do século XX,
as autoridades do Rio de Janeiro resolveram urbanizar e modernizar a cidade,
que era a capital do país, muito populosa, e que contava com péssimas condições
de higiene. O novo planejamento urbano, contudo, previa uma recolocação da
moradia dos mais pobres, excluindo-os das benesses da modernização e desamparando
grande parte da população, já massacrada pelo desemprego e pela carestia. A
insatisfação popular explodiu quando o governo lançou a campanha de vacinação
obrigatória. A verdadeira batalha que se travou no Rio de Janeiro, em 1904,
opondo policiais aos pobres, recebeu o nome de Revolta da Vacina, tendo sido
violentamente reprimida.
Em 1910, os marinheiros de dois
navios de guerra, liderados por João Cândido (o "Almirante Negro"),
manifestaram-se contrários aos castigos corporais ainda costumeiramente
aplicados a eles na Marinha: era a Revolta da Chibata. O próprio governo
reconheceu a pertinência das reivindicações, pressionando a Marinha para que as
atendesse. Os revoltosos foram anistiados, mas logo depois perseguidos, presos
e torturados.
Outro acontecimento importante
do período foi a greve geral de 1917, ocorrida em São Paulo, organizada por
trabalhadores anarco-sindicalista , reivindicando melhoria nos salários e nas
condições de trabalho ( redução da jornada , segurança , etc . ) .
Em seu conjunto, essas revoltas
todas podem ser vistas como manifestações de uma nova paisagem social, na qual
forças políticas até então tímidas (sertanejos, miseráveis, no cenário, imigrantes,
soldados de baixa patente, entre outros ) começaram a marcar presença no
cenário brasileiro . No terreno artístico, o período que vai do final do século
XIX (aproximadamente 1870) até as primeiras décadas do século seguinte ( anos
20 ) recebe o nome geral de "belle époque".
As transformações sociais, da
passagem do século, experimentadas no Brasil, necessariamente impregnariam a literatura,
principalmente em um momento em que uma das propostas artísticas em vigor toca
justamente no ponto de uma retomada da literatura social. Assim, podemos falar
mesmo em uma redescoberta do Brasil pela literatura. Um Brasil que, na verdade,
sempre tinha existido, mas que fora até então presença excessivamente reduzida
na literatura.
Essa redescoberta pode ser
notada a partir da renovação temática que se opera no âmbito literário. A
preocupação com a realidade nacional ocupa não apenas as obras de ficção, mas
também os ensaios, artigos e comentários eruditos, que ganham grande impulso na
época. Um aspecto comum a essa produção intelectual é a crítica às
instituições, tomadas como elementos de cristalização e acomodação de uma
estrutura de poder que resultava na cegueira às reivindicações de vastas
camadas da população brasileira.
No terreno da ficção, ambientes
antigos são explorados agora de forma a evidenciar seus aspectos mais tristes e
pobres. O sertão, o interior, os subúrbios, que já apareciam antes em romances
e natureza viviam em comunhão, agora são retratados como representações do
atraso brasileiro. Da mesma forma, os personagens que figuraram nessas
produções estão muito distantes dos modelos assumidos em estéticas anteriores:
o sertanejo não é mais servil e ordeiro; o suburbano não é mais alegre e expansivo;
o caipira não é mais saudável e trabalhador. A imagem que essas personagens
passam a representar liga-as à decadência, ao desmazelo, à ignorância.
Essa literatura que tematiza
habitantes e ambientes de determinadas regiões, pode ser considerada regionalista.
Mas , é bom que se perceba , trata-se de um regionalismo crítico, bastante diferente,
por exemplo, da idealização romântica.
Na visão dos representantes
dessa corrente , a literatura tinha uma missão a cumprir como instrumento de
denúncia social , explicitando as razões do nosso atraso , discutindo
alternativas para ele . O progresso e o cosmopolitismo que caracterizava a
auto-imagem de cidades como Rio de Janeiro e São Paulo eram contrapostos ao
subdesenvolvimento e à miséria estrutural de vastas regiões nacionais - nem
sempre muito distantes dos centros populosos , como mostraram as obras
tematizando o caipira e o morador dos subúrbios cariocas .
Formalmente, os pré-modernistas
caracterizar-se-ão por uma linguagem oscilante : expressões eruditas ,
francamente influenciadas pelo Parnasianismo , convivem com um vocabulário mais
livre e popular , que tenta funcionar como registro de expressões regionais .
Pode-se entender essa prática como uma ponte de ligação entre a linguagem
dicionaresca e cientificista do século XIX e aquela, mais despojada, que
caracterizaria a arte moderna do século XX. De certa forma, essa oscilação
reflete ainda um contato crescente entre as culturas popular e erudita.
Como dissemos, essa prática
literária não chegou a se constituir em escola, estruturada e organizada em um
programa estético definido. O Pré-Modernismo é, mais que um fato artístico, um
momento importante do desenvolvimento das letras brasileiras. Seus autores mais
significativos são: Euclides da Cunha, Lima Barreto, Monteiro Lobato, Augusto
dos Anjos, Graça Aranha, entre outros.
3. Resumindo.
INÍCIO: 1902 - Publicação de Os sertões, Euclides da Cunha.
TÉRMINO: 1992 - Semana de Arte Moderna
TÉRMINO: 1992 - Semana de Arte Moderna
PAINEL DE ÉPOCA
·
Reflexão
sobre a realidade brasileira.
·
Denúncia,
protesto e compromisso social.
·
União do
tradicional; com o moderno.
·
Momento
de transição da literatura.
·
Momento
de transição da literatura Acadêmica para literatura Moderna
AUTORES
I) EUCLIDES DA CUNHA
·
Análise
científica da sociedade brasileira: Os Sertões.
·
Diferenças
da cultura litorânea e do interior.
·
Presença
do determinismo na obra: o homem é vítima do processo social, geográfico.
·
A vida do
sertanejo, sem fantasias.
II) GRAÇA ARANHA
·
Ajudou
bastante os jovens da Semana de Arte Moderna de 22.
·
Consciência
dos problemas do Brasil.
·
Ótica
social.
·
Falou
sobre o Espírito Santo.
·
Canaã
1902)
III) MONTEIRO LOBATO
·
Literatura
Regionalista.
·
Critica
severamente os problemas sociais.
·
Falou
sobre o Vale do Paraíba.
·
Linguagem
conservadora mas com idéias modernas.
·
Fala
sobre costumes e hábitos do nosso povo: Jeca Tatu (1919).
·
Urupês
(1918), Cidades Mortas (1919), Negrinha (1920)
IV) LIMA BARRETO
·
Cenas do
dia-a-dia analisando a vida da pequena classe média.
·
Preocupação
com a realidade brasileira.
·
Fala
sobre o subúrbio carioca.
·
Nacionalista
·
Recordações
do Escrivão Isaías Caminha (1908), Triste fim de
·
Policarpo
Quaresma (1915).
V)
AUGUSTO DOS ANJOS
Formou-se em direito, mas foi sempre
professor de Literatura. Nervoso, misantropo e solitário, este possível ateu morreu
de forte gripe antes de assumir um cargo que lhe daria mais recursos.
Publicou apenas um único livro de poesias, Eu, mais tarde reeditado como Eu e outras poesias. Sua obra é
cientificista, profundamente pessimista. Sua visão da morte como o fim, o linguajar
e os temas usados por muitos são considerados como sendo de mau gosto, mas
caracterizam sua poesia como única na literatura brasileira.
"Já o verme — este operário das ruínas —
/ Que o sangue podre das carnificinas / Come e à vida em geral declara
guerra,"
Trabalhou, assim como parnasianos e
simbolistas, com sonetos e verso decassílabo. Sua visão de mundo e a
interrogação do mistério da existência e do estar-no-mundo marcam esta nova
vertente poética. Há uma aflição pessoal demonstrada com intensidade dramática,
além do pessimsmo. Constância da morte, desintegração e os vermes.
"A passagem dos séculos me assombra. /
Para onde irá correndo minha sombra / Nesse cavalo de eletricidade?! / Quem
sou? Para onde vou? Qual minha origem? / E parece-me um sonho a
realidade."
Obra
Principal:
·
Poesias
- Eu (1912)
As Vanguardas Européias
(início
do século XX)
I) FUTURISMO:
·
Lançado
por Marinetti no manifesto “Le Futurisme”, 1909.
·
Surge
entre o Simbolismo e a 1ª Guerra Mundial.
·
Exalta a
vida moderna.
·
Culto da
máquina e da velocidade.
·
Destruição
do passado e do academicismo
·
Liberdade
de expressão.
II) EXPRESSIONISMO:
·
Paralelo
ao Futurismo e Cubismo.
·
Surge em
1910 pela revista “Der Sturn”.
·
A arte
brota da vida interior; do íntimo do ser.
·
A
obscuridade do ser é transportada para a expressão.
·
As telas
retratam o patético, os vícios, os horrores, a guerra.
·
Protesta
contra a violência e usa cores explosivas.
·
Reflete a
crise de consciência gerada pela guerra.
III) CUBISMO
·
Decomposição
da realidade em figuras geométricas.
·
Manifesta-se
a partir de 1917, na literatura.
·
Seu
divulgador foi Appolinaire.
·
Decomposição
da imagem em diferentes planos.
·
Desintegração
da realidade gerando uma poesia ausente de lógica.
·
Linguagem
caótica.
IV) DADAÍSMO
·
Surge em
1916, em Zurique.
·
Promove
um certo terrorismo cultural.
·
Contraria
todos os valores vigentes até então.
·
Valoriza
o niilismo (descrença absoluta)
·
Mundo
ilógico.
·
Cultua a
realidade mágica da infância.
·
Seu
principal divulgador foi Tristan Tzara.
V) SURREALISMO
·
Surge em
1924 com o Manifesto Surrealista de André Breton.
·
Propõe
que o homem se liberte da razão, da crítica, da lógica.
·
Adere a
filosofia de Sigmund Freud.
·
Expressa
o interior humano investigando o inconsciente.
Análise dos Livros do
vestibular
1º livro: “O Pagador de Promessas”
Estrutura e características
Dias
Gomes escreve, em 1959, o brasileiríssimo texto de O Pagador de Promessas.
É o interessante retrato da miscigenação religiosa brasileira, tem em sua maior
preocupação destacar a sincera ingenuidade e devoção do povo, em oposição a
burocratização imposta pelo próprio sistema católico em sua organização
interior. Se trata de uma obra de estatura excepcional. Décio de Almeida Prado
refere-se a ela como "um instante de graça" por ter seu autor
atingido um ápice, "aquela obra que congrega numa estrutura perfeita todos
os seus dons mais pessoais".
Nos moldes do "protagonismo" trágico, o herói da peça tem um único e inabalável desígnio, o de honrar uma promessa. A justiça desse acordo firmado com um poder celeste não pode ser contestada por um poder temporal. E é assim, com um único e irredutível argumento, que o campônio Zé do Burro justifica a sua determinação em levar uma cruz até o pé do altar para agradecer a salvação do seu amado burrico. Enfrenta a perda amorosa, a argumentação eclesiástica e a força da lei e acaba por vencer a todos na sua ingênua, mas sincera, imitação de Cristo.
A essa estrutura simples, em que um único motivo impulsiona a ação e se sobrepõe a todos os outros elementos de composição do texto, corresponde uma expressão verbal verossímil e sem atavios literários. Respondendo à sugestão da mulher para que se contente em deixar a cruz na porta da igreja, Zé do Burro responde: "Eu prometi levar a cruz até dentro da igreja, tenho que levar. Andei sete léguas. Não vou me sujar com a santa por causa de meio metro." A habilidade de fazer com que o impulso nobre, quase extra-humano na sua pureza, se ajuste à fala coloquial permanece uma constante nas criações posteriores do dramaturgo.
É uma obra escrita para teatro e é dividida em três atos, sendo que os dois primeiros ainda são subdivididos em dois quadros cada um.
Após a apresentação dos personagens, o primeiro ato mostra a chegada do protagonista Zé do Burro e sua mulher Rosa, vindos do interior, a uma igreja de Salvador e termina com a negativa do padre em permitir o cumprimento da promessa feita.
O segundo ato traz o aparecimento de diversos novos personagens, todos envolvidos na questão do cumprimento ou não da promessa e vai até uma nova negativa do padre, o que ocasiona, desta vez, explosão colérica em Zé do Burro.
O terceiro ato é onde as ações recrudescem, as incompreensões vão ao limite e se verifica o dramático desfecho.
A peça de Dias Gomes tem nítidos propósitos de evidenciar certas questões sÓcio-culturais da vida brasileira, em detrimento do aprofundamento psicológico de seus personagens. Assim, ganha força no drama a visão crítica quanto:
a) à intolerância da Igreja católica, personificada no autoritarismo do Padre Olavo, e na insensibilidade do Monsenhor convocado a resolver o problema;
b) à incapacidade das autoridades que representam o Estado - no episódio, a polícia - de lidar com questões multiculturais, transformando um caso de diferença cultural em um caso policial;
c) à voracidade inescrupulosa da imprensa, simbolizada no Repórter, um perfeito mau-caráter, completamente desinteressado no drama do protagonista, mas muito interessado na repercussão que a história pode ter;
d) ao grande fosso que separa, ainda, o Brasil urbano do Brasil rural: Zé do Burro não consegue compreender por que lhe tentam impedir de cumprir sua promessa; os padres, a polícia, a imprensa não conseguem compreender quem é Zé do Burro, sua origem ingênua, com outros códigos culturais, outras posturas. Além disso, a peça mostra as variadas facetas populares: o gigolô esperto, a vendedora de quitutes, o poeta improvisador, os capoeiristas. O final simbólico aponta em duas direções. Em primeiro lugar a morte do Zé do Burro mostra-se com fim inevitável para o choque cultural violento que se opera na peça: ninguém, entre as autoridades da cidade grande, é capaz de assimilar o sincretismo religioso tão característico de grandes camadas sociais no Brasil, especialmente no interior nordestino. Em segundo lugar, a entrada dos capoeiristas na igreja, carregando a cruz com o corpo, sinaliza para rechaçar a inutilidade daquela morte: os populares compreenderam o gesto de Zé do Burro.
Nos moldes do "protagonismo" trágico, o herói da peça tem um único e inabalável desígnio, o de honrar uma promessa. A justiça desse acordo firmado com um poder celeste não pode ser contestada por um poder temporal. E é assim, com um único e irredutível argumento, que o campônio Zé do Burro justifica a sua determinação em levar uma cruz até o pé do altar para agradecer a salvação do seu amado burrico. Enfrenta a perda amorosa, a argumentação eclesiástica e a força da lei e acaba por vencer a todos na sua ingênua, mas sincera, imitação de Cristo.
A essa estrutura simples, em que um único motivo impulsiona a ação e se sobrepõe a todos os outros elementos de composição do texto, corresponde uma expressão verbal verossímil e sem atavios literários. Respondendo à sugestão da mulher para que se contente em deixar a cruz na porta da igreja, Zé do Burro responde: "Eu prometi levar a cruz até dentro da igreja, tenho que levar. Andei sete léguas. Não vou me sujar com a santa por causa de meio metro." A habilidade de fazer com que o impulso nobre, quase extra-humano na sua pureza, se ajuste à fala coloquial permanece uma constante nas criações posteriores do dramaturgo.
É uma obra escrita para teatro e é dividida em três atos, sendo que os dois primeiros ainda são subdivididos em dois quadros cada um.
Após a apresentação dos personagens, o primeiro ato mostra a chegada do protagonista Zé do Burro e sua mulher Rosa, vindos do interior, a uma igreja de Salvador e termina com a negativa do padre em permitir o cumprimento da promessa feita.
O segundo ato traz o aparecimento de diversos novos personagens, todos envolvidos na questão do cumprimento ou não da promessa e vai até uma nova negativa do padre, o que ocasiona, desta vez, explosão colérica em Zé do Burro.
O terceiro ato é onde as ações recrudescem, as incompreensões vão ao limite e se verifica o dramático desfecho.
A peça de Dias Gomes tem nítidos propósitos de evidenciar certas questões sÓcio-culturais da vida brasileira, em detrimento do aprofundamento psicológico de seus personagens. Assim, ganha força no drama a visão crítica quanto:
a) à intolerância da Igreja católica, personificada no autoritarismo do Padre Olavo, e na insensibilidade do Monsenhor convocado a resolver o problema;
b) à incapacidade das autoridades que representam o Estado - no episódio, a polícia - de lidar com questões multiculturais, transformando um caso de diferença cultural em um caso policial;
c) à voracidade inescrupulosa da imprensa, simbolizada no Repórter, um perfeito mau-caráter, completamente desinteressado no drama do protagonista, mas muito interessado na repercussão que a história pode ter;
d) ao grande fosso que separa, ainda, o Brasil urbano do Brasil rural: Zé do Burro não consegue compreender por que lhe tentam impedir de cumprir sua promessa; os padres, a polícia, a imprensa não conseguem compreender quem é Zé do Burro, sua origem ingênua, com outros códigos culturais, outras posturas. Além disso, a peça mostra as variadas facetas populares: o gigolô esperto, a vendedora de quitutes, o poeta improvisador, os capoeiristas. O final simbólico aponta em duas direções. Em primeiro lugar a morte do Zé do Burro mostra-se com fim inevitável para o choque cultural violento que se opera na peça: ninguém, entre as autoridades da cidade grande, é capaz de assimilar o sincretismo religioso tão característico de grandes camadas sociais no Brasil, especialmente no interior nordestino. Em segundo lugar, a entrada dos capoeiristas na igreja, carregando a cruz com o corpo, sinaliza para rechaçar a inutilidade daquela morte: os populares compreenderam o gesto de Zé do Burro.
Enredo
Primeiro ato
Primeiro quadro - A ação da peça tem início nas primeiras horas da manhã (4:30h), numa praça, em frente a uma igreja, em Salvador. O personagem denominado Zé do Burro carrega uma cruz e se aloja na frente da igreja. A seu lado Rosa, sua mulher, apresentada como tendo "sangue quente" e insatisfação sexual. Zé espera a igreja abrir para cumprir sua promessa, feita a Santa Bárbara. Aparecem no lugar, algum tempo depois, Marli e Bonitão: ela prostituta; ele, gigolô. Há uma clara relação de exploração e dependência entre eles. Encontrando Zé, Bonitão dirige-se a ele e percebe ser alguém ingênuo. Rosa, por sua vez, conversando com o gigolô, queixa-se de Zé, contando que ele, na sua promessa, dividiu suas terras com lavradores pobres. Percebendo a ingenuidade, Bonitão propõe-se a providenciar um local para Rosa descansar. Zé não só aceita, como incentiva. Saem os dois, Bonitão e Rosa, de cena.
Segundo quadro - Aos poucos, começa o movimento ao redor da praça. Aparecem a Beata, o sacristão e o Padre Olavo, titular da igreja. Zé explica a promessa: Nicolau foi ferido com a queda de uma árvore; estando para morrer, Zé fez a promessa. O burro - Nicolau é um burro! - salva-se. Ingenuamente, Zé revela ter usado as rezas de Preto Zeferino e feito a promessa num terreiro de candomblé, a Iansã, equivalente afro de Santa Bárbara. O padre fica escandalizado. Estabelece-se o conflito. O sincretismo Iansã - Santa Bárbara, natural para Zé do burro, é um grandioso pecado para o padre. A situação agrava-se com a revelação da divisão de terras. Impasse. O padre manda fechar a igreja e proíbe o cumprimento da promessa. Zé do burro fica atônico.
Segundo ato
Primeiro quadro - Duas horas mais tarde, já a movimentação no lugar é intensa. O Galego, dono do bar, abriu seu estabelecimento. Surgem Minha Tia, vendedora de acarajés, carurus e outras comidas típicas, Dedé Cospe-Rima, poeta popular, ao estilo repentista e o Guarda. Zé do burro quer cumprir a promessa. O Guarda tenta intervir. Rosa reaparece com "ar culpado". Chega o Repórter. Seguindo a linha do oportunismo sensacionalista, o repórter quer tirar vantagens da história de Zé do Burro. Quer torná-lo um mártir, para virar notícia. Enquanto isso descobre-se que Rosa transou com Bonitão. Marli faz um pequeno escândalo, denunciando a história Rosa-Bonitão.
Segundo quadro - Três da tarde, Dedé oferece poemas para Zé, a fim de derrotar o Padre. Aparecem, em momentos subseqüentes, o capoeirista Mestre Coca e o policial, o Secreta, chamado por Bonitão, ficando ambos, por enquanto, nas cercanias. Zé começa a perder a paciência e arma uma gritaria. O padre reage. Chega o Monsenhor, autoridade da igreja, propondo a Zé uma solução: ele, Monsenhor, na qualidade de representante da Igreja, pode liberar Zé da promessa, dando-a por cumprida. Zé não aceita, dizendo que promessa foi feita à Santa e só ela poderia liberá-lo. Segue o impasse. Zé explode novamente e avança com a cruz sobre a Igreja. O padre fecha a porta. Zé, já desesperado, bate com a cruz na porta. O drama é total.
Terceiro ato
Entardecer. Muita gente na praça e nos arredores da Igreja. Há uma roda de capoeira. O Galego, oportunista, oferece comida grátis a Zé, pois a história está trazendo movimento ao seu bar. O Secreta, no bar, avisa que a polícia prenderá Zé, ameaçando os capoeiristas, caso eles interfiram. Marli volta. Ofende Rosa, ofende Zé. O protagonista parece mudar de atitude. Resolve ir embora "à noite". Rosa quer ir embora já. Conta que Bonitão avisou a polícia. Retorna o repórter, que tenta montar um verdadeiro circo em torno do Zé, com o objetivo de vender o jornal. Chega Bonitão e convida Rosa para ir com ele. Zé pede a ela para ficar. Rosa hesita, a princípio, mas, em seguida, vai com Bonitão. Mestre Coca avisa Zé sobre a chegada da polícia. Zé está perplexo: "Santa Bárbara me abandonou". Da igreja saem o Sacristão, o Guarda, o Padre e o Delegado. Tensão da cena acentua-se. Zé ainda tenta, ingênua e inutilmente, explicar alguma coisa. Ao ser cercado, puxa uma faca. As autoridades reagem. Os capoeiristas também. Briga e confusão. De repente, um tiro espalha gente para todos os lados. Zé é mortalmente ferido. Mestre Coca olha para os companheiros, que entendem a mensagem. Os capoeiristas tomam o corpo do Zé colocam-no sobre a cruz e, ignorando padre e polícia entram na igreja, carregando a cruz.
EXERCÍCIOS
1.
(Herriot- 2009) - Quanto a Estrutura da peça O Pagador de Promessas, é possível
afirmar:
I
– O Drama é construído a partir de três atos, cada um deles dividido em dois
quadros.
II
– Os Terceiro (último) Ato apresenta um desfecho trágico: O Pagador de
promessas é atingido por uma bala de revólver, que o impede de pagar sua
promessa.
III
– A recusa do Padre em não permitir que Zé-do-Burro pague a promessa nos dois
Atos iniciais demonstra, de forma individual, uma intolerância que deve ser
encarada numa extensão maior: a intolerância universal.
Está(ão)
correta(s) a(s) afirmativa(s):
a)
I b) II c) III d) I e III e) II e III
2.
(Herriot - 2009) - Dividida em três atos – sendo os dois primeiros subdivididos
em dois quadros cada um –, a peça O pagador de promessas
estrutura-se de forma simples, apresentando unidade de ação, tempo e espaço e
pouco explorando a psicologia das personagens.
Seu
enredo pode ser resumido da seguinte maneira:
I
- Após muitas discussões, Zé-do-Burro, ao tentar entrar à força na igreja, é
morto. Por fim, é posto em cima da cruz e conduzido para dentro da igreja por
alguns simpatizantes de sua causa.
II
- Com o restabelecimento do animal, Zé-do-Burro põe-se a cumprir a promessa,
primeiramente dividindo suas terras com os lavradores mais pobres do que ele.
III
- Depois caminhando rumo a Salvador, até onde deveria levar uma imensa cruz de
madeira para colocá-la no altar da Igreja de Santa Bárbara.
IV
- Zé-do-Burro e sua mulher Rosa vivem em uma pequena propriedade a sete léguas
de Salvador. Um dia, Zé-do-Burro vai a um terreiro de candomblé a fim de fazer
uma promessa a Inçam (Santa Bárbara) para que esta salvasse Nicolau, seu burro
de estimação que havia sido atingido por um raio.
V
- Esta segunda parte de sua promessa, no entanto, é impossibilitada pela
resistência do padre Olavo que, ao saber o local onde Zé-do-Burro havia feito a
promessa, não permite que ele entre na igreja com sua cruz.
A
seqüência correta dos fatos é:
a)
IV, II, III, V e I b) IV, III, II, V
e II c) III, IV, II, V e I
d)
II, IV, III, V e I e) IV, II, III, I
e V
3. (Herriot - 2009) - A
peça de Dias Gomes tem nítidos propósitos de evidenciar certas questões socioculturais
da vida brasileira, em detrimento do aprofundamento psicológico de seus
personagens. Assim, ganha força no drama a visão crítica quanto:
I -
à intolerância da Igreja católica, personificada no autoritarismo do Padre Olavo,
e na insensibilidade do Monsenhor convocado a resolver o problema;
II -
a capacidade das autoridades que representam o Estado - no episódio, a polícia
- de lidar com questões multiculturais, transformando um caso de diferença
cultural em um caso policial;
III
- à voracidade inescrupulosa da imprensa, simbolizada no Repórter, um perfeito
mau-caráter, completamente desinteressado no drama do protagonista, mas muito
interessado na repercussão que a história pode ter.
IV -
ao grande fosso que separa, ainda, o Brasil urbano do Brasil rural: Zé do Burro
não consegue compreender por que lhe tentam impedir de cumprir sua promessa; os
padres, a polícia, a imprensa não conseguem compreender quem é Zé do Burro, sua
origem ingênua, com outros códigos culturais, outras posturas.
V -
Além disso, a peça não mostra as variadas facetas populares: o gigolô esperto,
a vendedora de quitutes, o poeta improvisador, os capoeiristas. O final
simbólico aponta em duas direções.
São
falsas as afirmações:
a) I, III e IV b) II e V c) II, III e V d) I, II e V e) I, III e V
4.
(Herriot- 2009) - A morte de Zé-do-Burro:
I - Em
primeiro lugar, mostra-se com fim inevitável para o choque cultural violento
que se opera na peça: ninguém, entre as autoridades da cidade grande, é capaz
de assimilar o sincretismo religioso tão característico de grandes camadas
sociais no Brasil, especialmente no interior nordestino.
II -
Em segundo lugar, a entrada dos capoeiristas na igreja, carregando a cruz com o
corpo, sinaliza para rechaçar a inutilidade daquela morte: os populares
compreenderam o gesto de Zé do Burro.
III
– Em terceiro lugar, deixa claro que distância cultural unida à intransigência
forma um binômio mortal capaz de desintegrar o homem comum.
São
corretas:
a) I
e III b) I e II c) Só a I d) I, II e III e) Só a II
5.
(Herriot – 2009) - Observe o excerto:
BONITÃO: Espere. Não adianta
andar depressa...
MARLI: É melhor discutirmos
isso em casa.
BONITÃO: (Alcança-a e obriga a parar torcendo-lhe violentamente o braço)
Não, vamos resolver aqui mesmo. Não tenho nada que discutir com você...
MARLI: (Livra-se dele com um
safanão, mas seu rosto se contrai dolorosamente) Estúpido!
BONITÃO: Ande, vamos deixar de
mas-mas. Passe pra cá o dinheiro.
MARLI: (Tira do bolso do
vestido um maço de notas e entrega a ele) Não podia esperar até chegar em casa?
BONITÃO: (Chega mais para perto
do jato de luz e conta as notas, rapidamente) Só deu isto?
MARLI: Só. A noite hoje não
foi boa. Você viu, o "castelo" estava vazio.
BONITÃO: E aquele galego que
estava conversando com você quando cheguei?
MARLI: Uma boa conversa.
Queria se fretar comigo. Ficou mangando a noite toda e não se resolveu...
BONITÃO: (Mete subitamente a
mão no decote de Marli e tira de entre os seios uma nota) Sua vaca! Ele faz menção de dar-lhe um bofetão,
ela corre e refugia-se atrás da cruz. Zé-do-Burro desperta de sua
semi-sonolência.
a) O diálogo caracteriza o discurso indireto, aspecto
comum na maoria das peças teatrais por se tratar de uma tendência estrutural do
gênero dramático.
b) Marli e Bonitão terão uma importância capital no
desenrolar da ação uma vez que ambos demonstram, pela prática de vida que
levam, total apoio a Zé-do-Burro, uma vez que não dependem da igreja sob nenuma
ótica.
c) O casal apresenta total dependência psicológica e
material um do outro, inclusive no que se refere a sobrevivência de ambos.
d) Bonitão é cafetão, Marli prostituta. O par representa
a intrasigência social já que a prática de vida que levam é rejeitada por
todos, inclusive a Igreja.
e) A dependência existente entre Bonitão e Marli chega ao
fim a partir do momento em que Rosa se deixa trair pelo assédio do Bonitão.
6. (Herriot) – 2009) - A partir do texto:
BONITÃO: Eu espero. Sua esposa me contou a caminhada que fizeram,
o senhor carregando nas costas essa cruz através de léguas e léguas, para
cumprir uma promessa. Isso me comoveu.
ZÉ: Mas não é justo. Não foi o senhor quem fez a promessa.
ROSA: Ele está querendo ajudar, Zé.
ZÉ: Mas não é direito. Eu prometi cumprir a promessa
sozinho, sem ajuda de ninguém. E essa história de dormir no hotel não está no
trato.
BONITÃO: E sua senhora está no trato?
ZÉ: Rosa? Não, ela pode ir.
BONITÃO: Nesse caso, se quiser que eu leve sua senhora... ao
menos ela descansa enquanto espera pelo senhor.
ZÉ: Você quer, Rosa? Quer ir esperar por mim no hotel?
(Volta-se para Bonitão) É hotel decente?
BONITÃO:(Fingindo-se ofendido) Ora, o senhor acha que ia
indicar...
ZÉ: Desculpe, é que sempre ouvi dizer que aqui na cidade...
BONITÃO: Pode confiar em mim.
ZÉ: É longe daqui?
BONITÃO: Não, basta subir aquela ladeira...
ZÉ: Que é que você diz, Rosa?
ROSA: (Percebendo o jogo de Bonitão) Quero não, Zé. Prefiro
ficar aqui com você.
ZÉ: Ainda agora mesmo você estava se queixando.
BONITÃO: Não é pra menos. Deve estar exausta. Sete léguas.
ZÉ: Afinal de contas, você tem razão, a promessa é minha,
não é sua. Vá com o moço, não tenha acanhamento.
BONITÃO: Eu vou com ela até lá, apresento ao porteiro, que é meu
conhecido - sim, porque uma mulher sozinha, o senhor sabe, eles não deixam
entrar - depois volto para lhe dizer o número do quarto. Daqui a pouco, depois
de cumprir a sua promessa, o senhor vai pra lá.
ZÉ: Se o senhor fizesse isso, era um grande favor. Eu não
posso me afastar daqui.
BONITÃO: Nem deve. Primeiro, Santa Bárbara.
ROSA: Zé, é melhor eu ficar com você...
ZÉ: Pra que, Rosa? Assim você vai logo descansar numa boa
cama, não precisa ficar aí deitada nesse batente frio...
BONITÃO: Um perigo! Pode pegar uma pneumonia.
ROSA: (Inicia a saída. Pára, hesitante. Pressente o perigo
que vai correr. Procura, com o olhar, fazer Zé-do-Burro compreender o seu
receio) Zé...
ZÉ: Ahn, sim. (Enfia a mão no bolso, tira um maço de notas)
Pode ser que precise pagar adiantado...
ROSA:(Recebe o dinheiro. Encara o marido) Talvez seja melhor,
depois de entregar a cruz, você mandar também rezar uma missa em ação de
graças...
a) Esse momento é crucial para as vidas de Zé e Rosa pois
demarca o início do fim de um relacionamento de oito anos entre ambos,
estremecido definitivamente pela promessa feita pelo Zé.
b) O momento é decisivo para as pretenções do Bonitão que
se enamorara de Rosa e sentiu por ela uma grande atração movida pela
sinceridade e bons propósitos.
c) Auxiliar Rosa era um ato de humanidade que o Bonitão
resolveu praticar na tentativa de aliviar suas dores e cansaço, frutos de uma
longa viagem e noites mal dormidas.
d) Zé, na sua igenuidade não vê nem um mal em Rosa ser
levada a um hotel pelo Bonitão, no que é correspondido plenamente pelo Cafetão.
e) O “sangue quente” de Rosa a faz hesitante num primeiro
momento. Depois que ela cede aos caprichos do Bonitão é movida pelo remorso e
arrependimento.
7. (Herriot -2009) – Observe o texto:
ZÉ: Mas mesmo que soubesse, eu não deixava de fazer a
promessa. Porque quando vi que nem as rezas do preto Zeferino davam jeito...
PADRE: Rezas?! Que rezas?!
ZÉ: Seu vigário me disculpe... mas eu tentei tudo. Preto
Zeferino é rezador afamado na minha zona: Sarna de cachorro, bicheira de
animal, peste de gado, tudo isso ele cura com duas rezas e três rabiscos no
chão. Todo o mundo diz... e eu mesmo, uma vez, estava com uma dor de cabeça
danada, que não havia meio de passar... Chamei preto Zeferino, ele disse que eu
estava com o Sol dentro da cabeça. Botou uma toalha na minha testa, derramou
uma'garrafa dágua, rezou uma oração, o sol saiu e eu fiquei bom.
PADRE: Você fez mal, meu filho. Essas rezas são orações do
demo.
ZÉ: Do demo, não senhor.
PADRE: Do demo, sim. Você não soube distinguir o bem do mal.
Todo homem é assim. Vive atrás do milagre em vez de viver atrás de Deus. E não sabe se caminha para o céu ou para o
inferno.
ZÉ: Para o inferno? Como pode ser, Padre, se a oração fala
em Deus?
(Recita) "Deus fez o Sol. Deus fez a luz, Deus fez
toda a claridade do Universo grandioso. Com sua Graça eu te benzo, te curo.
Vai-te Sol, da cabeça desta criatura para as ondas do Mar Sagrado, com os
santos poderes do Padre do Filho e do Espírito Santo". Depois rezou um
Padre Nosso e a dor de cabeça sumiu no mesmo instante.
O texto acima:
a) Apenas apresenta o primeiro encontro de Zé com o Padre
onde ficam claros os propósitos de Zé-do-Burro em carregar uma cruz por 7
léguas.
b) Nada se vê a respeito do sincretismo religioso, que
normalmente é aceito pelas camadas mais populares, mas mal visto pela Igreja e
sua direção doutrinária.
c) É um momento fundamental para a negativa do Padre em
impedir o cumprimento da promessa que desencadeará o fio narrativo da peça e o
surgimento do dualismo intransigência X sessão.
d) A ingenuidade do Zé não lhe permite alcançar a força
dos dogmas religiosos, mesmo assim ela sabe que pravelecerá e sua promessa será
paga.
e) Confrontos religiosos sempre existirão. No caso, temos
os dois lados de uma mesma moeda degladeando-se. A conjutura estabelece o
princípio da eterna luta entre Davi X Golias, com o inevitável desfecho: mais
uma vez Davi suplanta Golias.
08. (Herriot - 2009) - Aparentemente, em O Pagador de
Promessas, de Dias Gomes, a religiosidade é a tônica:
ZÉ: Foi então que comadre Miúda me lembrou: por que eu não
ia no candomblé de Maria de Iansan?
PADRE: Candomblé?!
ZÉ: Sim, é um candomblé que tem duas léguas adiante da
minha roça. (Com a consciência de quem cometeu uma falta, mas não muito grave)
Eu sei que seu vigário vai ralhar comigo. Eu também nunca fui muito de
freqüentar terreiro de candomblé. Mas o pobre Nicolau estava morrendo. Não
custava tentar. Se não fizesse bem, mal não fazia. E eu fui. Contei pra
Mãe-de-Santo o meu caso. Ela disse que era mesmo com
Iansan, dona dos raios e das trovoadas. Iansan tinha ferido Nicolau... pra ela
eu devia fazer uma obrigação, quer dizer: uma promessa. Mas tinha que ser uma
promessa bem grande, porque Iansan, que tinha ferido Nicolau com um raio, não
ia voltar atrás por qualquer bobagem. E eu me lembrei então que Iansan é Santa
Bárbara e prometi que se Nicolau ficasse bom eu carregava uma cruz de madeira
de minha roça até a Igreja dela, no dia de sua festa, uma cruz tão pesada como
a de Cristo.
PADRE: (Como se anotasse as palavras) Tão pesada como a de
Cristo. O senhor prometeu isso a...
ZÉ: A Santa Bárbara.
PADRE: A Iansan!
ZÉ: É a mesma coisa...
Isso se deve ao fato:
a) de que toda promessa tem uma base religiosa. Não seria
diferente a de Zé-do-Burro que é feita a Iansã/Santa Bábara.
b) de haver uma real tentativa do autor demonstrar a
existência do sincretismo religioso na bahia.
c) que se sobressai na obra a intransigência da Igreja
Católica como prova de uma intransigência universal que se manifesta num leque
de situações.
d) de que é comum forças maiores se unirem contra as
menores em defesa de seus objetivos e ideais.
e) natural de ser o homem um ser religioso por excelência
e que não pode viver sem um princípio de prática de fé.
9.(Herriot – 2009) - Leia o texto com atenção:
SACRISTÃO: E Nicolau... quero dizer, o burro,
ficou bom?
ZÉ: Sarou em dois tempos. Milagre. Milagre mesmo. No outro
dia já estava de orelha em pé, relinchando. E uma semana depois todo o mundo me
apontava na rua: - "Lá vai Zé-do-Burro com o burro de novo atrás!"
(Ri) E eu nem dava confiança. E Nicolau muito menos. Só eu e ele sabíamos do
milagre. (Como que retificando) Eu, ele e Santa Bárbara.
PADRE: (Procurando inicialmente controlar-se) Em primeiro lugar,
mesmo admitindo a intervenção de Santa Bárbara, não se trataria de um milagre,
mas apenas de uma graça. O burro podia ter-se curado sem intervenção divina.
ZÉ: Como, Padre, se ele sarou de um dia prô outro...
PADRE: (Como se não o ouvisse) E além disso, Santa Bárbara, se
tivesse de lhe conceder uma graça, não iria fazê-lo num terreiro de candomblé!
É possível deduzir que:
a) Realmente o milagre aconteceu,
pois Nicolau rapidamente se recupera do acidente.
b) Já que Zé-do-Burro realmente
cria, para ele o milagre era um fato consumado.
c) A cura do burro é um exemplo de
que outras curas podem acontecer, basta que haja um pedido e uma promessa a ser
paga.
d) As curas são uma realidade. É
só alguém se dirigir a um terreiro e faça uma promessa a Iansã.
e) Zé-do-Burro creu, alcançou a
graça e resolveu pagar a promessa; o Padre por sua vez, um homem da religião,
demonstra em todo tempo sua incredulidade.
10.
(Herriot – 2009) - Zé-do-Burro, um sertanejo, carrega nas costas uma imensa
cruz por mais de sete léguas, até a Igreja de Santa Bárbara, em Salvador, para
pagar uma promessa. Tudo o que ele quer é depositar a cruz dentro da igreja e
pagar assim sua promessa, mas as coisas não serão tão fáceis.
(01) -
Herói absolutamente sem máculas, puro, honrado, casto, etc. etc., é brutalmente
destruído por uma sociedade corrupta, gananciosa, mentirosa.
(02) - Em
um dado momento, a prostituta reclama que seu gigolô levou todo seu dinheiro e
diz que é justo que fique ao menos com algum. Afinal, ela é que tinha
trabalhado. E retruca o gigolô: E desde quando trabalhar dá direito a alguma
coisa? Quem lhe meteu na cabeça essas idéias? Está virando comunista? –
Percebe-se uma nota socialista subentendida.
(04) - A
história se passa em uma Salvador contemporânea e movimentada, com carros,
trânsito, buzina, até merchandising. Entretanto, o personagem principal e sua
esposa parecem saídos diretamente da Idade Média. A genialidade de Dias Gomes
está em mostrar isso de forma sensível e simples.
(08) –
Desde o começo da peça, Zé-do-Burro e sua esposa falam que caminharam sete
léguas até chegar à Igreja. É sete léguas pra cá, sete léguas pra lá, etc. etc.
Mas, na primeira vez que mencionam esse número para um soteropolitano, a reação
deste é imediata e chega até a interromper o primeiro:
Sete léguas? Quantos quilômetros?
O leitor, empolgado, quase tem vontade de dizer: mas era justamente isso que eu queria perguntar desde o início da peça!
Mas os sertanejos também não sabem. Quilômetros fazem tão pouco sentido pra eles quanto léguas pra nós.
(16) - Em
uma única frase (sete léguas), Dias Gomes delineou perfeitamente o enorme fosso
que separava seus heróis sertanejos dos habitantes da moderna Salvador - e da
massa dos seus leitores.
(32)
Rosa, a esposa de Zé-do-Burro, está dividida entre ajudar seu marido a pagar
sua promessa ou ir embora com o amante, com quem já transou, em um quarto de
hotel, no começo da peça.
De longe, o amante faz gestos para ela, chama para que venha com ele. Ela olha para seu marido, sentado na porta da igreja, consumido por sua promessa. Sim, pode até ser um bom homem, mas quem quer viver assim?
Por fim, a tentação vence e, "quase que como atraída por um imã", ela começa a caminhar na direção do amante.
A soma
das verdadeiras é:
a)
31 b) 48 c) 30
d) 63 e) 40
11. (Herriot – 2009) - O
Pagador de Promessas, de Dias Gomes, critica a diferença entre Brasil urbano e o
Brasil rural: os padres, a polícia, a imprensa não conseguem compreender quem é
Zé do Burro, sua origem ingênua, com outros códigos culturais, outras posturas.
I - Os
choques entre a crença ingênua e a religião dogmática; a credulidade simples e
a armação maliciosa; a sinceridade das intenções e a completa distorção dos
fatos; a inocência e a malícia; a verdade e seu falseamento são alguns dos
componentes do embate entre a cultura do campo e a da cidade, cuja raiz é a má
vontade que coloca a incomunicabilidade como obstáculo intransponível a dividir
as pessoas.
II -
Zé-do-Burro é a vítima-símbolo do criminoso, agressivo, massacrante e cruel
sistema social e político de que até a religião se torna instrumento.
III - Zé
do Burro é o dono de um pequeno pedaço de terra no Nordeste do Brasil. Seu
melhor amigo é um burro. Quando este adoece, Zé faz uma promessa a uma mãe-de-santo do Candomblé: se seu burro se recuperar, irá
doar sua terra aos pobres e carregará uma cruz desde sua terra até a Igreja de
Santa Bárbara em Salvador, dando
espaço para especulações sobre Reforma Agrária.
Estão corretas:
a) Apenas a I
b) Somente a II c) I, II e
III d) I e II c) II e III
12. (Herriot – 2009) - Leia o texto abaixo e
responda ao que se pede:
ROSA: Sei lá... só sei que sete vezes amaldiçoei aquele
dia em que fui roubar caju com ele na roça dos padres...
BONITÃO: Ah, foi assim...
ROSA: A gente faz cada besteira...
BONITÃO: Quanto tempo faz?
ROSA: Oito anos...
BONITÃO: E você casou com ele?
ROSA: Casei.
BONITÃO: Sem gostar?
ROSA: (Depois de um tempo) Gostava, sim. Sabe, na roça, o
homem é feio, magro, sujo e mal vestido. Ele até que era dos melhores. Tinha um
sítio.
BONITÃO: E daí?
ROSA: Daí, eu achei que ele garantia tudo que eu queria
da vida: homem e casa. A gente quando é franga, com licença da palavra, tem
merda na cabeça
BONITÃO: (Algo interessado) Ele tem um sítio, é?
ROSA: Tinha, agora tem só um pedaço. Dividiu o resto com
os lavradores pobres.
BONITÃO: Por quê?
ROSA: Fazia parte da promessa.
BONITÃO: Que é que está esperando? Virar santo?
ROSA: Não brinque. Pelo caminho tinha uma porção de gente
querendo que ele fizesse milagre. E não duvide. Ele é capaz de acabar fazendo.
Se não fosse a hora, garanto que tinha uma romaria aqui, atrás dele.
Deduz-se da leitura do excerto:
(01) – Rosa manisfesta a verdade de que casou com
Zé-do-Burro apenas pela possibilidade de uma vida menos sacrificada.
(02) – Há, por parte da mulher, o entendimento de que
Zé-do-Burro era fiel aos seus princípios religiosos.
(04) – “A gente quando é franga, com licença da palavra,
tem merda na cabeça”. A expressão contem uma metáfora e uma hipérbole.
(08) – “A gente quando é franga” explica a origem himilde
de Rosa, a ponto de se comparar a uma penosa.
(16) – O fato de Zé-do-Burro dividir parte de seu sítio
comprova que ele ela um áduo defensor da Reforma Agrária.
A soma das erradas é:
a) 25 b)
30 c) 07 d) 16 e) 24
13. (Herriot – 2009) - O Texto a seguir:
PADRE: E foi por ele, por um burro, que fez essa
promessa?
ZÉ: Foi... é bem verdade que eu não sabia que era tão
difícil achar uma igreja de Santa Bárbara, que ia precisar andar sete léguas
pra encontrar uma, aqui na Bahia...
BONITÃO: (Que assistiu a toda a cena, um pouco afastado,
solta uma gargalhada grosseira) Ele se estrepou.
Padre Olavo olha-o, surpreso, como se só agora tivesse
notada a sua presença, Bonitão pára de rir quase de súbito, desarmado pelo
olhar enérgico do padre.
ZÉ: Mas mesmo que soubesse, eu não deixava de fazer a
promessa. Porque quando vi que nem as rezas do preto Zeferino davam jeito...
PADRE: Rezas?! Que rezas?!
ZÉ: Seu vigário me disculpe... mas eu tentei tudo. Preto
Zeferino é rezador afamado na minha zona: Sarna de cachorro, bicheira de
animal, peste de gado, tudo isso ele cura com duas rezas e três rabiscos no
chão. Todo o mundo diz... e eu mesmo, uma vez, estava com uma dor de cabeça
danada, que não havia meio de passar... Chamei preto Zeferino, ele disse que eu
estava com o Sol dentro da cabeça. Botou uma toalha na minha testa, derramou
uma'garrafa dágua, rezou uma oração, o sol saiu e eu fiquei bom.
PADRE: Você fez mal, meu filho. Essas rezas são orações
do demo.
ZÉ : Do demo, não senhor.
PADRE: Do demo, sim. Você não soube distinguir o bem do
mal. Todo homem é assim. Vive atrás do milagre em vez de viver atrás de Deus. E
não sabe se caminha para o céu ou para o inferno.
ZÉ: Para o inferno? Como pode ser, Padre, se a oração
fala em Deus? (Recita) "Deus fez o Sol. Deus fez a luz, Deus fez toda a
claridade do Universo grandioso. Com sua Graça eu te benzo, te curo. Vai-te
Sol, da cabeça desta criatura para as ondas do Mar Sagrado, com os santos
poderes do Padre do Filho e do Espírito Santo". Depois rezou um Padre
Nosso e a dor de cabeça sumiu no mesmo instante.
SACRISTÃO: Incrível!
PADRE: Meu filho, esse homem era um feiticeiro.
ZÉ: Como feiticeiro, se a reza é pra curar?
PADRE: Não é pra curar, é para tentar. E você caiu em
tentação.
É crucial dentro da narrativa de O Pagador de Promessas,
de Dias Gomes, porque:
a) Apresenta o primeiro confronto entre Pe. Olavo e
Zé-do-Burro.
b) Mostra a inocência e a igenuidade de Zé-do-Burro.
c) Apresenta a admiração do sacristão pela ousada
promessa de Zé-do Burro.
d) Determina o ponto nelvrágico da obra que culminará com
a pribição do Pe. Olavo, impedindo de Zé entrar na igreja com a cruz.
e) Mostra a intolerância da Igreja, tipificada na atitude
do Pe. Olavo e segurança do Zé em não abrir mão do seu objetivo: pagar a
promessa de forma integral.
14. (Herriot – 2009)
- Os trechos abixo formam o final de peça.
Zé-do-Burro, de faca em punho, recua em direção à igreja.
Sobe um ou dois degraus, de costas. O Padre vem por trás e dá uma pancada em
seu braço, fazendo com que a faca vá cair no meio da praça. Zé-doBurro corre e
abaixa-se para apanhá-la. Os policiais aproveitam e caem sobre ele, para
subjugá-lo. E os capoeiros caem sobre os policiais para defendê-lo. Zé-do-Burro
desapareceu na onda humana. Ouve-se um tiro. A multidão se dispersa como num
estouro de boiada, Fica apenas Zé-doBurro no meio da praça, com as mãos sobre o
ventre Ele dá ainda um passo em direção à igreja e cai morto.
..................
O Padre baixa a cabeça e volta ao alto da escada. Bonitão
surge na ladeira. Mestre Coca consulta os companheiros com o olhar. Todos
compreendem a sua intenção e respondem afirmativamente com a cabeça. Mestre
Coca inclina-se diante de Zé-do-Burro, segura-o pelos braços, os outros
capoeiras se aproximam também e ajudam a carregar o corpo. Colocam-no sobre a
cruz, de costas, com os braços estendidos, como um crucificado. Carregam-no
assim, como numa padiola e avançam para a igreja. Bonitão segura Rosa por um
braço, tentando levá-la dali. Mas Rosa o repele com um safanão e segue os
capoeiras. Bonitão dá de ombros e sobe a ladeira. Intimidados, o Padre e o
Sacristão recuam, a Beata foge e os capoeiras entram na igreja com a cruz,
sobre ela o corpo de Zé-do-Burro. O Galego, Dedé e Rosa fecham o cortejo. Só
Minha Tia permanece em cena. Quando uma trovoada tremenda desaba sobre a praça.
Eles representam:
a) O momento em que definitivamente a promessa é pega
pelo Zé-do-Burro pois ele é conduzido pelos capoeiristas até o altar da Igreja.
b) a realidade de que, finalmente, os valores
sócio-culturais de Zé-do-Burro são entendidos pelas massas, representadas pelos
capoeiristas, e esses conduzem a cruz dcom o Zé sobre ela até o altar da
Igreja.
c) O desfecho trágico da narrativa que tem seu
protagonista baleado mortalmente como prova de seu aniquilamento religioso.
d) A comprovação de que a sociedade urbana liquidifica o
homem até este perder a sua fé e se rebelar contra aqueles que só desejam o seu
bem.
e) As cortinas cerram-se como já prenunciadas no decorrer
da obra: A morte previsível de Zé-do-Burro.
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