LITERATURA BRASILEIRA
ROMANTISMO
1. I. Preferência pela realidade exterior sobre a interior.
II. Anteposição da fé à razão, com valorização da mística e da intuição.
III. Poesia descritiva de representação dos fenômenos da natureza.
Detalhismo.
IV. Gosto pelo pitoresco, pela descrição de ambientes exóticos.
V. Atenção do escritor aos detalhes para retratar fielmente o que
descreve.
Características gerais do Romantismo se acham expressas nas proposições:
II e IV
II e III
I e IV
II e V
II e III
I e IV
II e V
2. Não é próprio do Romantismo:
Explorar assuntos nacionais como
história, tradições, folclore;
Idealizar a mulher, tornando-a perfeita em todos os sentidos;
Explorar assuntos ligados à antigüidade clássica, imitando-lhe os poetas e prosadores;
Valorizar temas fúnebres e soturnos.
Idealizar a mulher, tornando-a perfeita em todos os sentidos;
Explorar assuntos ligados à antigüidade clássica, imitando-lhe os poetas e prosadores;
Valorizar temas fúnebres e soturnos.
3. De acordo com a posição romântica, é correto afirmar que:
A natureza é expressiva no
Romantismo e decorativa no Arcadismo.
Com a liberdade criadora implantada no Romantismo, as regras fixas do Classicismo caem e "o poema começa onde começa a inspiração e termina onde termina esta".
A visão do mundo romântica é centrada no sujeito, no "eu" do escritor, daí a predominância da função emotiva na linguagem do Romantismo.
Todas as alternativas anteriores estão corretas.
Com a liberdade criadora implantada no Romantismo, as regras fixas do Classicismo caem e "o poema começa onde começa a inspiração e termina onde termina esta".
A visão do mundo romântica é centrada no sujeito, no "eu" do escritor, daí a predominância da função emotiva na linguagem do Romantismo.
Todas as alternativas anteriores estão corretas.
4. Poderíamos sintetizar uma das características do Romantismo pela
seguinte aproximação de opostos:
Cultivando o passado, procurou
formas de compreender e explicar o presente.
Pregando a liberdade formal, manteve-se preso aos modelos legados pelos clássicos.
Embora marcado por tendências liberais, opôs-se ao nacionalismo político.
Voltado para temas nacionalistas, desinteressou-se do elemento exótico, considerando-o incompatível com exaltação da pátria.
Pregando a liberdade formal, manteve-se preso aos modelos legados pelos clássicos.
Embora marcado por tendências liberais, opôs-se ao nacionalismo político.
Voltado para temas nacionalistas, desinteressou-se do elemento exótico, considerando-o incompatível com exaltação da pátria.
5. A visão do mundo, nostálgica nos românticos, explica-se:
Pelas inúmeras guerras havidas
na época do Romantismo.
Pela inadaptação aos valores absolutistas implantados pela monarquia brasileira.
Pelo descontentamento da nobreza, que deixa o poder, e de parte da burguesia, que ainda não havia assumido ou que tivesse ficado à margem dele.
Pela contemplação de um Brasil conservador, baseado no latifúndio, no escravismo e na monarquia.
Pela inadaptação aos valores absolutistas implantados pela monarquia brasileira.
Pelo descontentamento da nobreza, que deixa o poder, e de parte da burguesia, que ainda não havia assumido ou que tivesse ficado à margem dele.
Pela contemplação de um Brasil conservador, baseado no latifúndio, no escravismo e na monarquia.
6. "Deus! Oh, Deus! Onde estás que não respondes? Em que mundo,
em qu'estrelas tu t'escondes Embuçado no céus? Há dois mil anos te mandei meu
grito, Que embalde desde então corre o infinito... Onde estás, senhor
Deus?..."
Esta é a primeira estrofe de um poema que é exemplo de:
Lirismo subjetivo, marcado pelo
desespero do pecador arrependido.
Lirismo religioso, exprimindo o anseio da alma humana em procura da divindade.
Lirismo romântico de tema político-social, exprimindo o anseio do homem pela liberdade.
Romantismo nacionalista repassado da saudade que atormenta o poeta do exílio.
Lirismo religioso, exprimindo o anseio da alma humana em procura da divindade.
Lirismo romântico de tema político-social, exprimindo o anseio do homem pela liberdade.
Romantismo nacionalista repassado da saudade que atormenta o poeta do exílio.
7. Assinale a alternativa que traz apenas características do
Romantismo:
idealismo, religiosidade,
objetividade, escapismo, temas pagãos.
predomínio do sentimento, liberdade criadora, temas cristãos, natureza convencional, valores absolutos.
egocentrismo, predomínio da poesia lírica, relativismo, insatisfação, idealismo.
idealismo, insatisfação, escapismo, natureza convencional, objetividade.
predomínio do sentimento, liberdade criadora, temas cristãos, natureza convencional, valores absolutos.
egocentrismo, predomínio da poesia lírica, relativismo, insatisfação, idealismo.
idealismo, insatisfação, escapismo, natureza convencional, objetividade.
8. UM ÍNDIO
"um índio descerá de uma estrela
colorida brilhante
de uma estrela que virá numa velocidade
estonteante
e pousará no coração do hemisfério sul na
américa
num claro instante
(...)
virá
impávido que nem muhammad ali
virá que eu vi
apaixonadamente como peri
virá que eu vi
tranqüilo e infalível como bruce lee
virá que eu vi
o aché do afoxé filhos de ghandi virá"
(Caetano Veloso)
O trecho anterior mostra, com uma visão contemporânea, determinado tipo
de tratamento dado ao índio brasileiro em certo período de nossa literatura.
Assinale a alternativa em que aparecem os nomes de dois autores que
manifestaram tal tendência.
Gonçalves de Magalhães e Álvares
de Azevedo
Castro Alves e Tobias Barreto
Fagundes Varella e Visconde de Taunay
Gonçalves Dias e José de Alencar.
Castro Alves e Tobias Barreto
Fagundes Varella e Visconde de Taunay
Gonçalves Dias e José de Alencar.
9. "A verdadeira poesia deve inspirar-se num entusiasmo natural
e exprimir-se com naturalidade, sendo simples, pastoril, bucolicamente ingênua
e inocente."
Esta afirmação caracteriza a estética __________ uma vez que exalta
elementos ligados à _________, opondo-se ao culto do interior que identifica o
___________.
As lacunas acima deverão ser preenchidas, respectivamente, com os
termos:
romântica, natureza,
Simbolismo
árcade, civilização, Romantismo
parnasiana, estética, Arcadismo
árcade, natureza, Romantismo
árcade, civilização, Romantismo
parnasiana, estética, Arcadismo
árcade, natureza, Romantismo
10. Machado de Assis representa a transição entre:
Arcadismo e Romantismo
Barroco e Romantismo
Romantismo e Realismo
Parnasianismo e Simbolismo
Barroco e Romantismo
Romantismo e Realismo
Parnasianismo e Simbolismo
11. "Quantas coisas (...) brotam ainda hoje, modas, bailes,
livros, painéis, primores de toda casta, que amanhã já são pó ou cisco? Em um
tempo em que não mais se pode ler, pois o ímpeto da vida mal consente folhear o
livro, que à noite deixou de ser novidade e caiu na voga; no meio desse
turbilhão que nos arrasta, que vinha fazer uma obra séria e refletida? Perca
pois a crítica esse costume em que está de exigir, em cada romance que lhe dão,
um poema."
As proposições anteriores, de José de Alencar, fazem alusão a um
problema característico do movimento romântico. Aponte-o:
o movimento romântico, afeito ao
lirismo e á sentimentalidade, busca realizar uma prosa fundamentalmente
impregnada de valores poéticos
o autor preocupa-se com satisfazer o gosto de um público pouco exigente no que diz respeito a obras de acabamento literário mais sofisticado
tendo em vista a caracterização da sociedade burguesa, o romance deve conter preferencialmente ação, que seja o retrato dos agitados tempos modernos
o autor, já que se reconhece gênio, e pelo público, é aceito como tal e deve nortear as multidões que o lêem com sua palavra sábia e simples
o autor preocupa-se com satisfazer o gosto de um público pouco exigente no que diz respeito a obras de acabamento literário mais sofisticado
tendo em vista a caracterização da sociedade burguesa, o romance deve conter preferencialmente ação, que seja o retrato dos agitados tempos modernos
o autor, já que se reconhece gênio, e pelo público, é aceito como tal e deve nortear as multidões que o lêem com sua palavra sábia e simples
O texto seguinte refere-se às questões 12 e 13.
"O problema da nacionalidade literária foi colocado, dentro da atmosfera do Romantismo, em termos essencialmente políticos. Misturadas literatura e política, a autonomia política transferia-se para literatura, e confundiram-se independência política e independência literária."
"O problema da nacionalidade literária foi colocado, dentro da atmosfera do Romantismo, em termos essencialmente políticos. Misturadas literatura e política, a autonomia política transferia-se para literatura, e confundiram-se independência política e independência literária."
12. Segundo o texto, para os românticos:
a autonomia política e a
autonomia literária foram duas faces de um mesmo processo de emancipação
autonomia política e autonomia literária mantiveram entre si uma relação de causa e efeito
a autonomia literária sempre se seguiu à emancipação política
emancipação política e emancipação literária foram processos que se concretizaram independentemente um do outro
autonomia política e autonomia literária mantiveram entre si uma relação de causa e efeito
a autonomia literária sempre se seguiu à emancipação política
emancipação política e emancipação literária foram processos que se concretizaram independentemente um do outro
13. Segundo o texto:
Romantismo foi uma escola
literária de atmosfera essencialmente política
no Romantismo, literatura e política interpenetram-se e exercem influência mútua, numa interdependência dialética
pode-se dizer que a política usou a literatura em suas campanhas, mas o inverso não é válido, pois a literatura não se valeu da política
independência política e independência literária são fenômenos distintos, que só se misturam em conseqüência de um erro de interpretação
no Romantismo, literatura e política interpenetram-se e exercem influência mútua, numa interdependência dialética
pode-se dizer que a política usou a literatura em suas campanhas, mas o inverso não é válido, pois a literatura não se valeu da política
independência política e independência literária são fenômenos distintos, que só se misturam em conseqüência de um erro de interpretação
14. A proposta de divisão dos romances alencarianos baseia-se num
critério:
cronológico
temático
estilístico
geográfico
temático
estilístico
geográfico
15. Assinale o poema de Gonçalves Dias que não apresenta a temática indianista:
Ainda uma vez - Adeus
I-Juca Pirama
Marabá
Leito de Folhas Verdes
I-Juca Pirama
Marabá
Leito de Folhas Verdes
16. O lirismo social da poesia de Castro Alves:
tematiza a liberdade dentro,
principalmente, de um enfoque individualista
tematiza a liberdade exclusivamente referenciada ao negro escravizado
tematiza a liberdade tanto com um enfoque individualista como coletivo; e, em especial, referenciada ao negro escravizado
tematizava a liberdade de modo geral, e apenas acidentalmente referenciada ao negro escravizado
tematiza a liberdade exclusivamente referenciada ao negro escravizado
tematiza a liberdade tanto com um enfoque individualista como coletivo; e, em especial, referenciada ao negro escravizado
tematizava a liberdade de modo geral, e apenas acidentalmente referenciada ao negro escravizado
17. Poema castro-alivino que não aborda a temática social:
O Livro e a América
Vozes d’África
Ode ao Dous de Julho
n.d.a
Vozes d’África
Ode ao Dous de Julho
n.d.a
18. Qual a alternativa que apresenta grupos de classificação dos
romances alencarianos?
urbanos, indianistas, históricos
e regionalistas
urbanos, indianistas, históricos e psicológicos
urbanos, indianistas, psicológicos e satíricos
urbanos, históricos, psicológicos e trágicos
urbanos, indianistas, históricos e psicológicos
urbanos, indianistas, psicológicos e satíricos
urbanos, históricos, psicológicos e trágicos
19. Assinale a alternativa falsa. O Romantismo:
procura o elemento
nacional
propõe ruptura com o passado
foi introduzido no Brasil por Gonçalves de Magalhães
é a valorização do que é "nosso"
propõe ruptura com o passado
foi introduzido no Brasil por Gonçalves de Magalhães
é a valorização do que é "nosso"
REALISMO – NATURALISMO
1. O romance realista apresenta suas características específicas,
definidoras das tendências da época e da escola literária. É possível, entre
aquelas, apontar o fato de que ele:
analisa pormenorizadamente as
vicissitudes das personagens que viveram um drama histórico, espelho da
realidade da nação.
se constrói em torno da análise dos caracteres, equacionados com a visão mais profunda de sua realidade interior e de sua fisionomia moral.
dá relevo à paisagem social e física em que se passa a história, constituindo-se o conjunto uma crônica amena dos costumes da época.
procura retratar os ambientes, considerando desnecessária a análise psicológica das personagens e das motivações internas de seus atos.
se constrói em torno da análise dos caracteres, equacionados com a visão mais profunda de sua realidade interior e de sua fisionomia moral.
dá relevo à paisagem social e física em que se passa a história, constituindo-se o conjunto uma crônica amena dos costumes da época.
procura retratar os ambientes, considerando desnecessária a análise psicológica das personagens e das motivações internas de seus atos.
2. Ao escritor realista interessam, sobretudo, os conflitos:
universais, que espelham os
problemas humanos desvinculados das relações possíveis com o momento
histórico.
de natureza individualizadora, que permite aprofundar a análise psicológica dos personagens.
que permitem à obra tornar-se politicamente combativa e comprometida.
originários da relação do homem com seu meio ambiente.
de natureza individualizadora, que permite aprofundar a análise psicológica dos personagens.
que permitem à obra tornar-se politicamente combativa e comprometida.
originários da relação do homem com seu meio ambiente.
3. Os escritores realistas e naturalistas, preocupados com as causas,
determinam o comportamento do homem, criam, no mais das vezes, personagens:
cujas ações e psicologia são
determinadas por forças atávicas e sociais.
de personalidade firme, cujo comportamento diante da vida não decorre de postura subjetiva.
lúcidas o suficiente para perceberem, através de constante autocrítica, as raízes e causas dos erros que cometem.
cujo comportamento é invarialmente patológico, em decorrência de optarem sempre pela marginalidade.
de personalidade firme, cujo comportamento diante da vida não decorre de postura subjetiva.
lúcidas o suficiente para perceberem, através de constante autocrítica, as raízes e causas dos erros que cometem.
cujo comportamento é invarialmente patológico, em decorrência de optarem sempre pela marginalidade.
4. Memórias Póstumas de Brás Cubas é considerado o romance divisor de
águas da obra machadiana, porque, a partir dele, o autor:
assume de vez a visão da
realidade, apenas esboçada nos romances da chamada primeira fase.
se insere na estética naturalista, ao denunciar as mazelas sociais, os casos psicológicos patalógicos e os aspectos mais repugnantes da realidade.
antecede as conquistas modernistas, com uma postura crítica diante da civilização industrial e uma atitude de denúncia das misérias do mundo rural.
desmitifica as idealizações românticas e assume uma visão crítica que, despindo as aparências que encobrem a realidade, busca as razões últimas das ações humanas.
se insere na estética naturalista, ao denunciar as mazelas sociais, os casos psicológicos patalógicos e os aspectos mais repugnantes da realidade.
antecede as conquistas modernistas, com uma postura crítica diante da civilização industrial e uma atitude de denúncia das misérias do mundo rural.
desmitifica as idealizações românticas e assume uma visão crítica que, despindo as aparências que encobrem a realidade, busca as razões últimas das ações humanas.
5. Assinale a alternativa falsa a respeito de O Cortiço.
várias personagens exemplificam
as teses do romance naturalista
na obra narram-se aspectos da vida coletiva
as personagens têm, geralmente, grande profundidade psicológica
Miranda e João Romão representam um contraste social
na obra narram-se aspectos da vida coletiva
as personagens têm, geralmente, grande profundidade psicológica
Miranda e João Romão representam um contraste social
6. As preocupações científicas do Naturalismo orientam-no a:
ocupar-se de aspectos
patológicos da conduta humana, tais como taras, desvios, miséria externa,
desequilíbrios psicológicos.
fazer que a literatura despreze a participação das emoções na urdidura da trama narrativa.
contemplar seguidamente os fenômenos naturais e buscar o sentido do universo em uma ordem cósmica e universal.
copiar a natureza tal e qual os sentidos, a razão e a intuição permitem apreendê-la.
fazer que a literatura despreze a participação das emoções na urdidura da trama narrativa.
contemplar seguidamente os fenômenos naturais e buscar o sentido do universo em uma ordem cósmica e universal.
copiar a natureza tal e qual os sentidos, a razão e a intuição permitem apreendê-la.
7. Qual destas afirmações não se aplica a uma classificação de Dom
Casmurro como romance?
de costumes
urbano
psicológico
memorialista
urbano
psicológico
memorialista
8. Foi no romance ____________ que Aluísio Azevedo atinou de fato com
a fórmula que se ajustou ao seu talento. Não montou um enredo em função de
pessoas, mas de cenas coletivas de tipos psicologicamente primários:
O Homem
A Mortalha de Alzira
Uma Lágrima de Mulher
O Cortiço
A Mortalha de Alzira
Uma Lágrima de Mulher
O Cortiço
9. O melhor romance de Aluísio Azevedo tem, como tema, uma habitação
coletiva fluminense (favela) nos fins do século XIX e por personagem principal
João Romão. Este romance é:
Casa de Pensão
O Coruja
O Cortiço
O Mulato
O Coruja
O Cortiço
O Mulato
10. Nasceu no Maranhão em 1857 e morreu em Buenos Aires, em 1913. Foi
caricaturista, romancista, teatrólogo, diplomata. Projetou-se em 1881, quando
publicou O Mulato, primeiro romance naturalista da literatura brasileira; um
romance de tese, no qual analisa a marginalidade do mulato brasileiro. O autor
a que se refere o texto é:
Aluísio Azevedo
Raul Pompéia
Álvares de Azevedo
Júlio Ribeiro
Raul Pompéia
Álvares de Azevedo
Júlio Ribeiro
11. Capitu revela um sentimento inconfessável pelo defunto, diverso da
piedade e do amor ao próximo. O marido, narrador obcecado pela esposa,
observa-lhe todos os gestos e desvenda neles:
o assassinato
o ciúme patológico de Capitu
o adultério
o amor entre Sancha e Capitu
o ciúme patológico de Capitu
o adultério
o amor entre Sancha e Capitu
12. Examine as frases abaixo:
I.
Os representantes do Naturalismo fazem aparecer nas suas obras
dimensões metafísicas do homem,
passando a encará-lo como um
complexo social examinado à luz da
psicologia.
II.
No Naturalismo as tentativas de submeter o homem a leis
determinadas são conseqüências da
aplicação, à literatura, do
experimentalismo, que caracterizou
as tendências das ciências,
na segunda metade do século XIX.
III. Na seleção de casos a serem
enfocados, os naturalistas
demonstraram aversão pelo anormal
e o patológico.
Pode se dizer corretamente que:
só a I está correta.
só a II está correta.
só a III está correta.
existem duas corretas.
só a II está correta.
só a III está correta.
existem duas corretas.
13. Qual a alternativa que contém todas as características do romance
naturalista enumeradas neste conjunto?
1. vulgaridade; 2. atmosfera de sonho; 3. idealização do herói; 4.
cientificismo; 5. espírito de aventura; 6. contemporaneidade; 7. predomínio da
observação; 8. narrativa lenta, em prosa; 9. o homem enquanto indivíduo;
10.concepção mecanicista do mundo.
3, 4, 6, 7, 9, 10
1, 4, 5 , 7, 9, 10
3, 4, 7, 8, 9, 10
1, 4, 6, 7, 8, 10
1, 4, 5 , 7, 9, 10
3, 4, 7, 8, 9, 10
1, 4, 6, 7, 8, 10
14. Associe:
1. O Mulato
2. A Carne
3. A Normalista
4. Dom Casmurro
( )
Machado de Assis
( )
Adolfo Caminha
( )
Júlio Ribeiro
( )
Aluísio Azevedo
4, 3, 2, 1
4, 3, 1, 2
3, 4, 2, 1
n. d. a.
4, 3, 1, 2
3, 4, 2, 1
n. d. a.
15. Assinale a alternativa em que está incorreta a relação
autor-obra-personagem:
Manuel Antônio de Almeida -
Memórias de um sargento de Milícias - Leonardo
Joaquim Manuel de Macedo - A Moreninha - Carolina
Raul Pompéia - O Ateneu - Carlos
Aluísio Azevedo - O Cortiço - João Romão
Joaquim Manuel de Macedo - A Moreninha - Carolina
Raul Pompéia - O Ateneu - Carlos
Aluísio Azevedo - O Cortiço - João Romão
(Fragmento do Capítulo I, em que é narrada a
relação entre Miranda e sua esposa Estela)
"Odiavam-se. Cada qual sentia pelo outro um profundo desprezo,
que pouco a pouco se foi transformando em repugnância completa. O
nascimento de Zulmira veio agravar ainda mais a situação; a pobre criança , em
vez de servir de elo aos dois infelizes, foi antes um novo isolador que se
estabeleceu entre eles. Estela emava-a menos do que lhe pedia o instinto
materno por supô-la filha do marido, e este a detestava porque tinha convicção
de não ser seu pai.
Uma bela noite, porém, o Miranda, que era homem de sangue esperto e orçava então pelos seus trinta e cinco anos, sentiu-se em insuportável estado de lubricidade."
Uma bela noite, porém, o Miranda, que era homem de sangue esperto e orçava então pelos seus trinta e cinco anos, sentiu-se em insuportável estado de lubricidade."
(Aluísio
Azevedo)
16)
Analise a relação vivida entre os personagens apontados neste fragmento da obra
O Cortiço. Por que podemos caracterizá-los como personagens realistas?
17)
Compare a relação amorosa na estética realista -naturalista com o romantismo.
Aponte as diferenças das escolas lierárias com referência ao amor.
18)
(UE-BA) A respeito da ficção de Machado de Assis, pode-se afirmar que:
a) se desenvolveu do Romantismo para o Naturalismo, consagrando-se sobretudo nas crônicas políticas e nos contos satíricos;
b) amadureceu sob a influência de José de Alencar, de quem tomou os temas e o estilo, tal como se vê em Quincas Borba;
c) é exemplo típico da literatura naturalista, sendo apenas superada pela obra prima O Cortiço, de seu mestre Aluísío de Azevedo.
d) representa a conquista da maturidade da literatura nacional a partir de Memórias Póstumas de Brás Cubas.
e) atingiu com Ressurreição e A Mão e a Luva o plano mais alto de nossa literatura de expressão realista.
a) se desenvolveu do Romantismo para o Naturalismo, consagrando-se sobretudo nas crônicas políticas e nos contos satíricos;
b) amadureceu sob a influência de José de Alencar, de quem tomou os temas e o estilo, tal como se vê em Quincas Borba;
c) é exemplo típico da literatura naturalista, sendo apenas superada pela obra prima O Cortiço, de seu mestre Aluísío de Azevedo.
d) representa a conquista da maturidade da literatura nacional a partir de Memórias Póstumas de Brás Cubas.
e) atingiu com Ressurreição e A Mão e a Luva o plano mais alto de nossa literatura de expressão realista.
19)
(FCC-BA) Memórias Póstumas de Brás Cubas é considerado romance divisor de águas
da obra machadiana porque, a partir dele, o autor:
a) assume de vez a visão romântica da realidade, apenas esboçada nos romances da chamada primeira fase.
b) se insere na estética naturalista, ao denunciar as mazelas sociais, os casos patológicos e os aspectos mais repugnantes da sociedade.
c) procede a uma retificação da própria obra, através da voz de personagens por meio das quais renega os valores da primeira fase.
d) antecede as conquistas modernistas, com uma postura crítica diante da civilização industrial e uma atitude de denúncia das misérias do mundo real.
e) desmitifica as idealizações românticas e assume uma visão crítica que, despindo as aparências que encobrem a realidade, busca as razões últimas das ações humanas.
a) assume de vez a visão romântica da realidade, apenas esboçada nos romances da chamada primeira fase.
b) se insere na estética naturalista, ao denunciar as mazelas sociais, os casos patológicos e os aspectos mais repugnantes da sociedade.
c) procede a uma retificação da própria obra, através da voz de personagens por meio das quais renega os valores da primeira fase.
d) antecede as conquistas modernistas, com uma postura crítica diante da civilização industrial e uma atitude de denúncia das misérias do mundo real.
e) desmitifica as idealizações românticas e assume uma visão crítica que, despindo as aparências que encobrem a realidade, busca as razões últimas das ações humanas.
20)
(UF-MG) Todas as afirmações sobre Dom Casmurro, de Machado de
Assis, estão certas, exceto:
a) O discurso em primeira pessoa favorece o clima de dúvida que paira sobre o adultério de Capitu, pois o que prevalece na narrativa são as impressões de Bentinho, o narrador.
b) Além da semelhança de Ezequiel com Escobar, outro fator acentua a dúvida de Bentinho, sobre a paternidade do filho: a capacidade de dissimulação de Capitu.
c) O adultério, núcleo da narrativa, é um pretexto para se discorrer sobre a existência humana, subordinada ao poder desinte-grador do tempo, que atua de forma irreversível sobre todas as coisas.
d) A alegoria do temor italiano, que apresenta a vida como uma ópera composta por Deus e pelo Diabo, projeta-se em todo o romance, mostrando que, na luta entre as virtudes e os vícios, o Bem sempre triunfa.
e) Ao tentar reproduzir no Engenho Novo a casa em que se havia criado na antiga rua de Mata-cavalos, ou ao escrever suas memórias, Dom Casmurro tenta reconstruir o passado, logrando invocar-lhe as imagens e não as sensações.
a) O discurso em primeira pessoa favorece o clima de dúvida que paira sobre o adultério de Capitu, pois o que prevalece na narrativa são as impressões de Bentinho, o narrador.
b) Além da semelhança de Ezequiel com Escobar, outro fator acentua a dúvida de Bentinho, sobre a paternidade do filho: a capacidade de dissimulação de Capitu.
c) O adultério, núcleo da narrativa, é um pretexto para se discorrer sobre a existência humana, subordinada ao poder desinte-grador do tempo, que atua de forma irreversível sobre todas as coisas.
d) A alegoria do temor italiano, que apresenta a vida como uma ópera composta por Deus e pelo Diabo, projeta-se em todo o romance, mostrando que, na luta entre as virtudes e os vícios, o Bem sempre triunfa.
e) Ao tentar reproduzir no Engenho Novo a casa em que se havia criado na antiga rua de Mata-cavalos, ou ao escrever suas memórias, Dom Casmurro tenta reconstruir o passado, logrando invocar-lhe as imagens e não as sensações.
21)
(UC-MG) Das afirmações abaixo, a respeito de Machado de Assis, a única falsa é:
a) a ironia e o humor são grandes suportes de sustentação de sua obra.
b) como ficcionista, dá grande ênfase à psicologia de suas personagens.
c) normalmente, suas personagens são tratadas com severo rigor crítico.
d) sua narrativa sempre focaliza o ambiente urbano do Rio de Janeiro.
e) seus romances estão marcados pela preocupação com a ação e o episódio.
a) a ironia e o humor são grandes suportes de sustentação de sua obra.
b) como ficcionista, dá grande ênfase à psicologia de suas personagens.
c) normalmente, suas personagens são tratadas com severo rigor crítico.
d) sua narrativa sempre focaliza o ambiente urbano do Rio de Janeiro.
e) seus romances estão marcados pela preocupação com a ação e o episódio.
TEXTOS DE
APOIO PARA DISCUSSÃO:
MEMÓRIAS
POSTUMAS DE BRÁS CUBAS
O romance
é narrado em primeira pessoa por seu defunto-autor, ou seja, um narrador já
falecido, chamado Brás Cubas.
“Ao verme
que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança
estas Memórías Póstu-mas”. Com essa mensagem ínicial, Brás Cubas mostra
ao leitor que já não é mais coisa alguma, que não existe mais e que, assim,
está livre para falar de sua vida, sem o ranço dos preconceitos. Fala do amor
da juventude por uma prostituta de luxo chamada Marcela e da viagem que faz à Europa,
com a finalidade de esquecê-la; do relacionamento mantido com a pobre Eugênia,
defeituosa de uma perna e de classe social menos privilegiada; do noivado com
Virgílía, que termina em fracasso, fazendo com que ele perca a ajuda política
do pai da moça. Mostra que fora um perdedor em todos os sentidos, consumindo
toda a fortuna de sua famílía. Mais tarde, torna-se amante da ex-noiva,
Virgília, então esposa de Lobo Neves, separando-se novamente dela depois. A
noiva que sua irmã lhe arruma morre em uma epidemia. Entediado, une-se a
Quincas Borba e interessa-se pela “teoria do Humanitismo.”
Tenta,
por fim, tornar-se célebre e cria um emplastro que serve para curar a
hipo-condria. Acaba tomando uma chuva, que o leva à pneumonia e à morte. Morto,
começa a rever sua vida e a escrever sobre ela e isto marca o início do
romance.
DOM
CASMURRO
Bentinho é destinado, pela mãe, a ser padre, quando crescer D. Glória quer o
filho religioso. O projeto não se realiza, pois o garoto se apaixona por Capitu
ou Capitolina, sua vizinha. José Dias, um agregado da família de Bentinho,
consegue conduzir as coisas, de forma que o menino não tenha que cumprir uma
promessa que fora feita pela mãe. Acontece um longo namoro entre Bento e
Capitu, até que ele conclui o curso de Direito. Escobar, um antigo colega na
breve permanência no seminário, torna-se um amigo cada vez mais íntimo de
Bentinho. Enquanto Bento e Capitu se casam, o mesmo ocorre, entre Escobar
e uma boa amiga de Capitu, Sancha. Tudo corre bem, até que Escobar morre
afogado. No velório, Bentinho estranha a forma como Capitu encara o
cadáver, e passa a sentir um ciúme doentio dela. Lembra-se de que José Dias lhe
falara, certa vez, dos olhos dela, dizendo-lhe que eram "olhos de cigana
oblíqua e dissimulada”.
Pensa em como são, também, olhos de ressaca, que tragam para dentro de si os que amam. O filho de ambos, para Bento, cada vez se parece mais com Escobar. O pai pensa até em matá-lo. Finalmente, o casal separa-se e Capitu vai com Ezequiel para a Europa. Ela morre e o mesmo ocorre com o filho, depois de ter estado com o pai e partido novamente. Ben-tinho fecha-se em seu mundo e ganha a alcunha de “Casmurro”. O início do romance mostra, exatamente, o narrador em primeira pessoa, Bentinho/Dom Casmurro, tentando “atar as duas pontas da vida”, o passado e o presente, para “restaurar na velhice a adolescência” e rever o que efetivamente lhe acontecera.
Pensa em como são, também, olhos de ressaca, que tragam para dentro de si os que amam. O filho de ambos, para Bento, cada vez se parece mais com Escobar. O pai pensa até em matá-lo. Finalmente, o casal separa-se e Capitu vai com Ezequiel para a Europa. Ela morre e o mesmo ocorre com o filho, depois de ter estado com o pai e partido novamente. Ben-tinho fecha-se em seu mundo e ganha a alcunha de “Casmurro”. O início do romance mostra, exatamente, o narrador em primeira pessoa, Bentinho/Dom Casmurro, tentando “atar as duas pontas da vida”, o passado e o presente, para “restaurar na velhice a adolescência” e rever o que efetivamente lhe acontecera.
QUINCAS
BORBA
É um romance narrado em terceira pessoa e conta a história de Rubião, um
professor humilde, do interior de Minas, que se torna o beneficiário da herança
legada pelo filósofo Quincas Borba, o criador de uma doutrina chamada
Humanitismo. O envolvimento com o casal Cristiano e Sofia Palha leva
Rubião à desagregação psicológica e financeira, devido a sua paixão por Sofia,
que, em conluio com o marido, explora-o ao máximo. Rubião, um homem bom,
honesto e decente, não suporta as coisas que é obrigado a enfrentar e morre
pobre e enlouquecido. Torna-se um modelo nítido da teoria do Humanitismo.
En-quanto vivo, acreditando ser Napoleão, no ápice de sua sandice, diz uma
última frase: “Ao vencedor as batatas...”. Assim ele manda a mensagem que é o
retrato da visão do Humanitismo.
ANÁLISE
DOS LIVROS DO PSS II
QUINCAS
BORBA
Ao estudar a obra de Machado de Assis, a crítica divide-a em duas fases bem
distintas cujo marco é o romance Memórias Póstumas de Póstumas de Brás Cubas,
publicado em 1881. Até essa data, a obra machadiana é marcante romântica, e
nela sobressai poesia, conto e romances como: Ressurreição (1872), A
Mão e a Luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878).
Pertencem à primeira fase todas essas obras.
A partir de 1881, com a publicação de Memórias, Machado muda de tal
forma que Lúcia Miguel Pereira chega a afirmar que “tal obra não podia Ter
saído de tal homem”. A partir das Memórias, “Machado liberou o demônio interior
e começa uma nova aventura”: a análise de caracteres, numa verdadeira
dissecação da alma humana. É a segunda fase – fase marcadamente realista, sem a
qual “não teríamos Machado de Assis”. Além de contos, poesia, teatro, crítica,
integram essa fase os romances seguintes, entre os quais está o nosso QUINCAS
BORBA: Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891),
Dom Casmurro (1900), Esaú e Jacó (1904) e Memorial de Aires
(1908), seu último romance. Toda essa obra é marcadamente realista, embora
reconheçamos que um escritor da categoria de Machado de Assis não pode ficar
preso às delimitações de um estilo de época: águias não se aprisionam – voam
livremente pelas esferas celestes de onde, das estrelas, volvem os olhos
aquilinos para a miséria decadente do planeta dos homens!
Como já ficou situado, Quincas Borba se enquadra no estilo realista, o
que procuraremos mostrar, a partir daqui, dando, é claro, os devidos descontos
para o caso de Machado de Assis.
ESTILO DE ÉPOCA
Como você deve saber, a base cultural e histórica do Realismo é a ciência que
dominou as atenções na Segunda metade do século XIX, chegando a adentrar o
século . Varreu o mundo uma onda de materialismo, como o positivismo de Comte,
o evolucionismo de Darwin, o psicologismo de Wundt, o determinismo de Taine,
que alastra pelo espírito humano como uma verdadeira paixão. Nasce daí o gosto
pela análise, objetividade, observação, fidelidade, impassibilidade,
impessoalidade, etc. Em suma, a literatura preocupa-se em captar a realidade
como ela é, formando-lhe um retrato fiel e preciso.
Como é fácil perceber, Quincas Borba é um livro que se acha, cronologicamente,
no estilo realista. Abaixo lembraremos algumas características que podem ser
vistas no romance.
FIDELIDADE NA DESCRIÇÃO DAS PERSONAGENS. Se o romântico, dando asa à sua
fantasia e imaginação, impregna sua personagens de uma dimensão quase
sobrenatural e idealista, o escritor realista faz exatamente o contrário:
encara a realidade direta e objetivamente. Muitas vezes cientificamente, como é
o caso das personagens naturalistas – verdadeiras cobaias dos experimentos
científicos. Ao realista interessa o que é e não o que deve ser. Podemos
afirmar , dando-se os devidos descontos, que as personagens realistas são
autênticas criaturas de carne e osso que têm as virtudes e os defeitos do ser
humano. O realista não idealiza a realidade, como faziam os românticos, mas
pinta-a tal como ela se apresenta ante seus olhos: é um expectador que
contempla de fora a realidade que o cerca. Assim são as personagens de Machado
de Assis: Capitu, Sofia, Virgília, Quincas Borba, Brás Cubas, Rubião e tantas
outras que povoam seus romances de contradições, misérias, desgraças, alegrias,
virtudes, defeitos – enfim, de vida.
ANÁLISE INTROSPECTIVA DAS PERSONAGENS. Incontestavelmente, o grande
mestre da análise introspectiva, entre nós, numa verdadeira dissecação da alma
humana, é Machado de Assis. A grande característica da sua obra de segunda fase
– onde se enquadra Quincas Borba – é a análise de caracteres. Aí, para usar as
palavras de Massaud Moisés, Machado de Assis revela “grande preocupação pela
análise de caracteres e de situações de sondar o interior das personagens e das
situações dramáticas, psicológicas, sociais, cômicas, etc.”- o que determina no
caso de Machado de Assis, o processo “câmera lenta” usado pelo escritor na
condução de sua obra. Daí Ter maior importância para o escritor a análise,
ficando em segundo plano a intriga ou enredo do romance. É o que ocorre nas
Memórias Póstumas de Brás Cubas. É o que ocorre também em Quincas Borba, onde,
igualmente, o leitor “não achará o seu romance usual.” A grande preocupação de Machado
no romance é em sondar a alma humana, em analisar-lhe os porquês das marchas e
contramarchas. Observe-se que, no caso do Quincas Borba, a técnica machadiana é
de sempre narrar um fato para depois analisá-lo.
OBJETIVIDADE E IMPESSOALIDADE. De um modo geral, ao subjetivismo
romântico opõe-se o objetivismo realista, pois aqui o escritor procura evitar
sempre as emoções subjetivas, conduzindo a obra de maneira direta e objetiva.
Assim, raramente o escritor realista interfere nos dramas vividos por suas
personagens. São meros expectadores que, frios e impessoais, analisam esses
dramas. É claro que, muitas vezes, alguma coisa fica do artista, pois a
criatura sempre revela algum traço do seu criador. Embora dificilmente se
retrate na sua obra, podemos afirmar com Viana Moog que, “ferido no seu orgulho
pelo mal que o aflige (epilepsia), Machado de Assis vinga-se derramando sobre a
humanidade a bílis do seu humour”. Daí a sua visão niilista e pessimista da
vida onde só vê “insanidade e imperfeições imanentes.” É de ver-se também o que
escreve Afrânio Coutinho, desenvolvendo a natureza objetiva e impessoal do
movimento realista: “O Realismo encara a vida objetivamente. Não há intromissão
do autor, que deixa as personagens e os circunstantes atuarem uns sobre os
outros, na busca da solução. O autor não confunde seus sentimentos e pontos de
vista com as emoções e motivos das personagens.” Embora não se aplique ,
cabalmente, esta característica na ficção de Machado de Assis, é possível
entrever este espírito de precisão e de objetividade, de frieza e
impessoalidade em
Quincas Borba.
NARRATIVA LENTA E PORMENORIZADA. Como já ressaltamos atrás, não
interessa ao realista a ação, mas a análise das personagens, a sua sondagem
psicológica. Deste modo, a narrativa realista é lenta e pormenorizada, cheia de
paradas e vaivéns, ao contrário do romântico que se concentra mais na ação, na
intriga que desenvolve. “Usam-se detalhes aparentemente insignificantes na
pintura de personagens e ambientes. E esses detalhes devem ser reunidos e
harmonizados, para dar a impressão da própria realidade”, ressalta Afrânio
Coutinho.
No caso de Quincas Borba, se comparado às Memórias Póstumas de Brás Cubas,
podemos observar que os pormenores e reflexões que povoam este romance (as
Memórias) são bem mais que naquele (Quincas Borba), pois, conforme Massaud
Moisés, Machado de Assis “diligenciou por limpar o texto daquele excesso de
reflexões morais e de interrupções no desenrolar das cenas, comuns no romance
anterior (as Memórias). Parece que teve em mira de escrever um romance para ser
lido e não ser analisado.” De qualquer modo, Quincas Borba não foge a essa
norma do romance realista. Se não possui as interrupções e reflexões que
caracterizam as Memórias, pelo menos não se pode dizer que Machado aqui ficou
preso à história contada que “é trivial e comum, reduzindo-se a um adultério
sonhado, desejado, preparado, que, afinal, não se consuma.” O romancista de
Quincas Borba era bastante lúcido para não se perder em historinhas “água com
açúcar” da farândola romântica.
Assim, as reflexões, as paradas são constantes em Quincas Borba, como
se podem ver no decorrer do romance.
PREDOMINÂNCIA DO TEMPO PRESENTE. O Realismo retrata a vida
contemporânea. Enquanto o romântico se volta ao passado ou se projeta no
futuro, o realista se fixa no presente, porque o que lhe interessa é a vida que
o rodeia. Deste modo, o escritor realista "encara o presente, nas minas,
nos cortiços, nas cidades, nas fábricas, na política, nos negócios, nas
relações conjugais, etc." Muitas vezes descambando para os aspectos
degradantes e deprimentes da sociedade, como é o caso do romance naturalista de
Aluísio Azevedo, O Cortiço.
Sem se prender às delimitações de tempo e espaço, pode-se afirmar que Quincas
Borba é obra perene e imune à ação corrosiva do tempo: "é uma grande
sátira da vida, de seus ingredientes e de suas verdades.
O matiz irônico reside no ser Quincas Borba uma peça única da chacota à
Humanidade desenfreadamente presa a certos dogmas de superfície única de olhar
mais a fundo no íntimo dos problemas. A ironia atinge a todos e só se salvam
(caso consigam), os loucos, os mansos e os animais irracionais. Como sempre,
Machado de Assis vê a Humanidade a correr doidamente em busca de prazeres
fáceis e duma vida que só é opróbrio e alienação, embora com toda a fisionomia
de verdade, porque aceita como convenção ou imperativo moral da
sociedade", ressalta o crítico Massaud Moisés.
ESTILO MACHADIANO
PROCESSO LENTO E DETALHADO. Parece não haver melhor classificação do
estilo de Machado de Assis do que traçado por ele mesmo nas memórias Póstumas
de Brás Cubas, ao afirmar pela boca do defunto autor: "Tu tens pressa de
envelhecer, e o livro anda devagar; tu amas a narração direta e nutrida, o
estilo regular e fluente, e este livro e o meu estilo são como os ébrios,
guinam à direita e à esquerda, andam e param, resmungam, urram, gargalham,
ameaçam o céu, escorregam e caem..."
Há muitas características que definem bem o estilo machadiano. Citaremos
algumas no decorrer deste estudo serão apresentadas outras, também, muito
importantes.
Em Machado de Assis, o enredo não é o mais importante. A narrativa e o enredo
estão subordinados aos estado de alma dos personagens.
Os acontecimentos referidos não obedecem a uma ordem de causa e efeito. Você
pode notar que não há uma preocupação em narrar uma estória, o importante é o
tipo de reflexão, de pensamento que sugere o autor. Machado de Assis
preocupa-se mais com o caráter dos personagens do que com a trama da narrativa
ou a descrição de costumes.
Como diz o próprio autor "o livro anda devagar" e "o meu
estilo" é "como os ébrios, guinam à direita e à esquerda, andam e
param..." É mais ou menos assim que anda a narrativa de Quincas Borba.
Às vezes, há antecipação, posposição ou intercorrência de acontecimentos, pela
necessidade de desenvolvimento da narrativa, que ora se prende a um personagem,
ora se liga a outro.
HUMOR - IRONIA: O HUMANITISMO. O humor, como fenômeno literário,
começou entre nós, a bem dizer, com as Memórias Póstumas de Brás Cubas. (Viana
Moog).
"Não se pode dizer que Machado de Assis tenha sido o maior dos humoristas
do nosso tempo. Mas, se o calendário ainda tem algum sentido e significação,
força é reconhecer que não há outro mais expressivo, por isso que foi o autor
de Quincas Borba o primeiro a compreender toda a sua extensão, ainda sem meio
dos deslumbramentos do século, o fracasso do homem no seu afã de domínio sobre
a natureza e os enigmas tenebrosos da existência."
O tom que foi infundido à obra pareceu, a princípio, bastante exótico e
estranho às nossas letras. Os críticos atribuíam às suas leituras inglesas o
aparecimento deste humor. Mas, aos poucos os cultores do humor se multiplicaram
em outras literaturas e desaparece a certeza da influência, exclusivamente,
inglesa.
Você pode notar que, em geral, o humorismo corta, na obra de Machado de Assis,
uma digressão que parecia querer estender-se e, justamente quando o autor dá a
impressão de querer desviar-se da profundidade da idéia, é que nos leva a
considerá-la. Como exemplo, temos o capítulo CXVII:
A história do casamento de Maria Benedita é curta; e, posto Sofia e ache
vulgar, vale a pena dizê-la. Fique desde já admitido que, se não fosse a
epidemia das Alagoas, Talvez não chegasse a haver casamento; donde se conclui
que as catástrofes são úteis, e até necessárias. Sobejam exemplos; mas basta um
contozinho que ouvi em criança, e que aqui lhes dou em duas linhas. Era uma vez
uma choupana que ardia na estrada; a dona, - um triste molambo de mulher, -
chorava o seu desastre, a poucos passos, sentada no chão. Senão quando, indo a
passar um homem ébrio, viu o incêndio, viu a mulher, perguntou-lhe se a casa
era dela.
— É minha, sim, seu senhor; é tudo o que eu possuía neste mundo.
— Dá-me então licença que acenda ali o meu charuto?
O padre que me contou isto certamente emendou o texto original; não é
preciso estar embriagado para acender um charuto nas misérias alheias. Bom
Padre Chagas! - Chamava-se Chagas. - Padre mais que bom, que assim me incutiste
por muitos anos essa idéia consoladora, de que ninguém, em seu juízo, faz
render o mal aos outros; não contando o respeito que aquele bêbado tinha ao
princípio da propriedade, - a ponto de não acender o charuto sem pedir licença
à dona das ruínas. Tudo idéias consoladoras. Bom Padre Chagas!"
É genial o comentário que o autor faz sobre o casamento de Maria Benedita.
Graças a epidemia das Alagoas, a prima Sofia se vê no caminho do matrimônio. É
como o ébrio que diante do incêndio pede licença para acender o charuto.
Machado de Assis usa o humor, também, como arma para lutar contra o pessimismo.
Humor em que a gente ri da gente mesmo. Rir para não chorar. Riso com uma
sobrecarga de amargura.
Surge, então, o Humanitismo. Que é esta filosofia? É uma visão ir6onica das
filosofias que pregam ser a humanidade feita de uma só essência. A teoria dos
Humanitas nasce em oposição ao Humanismo. Nesta, o homem é o centro de tudo e
há uma total valorização dele. No Humanitismo aparece o pensamento pessimista e
absurdo. O homem não aprece como um ser maravilhoso e perfeito, mas cheio de
falsidades, onde um cão pode ser mais amigo e fiel do que ele.
— Desde que Humanitas, segundo a minha doutrina, é o princípio da vida e
reside em toda parte, existe também no cão, e este pode ser assim receber um
nome de gente, seja cristão ou muçulmano...”
“O cão ouvindo, correu a cama. Quincas Borba, comovido, olhou para Quincas
Borba:
— Meu pobre amigo! meu bom amigo! meu único amigo! (Cap. V)
O homem é menos valorizado, no Humanitismo, não significa nada; é falso,
instável e fraco. Podemos notar isto nos personagens machadianos. Tudo é igual.
Na luta pela sobrevivência quem vence é o mais forte. “Ao vencedor as batatas.”
— Não há morte. O encontro de duas expansões, ou a expansão de duas formas,
pode determinar a supressão de uma é a condição da sobrevivência da outra, e a
destruição não atinge o princípio universal e comum. Daí o caráter conservador
e benéfico da guerra. Supõe tu um campo de batatas e duas tribos famintas. As
batatas chegam apenas para alimentar uma das tribos, que assim adquire forças
para transpor a montanha e ira à outra vertente, onde há batatas em abundância;
mas se as duas tribos dividirem em paz as batatas do campo, não chegam a
nutrir-se suficientemente e morrem de inanição. A paz, nesse caso, é a
destruição; a guerra é a conservação. Uma das tribos extermina a outra e
recolhe os despojos. Daí a alegria da vitória, os hinos, aclamações,
recompensas públicas e todos os demais efeitos das ações bélicas. Se a guerra
fosse isso, tais demonstrações não chegariam a dar-se pelo motivo real de que o
homem só comemora e ama o que lhe é aprazível ou vantajoso, e pelo motivo
racional de que nenhuma pessoa canoniza uma ação que virtualmente a destrói. Ao
vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas.(Cap. VI)
Sim. “Ao vencedor as batatas”. Depois da morte de Quincas Borba, Rubião
sente-se dono das batatas. É um vencedor. As batatas, para ele, representavam
riqueza, posição social. Não sabia ele que, na realidade, representavam,
simplesmente, meras batatas. Não tinham valor algum. Seriam, apenas, o veículo
de sua destruição. E ele que até então não entendera a exposição do filósofo,
passa a compreender a fórmula:
— Ao vencedor, as batatas!
Tão simples! tão claro! Olhou para as calças de brim surrado e o rodaque
cerzido, e notou que até há pouco fora, por assim dizer, um exterminado, um
bolha; ma que ora não, era um vencedor. Não havia dúvida; as batatas fizeram-se
para a tribo que elimina a outra para transpor a montanha e ir às batatas do
outro lado. Justamente o seu caso. Ia descer de Barbacena para arrancar e comer
as batatas da capital. Cumpria-lhe ser duro e implacável, era poderoso e forte.
E levantando-se de golpe, alvoroçado, ergueu os braços exclamando:
— Ao vencedor, as batatas!” (Cap. XVIII)
PESSIMISMO. Ao lado dessas observações, colocaremos outra característica
o Pessimismo.
O pessimismo está presente em toda a obra. Isto é devido, em grande parte, ao
agravamento de sua doença, a epilepsia, mal que, latente na infância,
acentua-se por volta dos 40 anos, determinando então seu radical cepticismo. É
o que reconhece Viana Moog:
Ferido no seu orgulho pelo mal que o aflige, Machado de Assis, vinga-se
derramando sobra a humanidade a bílis do humor”. “O homem que proclamava, ao
termo da primeira fase, que alguma coisa se salva ao naufrágio das ilusões,
transforma-se em justiçador dos homens e da vida. Na vida só vê insanidade e
imperfeição imanentes. Nos homens só se vêem imperfeições. Seus olhos não
descansam enquanto não surpreendem em flagrante a deformação de todas as
coisas. (Viana Moog)
Em Quincas Borba,
Machado de Assis vai retratar a sociedade pequeno-burguesa do Segundo Império,
onde o importante era a moda, o vestuário luxuoso, os adornos, a habitação, os
títulos honoríficos. O valor das pessoas estavam, apenas, na sua exterioridade.
Veja alguns exemplos desta preocupação com o mundo exterior.
Um criado trouxe o café. Rubião pegou na xícara, e, enquanto lhe deitava o
açúcar, ia disfarçadamente mirando a bandeja, que era de prata lavrada. Prata, ouro,
eram os metais que amava de coração; não gostava de bronze, mas o amigo Palha
disse-lhe que era matéria de preço...” (Cap. III)
Fora, alguma gente parada; os vizinhos às janelas, debruçavam-se uns sobre
os outros, com os olhos cheios daquela curiosidade que a morte inspira aos
vivos. Ao demais, havia o coupé do Rubião, que se destacava das caleça velhas.
Já se falara muito daquele amigo do finado, e a presença confirmou a notícia. O
defunto era agora apreciado com certa consideração. (Cap. CI)
Quando Rubião perde o dinheiro e a lucidez, você já pode imaginar que, também,
os amigos o deixam. Palha e Sofia, os que mais se beneficiaram com a fortuna de
Rubião, agora se afastam dele e não têm tempo nem de interná-lo numa Casa de
Saúde.
É uma grande amolação, redargüiu este (Palha). E perguntou que interesse
tinha Dona Fernanda em tomar àquele negócio. Que o tratasse ela mesma! Era uma
atrapalhação Ter de cuidar de novo do outro, de o acompanhar, e, provavelmente,
de recolher e gerir algum resto de dinheiro que ainda houvesse, fazendo-se
curador, como dissera o Doutor Teófilo. Um aborrecimento de todos os diabos.
(Cap. XLXIV)
É o interesse sempre presente no ser humano. Só existem “amigos” enquanto há
alguma possibilidade de lucros materiais. Acaba-se o dinheiro, acabam-se as
“amizades”.
Mais uma característica poderá ser colocada ao lado destas – a sátira.
O que é uma sátira? É uma caricaturização de tipos, situações políticas,
situações amorosas, etc.
Em Quincas Borba
vamos encontrar vários exemplos.
Dr. Camacho é o primeiro desta galeria, o qual representa bem a caricatura do
politiqueiro demagogo.
Camacho era homem político. Formado em direito em 1844, pela faculdade do
Recife, voltara para a província natal, onde começou a advogar; mas a advocacia
era um pretexto. Já na academia, escrevera um jornal político, sem partido
definido, mas como muitas idéias colhidas aqui e ali, e expostas em estilo meio
magro e meio inchado. Pessoa que recolheu esses primeiros frutos de Camacho fez
um índice dos seus princípios e aspirações:
- ordem pela liberdade, liberdade pela ordem; - a autoridade não pode abusar
da lei, sem esbofetear-se a si própria; - a vida dos princípios é necessidade
moral das nações novas como das nações velhas; - dai-me boa política,
dai-vos-ei boas finanças; (Barão Louis); - mergulhemos no Jordão
constitucional; - daí passagem aos valentes, homens do poder; eles serão os
vossos sustentáculos, etc, etc.”(Cap. LVII).
A sua linguagem é pomposa e enriquecida com constante uso do vocabulário
latino. É o que vemos no capítulo CX:
Os partidos devem ser unidos e disciplinados. Há quem pretenda (mirabile
dictu!) que essa disciplina e união não podem ir ao ponto de rejeitar os benefícios
que caem das mãos dos adversários. Risum teneatis! Quem pode proferir tal
blasfêmia sem que lhe tremam as carnes? Mas suponhamos que assim seja, que a
oposição possa, uma ou outra vez, fechar os olhos aos desmandos do governo, à
postergação das leis, aos excessos da autoridade, à perversidade e aos
sofismas. Qui inde? Tais casos, - aliás, raros, - só podiam ser admitidos
quando favorecessem os elementos bons, não ao maus. Cada partido tem os seus
díscolos e sicofantas. É interesse dos nossos adversários ver-nos afrouxar, a
troco da animação dada à parte corrupta do partido. Esta é a verdade; negá-lo é
provocar-nos à guerra intestina, isto é, à dilaceração da alma nacional... Mas,
não, as idéias não morrem; elas são o lábaro da justiça. Os vendilhões serão
expulsos do templo; ficarão os crentes e os puros, os que põem acima dos
interesses mesquinhos, locais e passageiros a vitória indefectível dos
princípios. Tudo que não for isto ter-nos-á contra si Alea jacta est.”
Carlos Maria – é a segunda caricatura da nossa galeria. É o conquistador,
galanteador, o próprio “don Juan”. No capítulo LXXI, vamos ver um exemplo deste
jovem enganador de corações femininos, como é o caso daquela frase bonita que
dissera à Sofia e com a qual esta durante muito tempo sonhou:
A noite era clara; fiquei cerca de uma hora , entre o mar e a sua casa. A
senhora aposto que nem sonhava comigo? Entretanto, eu quase que ouvia a sua
respiração. O mar batia com força, é verdade, mas o meu coração não batia menos
rijamente; com esta diferença que o mar é estúpido, bate sem saber por quê, e o
meu coração saber que batia pela senhora.”
Sofia teve um calafrio, procurou esquecer o texto, mas o texto ia-se
repetindo: “A noite era clara...”
Mais adiante vamos ter a verdadeira face dos fatos. O que está pensando o
Carlos Maria?
Carlos Maria saboreou de memória toda a conversação da noite, mas, quando se
lembrou da confissão de amor, sentiu-se bem e mal. Era um compromisso, um
estorvo, uma obrigação; e, posto que o benefício corrigisse o tédio, o rapaz
ficou entre uma e outra sensação, sem plano. Ao recordar-se da notícia que lhe
deu de haver ido à praia do Flamengo, na outra note, não pôde suster o riso,
porque não era verdade.(Cap. LXXIV)
Há ainda caricaturas de parasitas (Freitas), amizades falsas (Palha), enfim, de
todos os tipos de uma sociedade.
Outros aspectos do estilo de Machado de Assis, ponderáveis em Quincas Borba são: o
diálogo com o leitor; o gosto pelas citações, referências bíblicas, referências
a capítulos anteriores e uma predileção muito grande por personagens bem
estabelecidas, financeiramente, que agem com muita freqüência, de forma
maquinal e inconsciente.
PERSONAGENS. Na obra de Machado de Assis, o mais importante é o caráter
dos personagens. Eles não estão presos à trama da narrativa. Movimentam-se num
ambiente mais de reflexões do que de ação.
É interessante você notar que o personagens são levados por uma força maior que
eles. Ficam sempre passivos, e esta força determina-lhes as ações. Sempre é
usada a expressão “deixou-se estar”, “deixou-se ficar”.
Foi aqui que o pé direito de Rubião descreveu uma curva na direção exterior,
obedecendo a um sentimento de regresso; mas o esquerdo, tomado de sentimento
contrário, deixou-se estar; lutaram alguns instantes...” (Cap. XLVII).
Mais um exemplo é o capítulo que se segue:
Na rua, encontrou Sofia com uma senhora idosa e outra moça. Não teve olhos
para ver bem as feições destas; todo ele se foi pouco para Sofia. Falaram-se
acanhadamente, dous minutos apenas, e seguiram o seu caminho. Rubião parou
diante, e olhou para trás; mas as três senhoras iam andando sem voltar a
cabeça. Depois do jantas, consigo:
— Irei lá hoje?
Reflexionou muito sem adiantar nada. Ora que sim, ora que não. Achara-lhe um
modo esquisito; mas lembrava-se que sorriu, - pouco, mas sorriu. Pôs o caso à
sorte. Se o primeiro carro que passasse viesse da direita, iria; se viesse da
esquerda, não. E deixou-se estar na sala, no pouf central, olhando. Veio logo
um tílburi da esquerda. Estava dito; não ia a Santa Tereza. Mas aqui a
consciência reagiu; queira os próprios termos da proposta: um carro. Tílburi
não era carro. Devia ser o que vulgarmente se chama de carro, uma caleça inteira
ou meia, ou ainda uma vitória. Daí a pouco vieram chegando da direita muitas
caleças, que voltavam de um enterro. Foi.”(Cap. LXIII)
Rubião, no íntimo, tinha vontade de ir à casa de Sofia. Se o tílburi viesse da
direita, com certeza, ele não ligaria ao fato de não ser um carro. Mas daí a
pouco vieram muitas caleças da direita. É muito curioso o fato de serem caleças
que voltavam de um enterro. Poderá ser a coincidência, mas a partir dessa
decisão, começa o “enterro” de Rubião. É a destruição que caminha a passos
largos ao seu encontro. É a vida que se acaba rapidamente.
ESTRUTURA DO ROMANCE
Para estudarmos o romance Quincas Borba, falaremos sobre a ação, o tempo, o
lugar e os personagens.
AÇÃO. O leitor que vir a obra apenas por seu recheio romanesco, quer dizer,
o enredo ou o entrecho, sairá desiludido da leitura, pois a história contada é
trivial e comum, reduzindo-se a um adultério sonhado, desejado, preparado, que
afinal não se consuma. Só teria curiosidade como coisa nova o fato de ser a
não-realização do freqüente e usual delito do romance realista, a que Machado
de Assis, indiretamente, estava ligado. Mas, esse mesmo aspecto pode frustar o
leitor que apenas busque na leitura o contacto com a tramas das personagens e
não deseje algo mais, que o romance pode e deve dar. E é por esse lado que
Quincas Borba tem de ser olhado, porquanto, se a história é chocha em si, vale
sempre e sempre o escritor que espalha pelo caminho uma quantidade de pérolas
de humanidade e de literatura, muito mais importantes, convenhamos, ao final de
consta, do que uma história bem contada. Tudo isso é complexo e surpreendente:
ao contrário de Memórias Póstumas de Brás Cubas, Machado procurou escrever uma
história que pudesse agradar por si própria e não por aspectos marginais. Tanto
é assim que diligenciou por limpar o texto daquele excesso de reflexões morais
e de interrupções no desenrolar das cenas, comuns no romance anterior. Parece
que teve em mira escrever um romance para ser lido e não para ser analisado,
daí os poucos ou raros desvios do núcleo da obra, toda ela girando em torno
duma paixão que não se consuma em crime, como se fazia prever desde as primeira
páginas. (Massaud Moisés).
A ação se passa no Rio de Janeiro, havendo um recuo no tempo até Barbacena,
onde se passam fatos importantes que dão origem ao romance.
Na Corte é retratada a vida de um grupo de burgueses. Todas as exigências de
uma falsa sociedade são descritas. Machado de Assis disseca a alma humana numa
visão assistemática da vida. Coloca a nu a ambição, a avareza, as hipocrisias
da sociedade.
A narrativa se fecha em Barbacena, onde Rubião aparece louco. É o círculo da
vida. O fim de Rubião é o mesmo de Quincas Borba e tudo termina no mesmo lugar
onde inicia – Barbacena.
A ação, portanto, se concentra em Rubião – Sofia. Mas há núcleos secundários,
de real importância, como é o próprio da estrutura do romance; Sofia- Palha,
Quincas Borba (cão e filósofo),
Teófilo-Fernanda, Carlos Maria-Maria Benedita, Dr. Camacho, Major Siqueira-D.
Tonica, Freitas, etc.
TEMPO. É outro aspeto ponderável no estudo de um romance a determinação
do tempo. Como é fácil observar, a ação decorre na Segunda metade do século
XIX, como se pode aprender das diversas referências a personalidades políticas
e fatos históricos da época.
Não se pode dizer que o desenvolvimento do tempo é rigorosamente cronológico,
havendo, às vezes, recuos que podem lembrar o tempo psicológico, como é o caso
da história dos enforcados (cap. XLVII) a que Rubião “assiste” muito tempo
depois.
Portanto, os acontecimentos ocorrem na época do segundo império e não evoluem
numa cronologia exata. À medida que há necessidade de esclarecimento, volta-se
atrás e quando nada acontece de interessante há um salto sobre o tempo:
Vem comigo, leitor; vamos v6e-lo; meses antes, à cabeceira do Quincas Borba
(cap. III).
Este é o convite feito pelo narrador e, a partir daí, durante 23 capítulos,
acompanhamos a vida de Rubião em Barbacena até ele vir para a Corte.
LUGAR. Como já foi dito, a ação inicia e termina em Barbacena, sendo que
todos os fatos intermediários ocorrem na Corte.
É importante notarmos que, apesar de ser especificado o local, este romance
poderá ser enquadrado em qualquer parte do mundo. A temática é universal. Há
muitos “Palhas e Sofias” por este mundo... Há muitas “Barbacenas” – princípio e
fim de tudo, e muitas “Cortes” que, com seus encantos, envolvem e destroem o
ser humano, como Rubião e o Quincas Borba, cão e filósofo, esmagados pela
loucura da humanidade.
PERSONAGENS. As personagens de um romance são, evidentemente, as pessoas
que vivem situações e dramas dentro da narrativa. Normalmente, só “gente” pode
ser personagem de romance. Às vezes, “animais” também participam de romances e
contos, como tem acontecido com freqüência na literatura moderna. É o caso de
Quincas Borba, o cão, elevado à categoria de personagem do romance machadiano,
como projeção e prolongamento, por metempsicose, do filósofo do mesmo nome.
a) Quincas Borba: em síntese, Quincas Borba se destaca pelos seguintes
atributos: filósofo doido, esquisito, “com freqüente alteração de humor”,
“ímpetos sem motivo”, “ternura sem proporção”, extravagante (cap. V), bom,
alegre, lutava contra o pessimismo (cap. V) e desejava a sua continuidade
através dos tempos como comprova a sua filosofia “borbista”, de natureza
“humorística”, o Humanitismo. Depois que morreu, passou, por metempsicose, ao
corpo do seu cão, como sugerem as dúvidas de Rubião ao longo da narrativa:
“Olhou para o cão, enquanto esperava que lhe abrissem a porte. O cão olhava
para ele, de tal jeito que parecia estar ali dentro o próprio e defunto Quincas
Borba; era o mesmo olhar meditativo do filósofo, quando examinava negócios
humanos...” (cap. XLIX).
Como ressalta o crítico Massaud Moisés, “encarnado-se em seu cachorro, Quincas
Borba continuou a exercer enorme influência, pois eu fiel amigo é um
contraponto constante na evolução dos acontecimentos, pelas vezes em que
aparece contracenando com Rubião. A preeminência indiscutível do animal sobra s
demais personagens, com exceção do Rubião, justifica-se por aquele intuito
satírico geral que orienta a obra, levando o leitor a pensar em como apenas um
cão se salva do mundo de misérias em que vivem as demais criaturas do romance.
Se não se trata de elogio de animalidade inconsciente, ou da mera
inconsciência, pois Quincas Borba é um cão diferente dos outros, por trazer
dentro de si um filósofo idealista e sonhados, é, sem sombra de dúvida, um
recurso de fábula semelhante aos usados por La Fontaine, um dos
escritores mais apreciados por Machado de Assis”.
b) Rubião: de um modo geral, Rubião se caracteriza assim no romance: tem
medo da opinião pública, é indeciso, volúvel, ambicioso (cap. I, X, XV),
megalomaníaco, obsessivo, desequilibrado, tímido (cap. XXV), acomodado,
ciumento, influenciável (cap. LXIX), conflituoso, ocioso, ingênuo.
A sua megalomania, que o levará à sandice, tem desenvolvimento sutil e velado
ao longo da narrativa: “A outra gente, que estava à porta e na calçada fez-lhe
alas” (cap. LX); “Rubião teve aqui um impulso inexplicável, - dar-lhes a mão a
beijar. Reteve-se a tempo, espantado de si próprio” (cap. XCI); “Tinha os olhos
úmidos; acabou, saiu, ladeado pelos outros, e, à porta, com uma só chapelada
para a direita e para a esquerda, saudou a todas as cabeças descobertas e
curvas. Ao entrar no coupé, ainda ouviu estas palavras, a meia voz:
— Parece que é senador ou desembargador, ou cousa assim”(cap. CI)
Depois a megalomania vai aumentando claramente, à medida que sua herança
decresce: é a loucura que está chegando com Napoleão III e a imperatriz
Eugênia.
Enfim, à proporção que vai “enlouquecendo”, Rubião vai ficando cada vez mais
“lúcido” – herdeiro da fortuna e do espírito do filósofo Quincas Borba,
escapando, assim, à chacota e à sátira machadianas, a que são os únicos no
livro, além do cão, que conseguem escapar. É que Machado de Assis só sabe ver o
mundo através da “loucura e do delírio”.
c) Sofia: em linhas gerais, o perfil de Sofia, no romance, se delineia
assim: vaidosa, orgulhosa, dominadora, fria, cautelosa, ambiciosa, sedutora,
caráter ambivalente, frívola, sensual e dissimulada, como revela o cap. LXIX e
o excelente cap. XLII, onde se saiu divinamente bem com a anedota do Padre
Mendes, quando surpreendida, no jantar, com Rubião, pelo Major Siqueira:
“— Olá! Estão apreciando a lua? Realmente, está deliciosa; está uma noite
para namorados... Sim, deliciosa... Há muito que não vejo uma noite assim...
Olhem só para baixo, os bicos de gás... Deliciosa! Para namorados... Os
namorados gostam sempre da lua. No meu tempo, em Icaraí...
Era Siqueira, o terrível major. Rubião não sabia que dissesse; Sofia,
passados os primeiros instantes readquiriu a posse de si mesma; respondeu que,
em verdade, a noite era linda; depois contou que Rubião teimava dizer que as
noites do Rio não podiam comparar-se às de Barbacena, e, a propósito disso,
referira uma anedota de um padre Mendes... Não era Mendes?
— Mendes, sim, o padre Mendes, murmurou Rubião.
O major mal podia conter o assombro. Tinha visto as duas mão presas, a
cabeça do Rubião meio inclinada, o movimento rápido de ambos, quando ele entrou
no jardim; e sai-lhe de tudo isto um padre Mendes... Olhou para Sofia; viu-a
risonha, tranqüila, impenetrável. Nenhum medo, nenhum acanhamento; falava com
tal simplicidade, que o major pensou ter visto mal. Mas Rubião estragou tudo.
Vexado, calado, não fez mais que tirar o relógio para ver as horas, levá-lo ao
ouvido, como se lhe parecesse que não andava, depois limpá-lo com o lenço,
devagar, devagar, sem olhar para um nem para outro...”
Lembremos aqui a Capitu de Dom Casmurro com seus “olhos de ressaca” e natureza
dissimulada, como fica explicitado ao longo do romance.
Mas, por falar em olhos, você notou a importância que Machado de Assis dá aos
olhos de Sofia? Parece de propósito, como observa Cavalcanti Proença: os olhos
seriam as janelas da alma. Afirmações do livro parecem confirmar a observação
do crítico, como esta do cap. L:
“Rubião olhava para ela muita vez, é certo; parece também que Sofia, em algumas
ocasiões, pagava os olhares com outros... Concessões de moça bonita! Mas,
enfim, contanto que lhe ficassem os olhos, podiam ir alguns raios deles. Não
havia de ter ciúmes do nervo óptico, ia pensando o marido.”
Noutra passagem, anotamos este encontro de Palha e Camacho carregado de humor:
Palha e Camacho olharam um para o outro... Oh! esse olhar foi como um
bilhete de visita trocado entre duas consciências. Nenhuma disse o seu segredo,
mas viram os nomes no cartão, e cumprimentaram-se”.
Enfim, concluindo, como ressalta Massaud Moisés, "seu papel acaba por
ser duplo, pois representa a luxúria elegante e, ao mesmo tempo, serve de campo
de prova para todo o drama de Rubião.
d) Palha: ambicioso, egocêntrico, vaidoso (cap. XXXV), bajulador,
interesseiro, parasita, desonesto, astuto, torpe. "Rotulado por um nome que
já lhe traduz o caráter e a personalidade, também se atira ao dinheiro e à
posição social como se estivesse no caminho certo".
Vagamente pensava em baronia, diz Machado no cap. CXXIX.
e) Carlos Maria: vaidoso, altivo (cap. LXIX), vazio, galanteador: é a
caricatura do conquistador de frases feitas e lugares-comuns. Um aspecto que
lhe é bastante característico é o de divindade, que Machado ironiza a toda
hora. Casou-se para ser "adorado" pela esposa.
f) Maria Benedita: tímida, pacata, sem iniciativa, passiva, resignada,
influenciável, personalidade fraca. Seu casamento com Carlos Maria que, à
primeira vista, significou o encontro da felicidade tão longamente sonhada, não
passa de um ludíbrio, em virtude do pouco amor que Carlos Maria lhe dedicava.
g) Dr. Camacho: é caricatura do politiqueiro demagogo de frase feita e
retórica excessiva; astuto e interesseiro.
h) Major Siqueira: mexeriqueiro, inicialmente, e depois despeitado como
se revela no cap. CXXX.
i) D. Tonica: o desespero desta "solteirona quarentona" já
começa pelo nome: D. Tonica. Revela-se invejosa, revoltada, infeliz e
frustrada.
j) D. Fernanda: casamenteira e um tanto fidalga. No mais, uma boa
senhora e esposa dedicada que sabe consertar a gravata do marido nas horas
necessárias... (modelo para as menininhas de hoje que nem consertam gravatas
nem colarinhos...).
k) Teófilo: é o marido da superesposa acima: ambicioso, dinâmico e, às
vezes, temperamental e minucioso, como no caso do "u" pelo
"i" do cap. CXIX, em que um jornal torce todo o sentido da frase que
escrevera: "Na dúvida, abstém-te, é o conselho do sábio. E puseram: Na
dívida abstém-te... É insuportável!" comenta, quase chorando, o Teófilo
que era forte candidato ao ministério...
m) Freitas: caricatura do parasita e dos glutões de jantares e de
charutos alheios. Deus que o tenha na sua santa glória!
PROBLEMÁTICA APRESENTADA
Para concluirmos este trabalho, parece-nos importante destacar aqui três
aspectos ponderáveis no romance: a nulidade da vida, numa visão niilista e
pessimista'; a apresentação de uma sociedade falsa e carcomida pelo câncer da
hipocrisia e da ambição; e a indiferença dos astros do céu diante dos problemas
do homem.
A seguir, procuraremos desenvolver esses três aspectos:
NIILISMO-PESSIMISMO. Sem dúvida, como ressalta o crítico Massaud Moisés,
"o livro todo é uma grande sátira da vida, de seus ingredientes e de suas
"verdades" (...) A ironia atinge a todos e só se salvam (caso o
consigam), os loucos, os mansos e os animais irracionais".
O romance é uma visão fria e impassível da vida. Lúcido como sempre, pessimista
e niilista, Machado de Assis vai dissecando com sua câmera lenta toda a
humanidade, corroída e carcomida pelo câncer da hipocrisia e da falsidade,
espalhando por toda a terra e suas criaturas a sua "bílis" de
epiléptico e de mestiço da sociedade. Tudo perpassado de uma visão irônica, de
um humor niilista e pessimista que sempre marca a literatura machadiana. Em suma,
é uma visão da vida que só a lucidez de um espírito louco, como Quincas Borba,
pode dar: a humanidade desenfreadamente louca a buscar prazeres fáceis e
fugazes, numa vida que só é opróbrio e alienação, embora com toda a fisionomia
de verdade, porque aceita como convenção o imperativo moral da sociedade. No
fim, a vida não passa de uma batatada: come-a a tribo vencedora - "ao
vencedor as batatas". Ao cabo de tudo, os "heróis" da vida pegam
nada, levantam nada e cingem nada, como aconteceu com o Rubião:
Poucos dias depois morreu... Não morreu súdito nem vencido. Antes de
principiar a agonia que foi curta, pôs a coroa na cabeça, - uma coroa que não
era, ao menos, um chapéu velho ou uma bacia, onde os espectadores palpassem a
ilusão. Não, senhor; ele pegou em nada, levantou nada e cingiu nada; só ele via
a insígnia imperial, pesada de ouro, rútilas brilhantes e outras pedras
preciosas(cap. CC).
Enfim, é assim a vida humana; achamos que temos na cabeça uma coroa de ouro,
quando, na verdade, tudo não passa de um chapéu velho ou coisa semelhante.
Mas Rubião é apenas um símbolo - "o fenômeno é universal"- e a vida,
haveria de continuar corredia e besta como ela é, ad saecula saeculorum,
amen...
HIPOCRISIA-AMBIÇÃO. Dentro dessa perspectiva niilista e pessimista é que
Machado situa a sociedade que retrata - sociedade hipócrita e falsa,
interesseira e fútil, incapaz de olhar mais a fundo no íntimo dos problemas.
Em volta do Rubião formou-se a constelação de parasitas e ambiciosos. Quem se
salva entre eles? - Talvez apenas o cão, o único que era capaz de receber um
pontapé e voltar correndo para o seu dono. Acaso alguém se interessou,
realmente, pelo Rubião, quando este perdeu toda a sua fortuna? Entretanto, ele
tivera "amigos". A casa vivia cheia deles.
Enfim, tudo gira em torno do interesse e da ambição e para combatê-los só resta
a ironia e humor. Nada escapa à análise dissecante de Machado nem a troca de um
"u" por um "i" nem a estrutura secular do matrimônio
indissolúvel. Afinal, como pensava D. Fernanda, a propósito do casamento,
"um marido, ainda mau, é sempre melhor que o melhor dos sonhos"...
(cap. CXVIII).
INDIFERENÇA CÓSMICA. Acaba-se o mundo, chore quem quiser, ria, gargalhe
a humanidade, que os astros do céu pouco estão ligando para os risos e lágrimas
humanas. Ficarão sempre firmes e inabaláveis, longe das intempéries do planeta
dos homens. Assistirão,, com a mesma indiferença e impassibilidade de sempre,
"às bodas de Jacó e ao suicídio de Lucrécia" (cap. XLVI).
Este é outro aspecto marcante do romance: a indiferença cósmica com que Machado
de Assis vai fechar o seu livro. A passagem se refere à morte do Rubião e do
cão Quincas Borba:
Eia! Chora os dous recentes mortos, se tens lágrimas. Se só tens riso, ri-te!
É a mesma cousa. O cruzeiro, que a linda Sofia não quis fitar, como lhe pedia
Rubião, está assaz alto para não discernir os risos e as lágrimas dos
homens(cap. CCI)
TEXTO PARA AS QUESTÕES 01, 02 E 03.
Supõe tu um campo de batatas e duas tribos famintas. As batatas
apenas chegam para alimentar uma das tribos, que assim adquire forças para
transpor a montanha e ir à outra vertente, onde há batatas em abundância; mas,
se as duas tribos dividem em paz as batatas do campo, não chegam a nutrir-se
suficientemente e morrem de inanição. A paz, nesse caso, é a destruição; a
guerra é a conservação. Uma das tribos extermina a outra e recolhe os despojos.
Daí a alegria da vitória, os hinos, aclamações, recompensas públicas e todos os
demais efeitos das ações bélicas. Se a guerra não fosse isso, tais
demonstrações não chegariam a dar-se, pelo motivo real de que o homem só
comemora e ama o que lhe é aprazível ou vantajoso, e pelo motivo racional de
que nenhuma pessoa canoniza uma ação que virtualmente a destrói. Ao vencido,
ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas."
(ASSIS, Joaquim Maria
Machado de. "Quincas Borba". Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1997. p.
648-649.)
1.(UEL 2005) Nessa passagem, quem fala é Quincas Borba, o filósofo.
Suas palavras são dirigidas a Rubião, ex-professor, futuro capitalista, mas, no
momento, apenas enfermeiro de Quincas Borba. É correto afirmar que a maneira
como constrói esse discurso revela preocupação com:
a) A clareza e a objetividade,
uma vez que visa à compreensão de Rubião da filosofia por ele criada, o
Humanitismo.
b) A emotividade de suas
palavras, dado objetivar despertar em Rubião piedade pelos vencidos e ódio
pelos vencedores.
c) A informação a ser
transmitida, pois Rubião, sendo seu herdeiro universal, deverá aperfeiçoar o
Humanitismo.
d) O envolvimento de Rubião com a
filosofia por ele criada, o Humanitismo, dada a urgência em arregimentar novos
adeptos.
e) O
estabelecimento de contato com Rubião, uma vez que o mesmo possui carisma para
perpetuar as novas idéias.
2. Com base nas palavras de Quincas Borba,
considere as afirmativas a seguir
I.
As duas tribos existem separadamente uma da outra.
II.
A necessidade de alimentação determina os termos do relacionamento
entre as duas tribos.
III.
O relacionamento entre as duas tribos pode ser amistoso
("dividem entre si as batatas") ou competitivo ("uma das tribos
extermina a outra").
IV. O campo de
batatas determina a vitória ou a derrota de cada uma das tribos.
Estão corretas apenas as
afirmativas:
a) I e IV.
b) II e III.
c) III e IV.
d) I, II e III.
e) I, II e IV.
3. O Humanitismo, filosofia
criada por Quincas Borba, é revelador:
a) Do posicionamento crítico de
Machado de Assis aos muitos "ismos" surgidos no século XIX:
darwinismo, positivismo, evolucionismo.
b) Da admiração de Machado de
Assis pelos muitos "ismos" surgidos no início do século XX:
futurismo, impressionismo, dadaísmo.
c) Da capacidade de Machado de
Assis em antever os muitos "ismos" que surgiriam no século XIX:
darwinismo, positivismo, evolucionismo.
d) Da preocupação didática de
Machado de Assis com a transmissão de conhecimentos filosóficos consolidados na
época.
e) Da
competência de Machado de Assis em antecipar a estética surrealista surgida no
século XX.
4. (Ufsc) Na questão a seguir escreva nos
parênteses a soma dos itens corretos.
Assinale as proposições CORRETAS sobre o
livro QUINCAS BORBA de Machado de Assis.
01. É um livro autobiográfico que
mostra a relação entre estudantes de um internato. A fixação de Sérgio (aluno)
por Ema (esposa do diretor) é uma apresentação clara do Complexo de Édipo.
02. Palha é o nome do marido
FLEXÍVEL de Sofia (palavra que em grego significa sabedoria), que
astuciosamente o traía sem se comprometer.
04. O HUMANITISMO é uma versão
irônica do POSITIVISMO, filosofia que estava em moda no tempo de Machado de
Assis.
08. A preocupação do
autor é salientar que de um lado está o povo (conglomerado humano); de outro, o
poder. O preconceito de cor é disfarce para ocultar o preconceito econômico.
16. AO VENCEDOR AS BATATAS é uma
das frases do HUMANITISMO, filosofia definida por Rubião.
SOMA:______
Capítulo CC
Poucos dias depois, [Rubião] morreu... Não morreu súbdito nem
vencido. Antes de principiar a agonia, que foi curta, pôs a coroa na cabeça, -
uma coroa que não era, ao menos, um chapéu velho ou uma bacia, onde os
espectadores palpassem a ilusão. Não, senhor; ele pegou em nada, levantou nada
e cingiu nada; só ele via a insígnia imperial, pesada de ouro, rútila de
brilhantes e outras pedras preciosas. O esforço que fizera para erguer meio
corpo não durou muito; o corpo caiu outra vez; o rosto conservou porventura uma
expressão gloriosa.
- Guardem a minha coroa, murmurou. Ao vencedor...
A cara ficou séria porque a morte é séria; dous minutos de agonia,
um trejeito horrível, e estava assinada a abdicação.
Capítulo CCI
Queria dizer aqui o fim do Quincas Borba, que adoeceu também,
ganiu infinitamente, fugiu desvairado em busca do dono, e amanheceu morto na
rua, três dias depois. Mas, vendo a morte do cão narrada em capítulo especial,
é provável que me perguntes se ele, se o seu defunto homônimo é que dá titulo
ao livro, e por que antes um que outro, - questão prenhe de questões, que nos
levariam longe... Eia! chora os dous recentes mortos, se tens lágrimas. Se só
tens riso, rite! É a mesma cousa. O Cruzeiro que a linda Sofia não quis fitar,
como lhe pedia Rubião, está assaz alto para não discernir os risos e as
lágrimas dos homens.
(Machado de Assis,
"Quincas Borba")
5. (FATEC 2005) Depreende-se do texto que
a) ao narrar a agonia de Rubião, o narrador
deixa implícito que aquele merecia as honrarias de um rei.
b) a ambigüidade no título do romance,
"Quincas Borba", justifica-se pelo fato de o autor não conseguir
definir-se por homenagear o filósofo ou seu cão.
c) a afirmação que encerra o capítulo CC
revela um traço machadiano característico: a ironia.
d) a declaração de que Sofia não quis fitar o
Cruzeiro revela a indiferença como matriz do estilo do autor.
e) a linguagem empregada para descrever a
morte de Quincas Borba revela tendência do narrador a dar mais importância ao
cão do que a Rubião.
Rubião fitava a enseada,- eram oito horas da manhã. Quem o visse,
com os polegares metidos no cordão do chambre, à janela de uma grande casa de
Botafogo, cuidaria que ele admirava aquele pedaço de água quieta; mas, em
verdade, vos digo que pensava em outra cousa. Cotejava o passado com o
presente. Que era, há um ano? Professor. Que é agora? Capitalista. Olha para
si, para as chinelas (...), para a casa, para o jardim, para a enseada, para os
morros e para o céu; e tudo, desde as chinelas até o céu, tudo entra na mesma
sensação de propriedade.
"Vejam como
Deus escreve certo por linhas tortas", pensa ele. Se mana Piedade tem
casado com Quincas Borba, apenas me daria uma esperança colateral. Não casou;
ambos morreram, e aqui está tudo comigo; de modo que o que parecia uma
desgraça...
(Machado
de Assis)
6. (Mackenzie)Assinale a alternativa correta
quanto ao texto.
a) Instala-se, explicitamente, um
interlocutor-leitor, que é a pessoa a quem o personagem Rubião se dirige, ao
fazer perguntas.
b) Trata-se de um texto sem historicidade, ou
seja, não se relaciona com a História, porque não revela concepções
ideológicas.
c) Revela-se um personagem capitalista que
enxerga o mundo sob a ótica da propriedade.
d) As reticências finais sugerem uma voz que
confirma e reforça a desgraça.
e) As perguntas e respostas são feitas em
discurso direto, já que há duas enunciações.
7. (Ita 2005) Em 1891, Machado de Assis
publicou o romance "Quincas Borba", no qual um dos temas centrais do
Realismo, o triângulo amoroso (formado, a princípio, pelos personagens
Palha-Sofia-Rubião), cede lugar a uma equação dramática mais complexa e com
diversos desdobramentos. Isso se explica porque
a) o que levava Sofia a trair Palha era
apenas o interesse na fortuna de Rubião, pois ela amava muito o marido.
b) Palha sabia que Sofia era amante de
Rubião, mas fingia não saber, pois dependia financeiramente dele.
c) Sofia não era amante de Rubião, como
pensava seu marido, mas sim de Carlos Maria, de quem Palha não tinha suspeita
alguma.
d) Sofia não era amante de Rubião, mas se
interessou por Carlos Maria, casado com uma prima de Sofia, e este por Sofia.
e) Sofia não se envolvia efetivamente com
Rubião, pois se sentia atraída por Carlos Maria, que a seduziu e depois a
rejeitou.
8. (Pucrs 2007)
No início de "Quincas Borba", a personagem Rubião avalia sua
trajetória, enquanto olha para o mar, para os morros, para o céu, da janela de
sua casa, em
Botafogo. Passara de .......... a capitalista ao .......... .
Mas, no final do romance, o personagem acaba morrendo na miséria.
As lacunas podem ser correta e
respectivamente preenchidas por:
a) jornalista
- receber um prêmio
b) professor
- receber uma herança
c) enfermeiro
- se tornar comerciante
d) filósofo
- investir em terras
e) enfermeiro
- se casar com Sofia
9. (Ufes) Quincas Borba, criador da filosofia do Humanitismo,
resumia o princípio do Humanitas em um lema: "ao vencedor, as
batatas". Ao término da leitura do livro de Machado de Assis, pode-se
afirmar que esse lema está intimamente associado ao desenvolvimento e ao
desfecho do enredo. Emblematicamente, a narrativa "Quincas Borba"
demonstra esse princípio filosófico ao colocar as personagens em confronto
permanente no espaço social, procurando sempre um a pilhagem do outro. A partir
desse contexto, é INCORRETO dizer que
a) o narrador é
onisciente, expondo todos os personagens ao dissecamento moral.
b) o narrador,
em primeira pessoa, isenta-se de comentar os fatos da narrativa.
c) o tema do
Humanitismo pode ser resumido em "o homem é o lobo do homem".
d) Palha e Sofia
são personagens que encarnam a ética da tribo vencedora do Humanitas.
e) Quincas
Borba, cão, é um personagem que leva a fidelidade às últimas conseqüências.
10. (Ufmg 2007) Com base na leitura de
"Quincas Borba", de Machado de Assis, é CORRETO afirmar que o
narrador do romance
a) adere ao ponto de vista do filósofo, pois
professa a teoria do Humanitismo.
b) apela à sentimentalidade do leitor no último
capítulo, em que narra a morte de Rubião.
c) apresenta os acontecimentos na mesma ordem
em que estes se deram no tempo.
d) narra a história em terceira pessoa, não
participando das ações como personagem.
XLIX
O cão ladrou de dentro; mas, logo
que Rubião entrou, recebeu-o com grande alegria; e por mais importuno que
fosse, Rubião desfez-se em carícias. A possibilidade de estar ali o testador
dava-lhe arrepios. Subiram juntos a escada de pedra; ali ficaram por alguns
instantes, à luz do lampião que Rubião mandara deixar aceso. Rubião era mais
crédulo que crente; não tinha razões para atacar nem para defender nada: –
terra eternamente virgem para se lhe plantar qualquer coisa. A vida da Corte
deu-lhe até uma particularidade; entre incrédulos, chegava a ser incrédulo...
Olhou para o cão, enquanto
esperava que lhe abrissem a porta. O cão olhava para ele, de tal jeito que
parecia estar ali dentro o próprio defunto Quincas Borba; era o mesmo olhar
meditativo do filósofo, quando examinava negócios humanos... Novo arrepio; mas
o medo, que era grande, não era tão grande que lhe atasse as mãos. Rubião
estendeu-as sobre a cabeça do animal, coçando-lhe as orelhas e a nuca.
– Pobre Quincas Borba! Gosta de
seu senhor, não gosta? Rubião é muito amigo de Quincas Borba...
E o cão movia devagar a cabeça,
para a esquerda e para a direita, ajudando a distribuição das carícias às duas
orelhas pendentes; depois levantava o queixo, para que lhe coçasse embaixo, e o
dono obedecia; mas então os olhos do cão, meio fechados de gosto, tinham um ar
dos olhos do filósofo, na cama, contando-lhe coisas de que ele entendia pouco
ou nada... Rubião fechava os seus. Abriram-lhe a porta; despediu-se do cão, mas
com tais carinhos, que era o mesmo que pedir-lhe que entrasse. O criado espanhol
incumbiu-se de o levar para baixo.
– Não lhe dê pancadas, recomendou
Rubião.
Não lhe deu pancadas; mas só a
descida era dolorosa, e o cão amigo gemeu por muito tempo no jardim. Rubião
entrou, despiu-se e deitou-se. Ah! tinha vivido um dia cheio de sensações
diversas e contrárias, desde as recordações da manhã, e o almoço aos dois
amigos, até aquela última idéia de metempsicose, passando pela lembrança do
enforcado, e por uma declaração de amor não aceita, mal repelida, parece que
adivinhada por outros... Misturava tudo; o espírito ia de um para outro lado
como bola de borracha entre mãos de crianças.
Contudo, a sensação maior era a
do amor. Rubião estava admirado de si mesmo, e arrependia-se; mas o
arrependimento era obra da consciência, ao passo que a imaginação não soltava
por nenhum preço a figura da bela Sofia... Uma, duas, três horas... Sofia ao
longe, os latidos do cão embaixo... O sono esquivo... Onde iam já as três
horas? Três e meia... Enfim, depois de muito cuidar, apareceu-lhe o sono,
espremeu as clássicas
papoulas, e foi um instante; Rubião dormiu
antes das quatro.
ASSIS, Machado de. Quincas Borba.13
ed. São Paulo: Ática, 1995, p. 60-61.
11. No texto, o narrador faz referência ao comportamento de Rubião em
relação ao cão. Acerca desse comportamento, é correto afirmar que o personagem
a) demonstrava um carinho especial pelo animal, independentemente da
amizade com Quincas Borba, o amigo falecido.
b) sentia medo do animal que, por vezes, era estranho e agressivo.
c) gostava muito de animais, quanto mais daquele que lhe lembrava a
fisionomia do falecido.
d) via-se obrigado a agradar o animal, por sentir nele a presença do
amigo falecido.
e) mostrava-se sempre muito alegre e feliz ao reencontrar o seu cão.
12. Leia:
“Rubião era mais crédulo que crente; não
tinha razões para atacar nem para defender nada: – terra eternamente
virgem para se lhe plantar qualquer coisa.” (linhas 4 e 5)
Com base nesse fragmento, é correto afirmar
que Rubião era
a) ingênuo, deixando-se influenciar facilmente pelo meio em que
vivia.
b) avesso às atitudes daqueles que o cercaram.
c) apático à realidade dos fatos, não aceitando a opinião de ninguém.
d) indiferente aos amigos, isolando-se no seu mundo interior.
e) ateu, já que não tinha nenhuma religião.
13. No fragmento “[...]e por mais importuno que fosse,
Rubião desfez-se em carícias.” (linhas 1 e 2), a oração destacada
pode ser substituída, sem alteração do sentido, por:
a) desde que fosse muito importuno
b) à medida que fosse muito importuno
c) ainda que fosse muito importuno
d) uma vez que fosse muito importuno
e) visto que fosse muito importuno
8. Leia os fragmentos:
“[...]terra eternamente virgem
para se lhe plantar qualquer coisa.” (linhas 4 e 5)
“A vida da Corte deu-lhe até
uma particularidade;” (linha 5)
Com relação ao uso do pronome “lhe”,
em destaque nesses fragmentos, identifique as afirmativas corretas:
I. Na primeira ocorrência, remete à expressão
terra eternamente virgem.
II. Na primeira ocorrência, expressa
circunstância de lugar em relação ao verbo plantar.
III. Na segunda ocorrência, completa o
sentido da forma verbal deu, funcionando como objeto indireto.
IV. Na segunda ocorrência, retoma a expressão
A vida da Corte.
V. Nas duas ocorrências, pode ser substituído
pelo termo Rubião.
14. Considerando a postura de Rubião expressa no fragmento “A vida
da Corte deu-lhe até uma particularidade; entre incrédulos, chegava a
ser incrédulo...” (linhas 5 e 6), identifique as afirmativas corretas:
I. Rubião mudara o seu comportamento,
assimilando a maneira de ser dos outros que ora o rodeavam.
II. O comportamento de Rubião reafirma a
teoria do Determinismo, segundo a qual o homem é fruto do meio em que vive.
III. Rubião tornara-se incrédulo,
enquadrando-se no perfil do típico herói romântico.
IV. A vida da Corte transformara o personagem
Rubião, sem contudo nivelá-lo à condição dos demais seres da sociedade
burguesa.
V. O fragmento denuncia a influência que a
sociedade exerce sobre o cidadão, traço característico da obra de natureza
realista.
15. No último parágrafo do texto, o narrador faz considerações acerca
da insônia de Rubião. Com relação a esse estado de insônia, identifique as
afirmativas corretas:
I. O narrador registra o desassossego do
espírito de Rubião, recorrendo à linguagem figurada, comparando-o a uma bola
de borracha entre mãos de crianças. (linha 23)
II. O sono de Rubião era perturbado,
sobretudo, pela lembrança da figura de Sofia, como assinala o fragmento Contudo,
a sensação maior era a do amor. (linha 24)
III. A insônia de Rubião era resultado apenas
da lembrança do enforcado, que se tornara tão presente naquele dia.
(linha 22)
IV. O arrependimento de Rubião acerca de suas
atitudes naquele dia, era obra da consciência e não fruto da imaginação.
(linha 25)
V. O principal motivo que levara Rubião a
perder o sono eram os latidos do cão embaixo...
(linha 26)
Casa de Pensão
(Aluísio de Azevedo )
à1ª Análise:
A obra foi baseada num fato real: a Questão Capistrano, crime que sensibilizou o Rio de Janeiro em 1876/77, envolvendo dois estudantes, em situação muito próxima à da narração de Aluísio Azevedo. Neste livro, o autor estuda as influências da sociedade sobre o indivíduo sem qualquer idealização romântica, retratando rigorosamente a realidade social trazendo para a literatura um Brasil até então ignorada.
Autor fiel à tendência naturalista difundida pelo realismo, Aluísio Azevedo focaliza, nesta obra, problemas como preconceitos de classe, de raças, a miséria e as injustiças sociais. Descreve a vida nas pensões chamadas familiares, onde se hospedavam jovens que vinham do interior para estudar na capital. Diferente do romantismo, o naturalismo enfatiza o lado patológico do ser humano, as perversões dos desejos e o comporta-mento das pessoas influenciado pelo meio em que vivem.
Casa de Pensão é uma espécie de narrativa intermediária entre o romance de personagem (O Mulato) e o romance de espaço (O Cortiço). Como em O Mulato, todas as ações ainda estão vinculadas à trajetória do herói, nesse caso, Amâncio de Vasconcelos. Mas, como em O Cortiço, a conquista, ordenação e manutenção de um espaço é que impulsiona, motiva e ordena a ação. Espaço e personagem lutam, lado a lado, para evitar a degradação.
As teses naturalistas, especialmente o Determinismo, alicerçam a construção das personagens e das tramas.
Romance naturalista de 1884, em que o autor, de carreira diplomática bastante acidentada, move personagens que se coadunam perfeitamente com a análise dos críticos de que seus tipos são, via de regra, grosseiros, não se distinguem pela sutileza da compreensão, nem pela frescura dos sentimentos. São eixos de relações da estrutura da presente narrativa a Província - Maranhão, a Corte - Rio de Janeiro, a casa paterna e a casa de pensão.
Estilo
O naturalismo está plenamente representado em Casa de Pensão desde a abertura do romance, quando Amâncio aparece marcado fatalisticamente pela escola e pela família: uma e outra o encheram de revolta. Por causa de um castigo justo ou injusto, "todo o sentimento de justiça e da honra que Amâncio possuía, transformou-se em ódio sistemático pelos seus semelhantes...". O leite que o menino mamou na ama negra também está contagiado e irá marcá-lo. O médico dizia: "Esta mulher tem reuma no sangue e o menino pode vir a sofrer para o futuro." Amâncio é uma cobaia, um campo de experimentação nas mãos do romancista. Nele o fisiológico é muito mais forte do que o psicológico. É o determinismo que vai acompanhar toda a carreira do personagem.
Está presente também na obra o sentido documental e experimental do romance naturalista, renunciando ao sentimentalismo e à evasão, procura construir tudo sobre a realidade. Como já mencionado, a estória do romance se baseia num caso real.
Linguagem
Uma técnica comum ao escritor naturalista é o abuso dos pormenores descritivo-narrativos de tal modo que a estória caminha devagar, lerda e até monótona. É a necessidade de ajuntar detalhes para se dar ao leitor uma impressão segura de que tudo é pura realidade. Essas minúcias se estendem a episódios, a personagens e a ambientes. Num episódio, por exemplo, há minúcias de tempo, local e personagens. E móveis de uma sala até os objetos mais miúdos.
Não se pode dizer que a linguagem do romance é regionalista; pelo contrário, o padrão da língua usada é geral e o torneio frasal, a estrutura morfo-sintática é completamente fiel aos padrões da velha gramática portuguesa.
Como Machado de Assis, Aluísio Azevedo também usa alguns recursos desconhecidos da língua portuguesa do Brasil, principalmente na língua oral. Assim, por exemplo, o caso daapossínclise (é uma posição especial do pronome oblíquo que não escutamos no Brasil, mas é comum até na língua popular de Portugal). São exemplos de apossínclise: "Há anos que menão encontro com o amigo." (Há anos que não me...) "Se me não engano, você está certo." EmCasa de Pensão essa posição pronominal é um hábito comum.
Foco narrativo
O autor escolheu o seu ponto-de-vista narrativo: a terceira pessoa do singular, um narrador onisciente e onipotente, fora do elenco dos personagens. Como um observador atento e minucioso dentro das próprias fórmulas apertadas do naturalismo. No caso deste romance, Aluísio Azevedo trabalhou muito servilmente sobre os fatos absolutamente reais.
Temática
Como em O Cortiço, Aluísio de Azevedo se torna excepcionalmente rico na criação de personagens coletivos: a casa de pensão, tão comum ainda hoje, no Brasil inteiro, tem vida, uma vida estudante, nas páginas do romance. Aluísio conhecia, de experiência própria, esse ambiente feito de tantos quartos e tantos inquilinos, tão numerosos e tão diferentes, nivelados pela mediocridade e em fácil decadência moral. O autor faz alguns retratos com evidentes traços caricaturais (a sua velha mania ou vocação para a caricatura...), mas fiéis e verdadeiros. Tudo se movimenta diante do leitor: a casa de pensão é um mundo diferente, gente e coisas tomam aspectos novos, as pessoas adquirem outros hábitos, informadas ou deformadas por essa vida comunitária tão promíscua. Aí se encontram e se desencontram, se amontoam e se separam tantos indivíduos transformados em tipos, conhecidos, às vezes, apenas pelo número do quarto. Em O Cortiço o meio social é mais baixo; na Casa de Pensão é médio.
Às doenças morais (promiscuidades, hipocrisia, desonestidades, sensualismos excitados e excitantes, ódios, baixos interesses, dinheiro...) se misturam também doenças físicas (o tuberculoso do quarto 7 que morre na casa de pensão, a loucura e histerismo de Nini...). Foi o que encontrou Amâncio na Casa de Pensão de Mme. Brizard. Fora para o Rio de Janeiro, para estudar. E, num ambiente como esse, quem seria capaz de estudar? É verdade que o rapaz já trazia a sua mentalidade burguesa do tempo: o que ele buscava não era uma profissão, mas apenas um diploma e um título de doutor. Ele, sendo rico, não precisaria da profissão, mas, por vaidade, de um status, de um anel no dedo e de um diploma na parede. Essa mania de doutor, doença que pegou no Brasil, já foi magistralmente caricaturada em deliciosa carta de Eça de Queirós ao nosso Eduardo Prado: "A nação inteira se doutorou. Do norte ao sul do Brasil, não há, não encontrei senão doutores! Doutores com toda a sorte de insígnias, em toda a sorte de funções!! Doutores com uma espada, comandando soldados; doutores com uma carteira, fundando bancos: doutores com uma sonda, capitaneando navios; doutores com uma apito, comandando a polícia; doutores com uma lira, soltando carnes; doutores com um prumo, construindo edifícios; doutores com balanças, ministrando drogas; doutores sem coisa alguma, governando o Estado! Todos doutores..." O próprio Aluísio de Azevedo abandonou a Província para buscar sucessos na Corte (Rio de Janeiro) e, certamente também, um título de doutor...
Personagens
Os personagens, sob nomes fictícios, escondem pessoas reais:
Amâncio da Silva Bastos e Vasconcelos - (João Capistrano da Silva) estudante, acusado de sedução. Foi absolvido.
Amélia ou Amelita - (Júlia Pereira) a moça seduzida, pivô da tragédia.
Mme. Brizard - (D. Júlia Clara Pereira, mãe da moça e do rapaz, assassino) é uma viúva, dona da casa de pensão:
João Coqueiro - Janjão - (Antônio Alexandre Pereira, irmão da moça Júlia Pereira e assassino de João Capistrano. Foi também absolvido).
Dr. Teles de Moura - (Dr. Jansen de Castro Júnior) advogado da família da moça.
Enredo
Amâncio (Da Silva Bastos e Vasconcelos), rapaz rico e provinciano, abandona o Maranhão e segue de navio para o Rio de Janeiro (a Corte) a fim de se encaminhar nos estudos e na vida. É um provinciano que sonha com os deslumbramentos da Corte. Chega cheio de ilusões e vazio de propósitos de estudar... A mãe fica chorosa e o pai, indiferente, como sempre fora no trato meio distante com o filho. O rapaz tinha que se tornar um homem.
Amâncio começa morando em casa do sr. Campos, amigo do Pai, e, forçado, se matricula na Escola de Medicina. Ia começar agora uma vida livre para compensar o tempo em que viveu escravizado às imposições do pai e do professor, o implacável Pires.
Por convite de João Coqueiro, co-proprietário de uma casa de pensão, junto com a sua velhusca mulher Mme. Brizard, muda-se para lá. É tratado com as maiores preferências: os donos da pensão queriam aproveitar o máximo de seu dinheiro e ainda arranjar o seu casamento com Amélia, irmã de Coqueiro. Um sujo jogo de baixo interesses, sobretudo de dinheiro. Naquele ambiente, tudo concorreria para fazer explodir a super-sensualidade do maranhense.
"Ele, coitado, havia fatalmente de ser mau, covarde e traiçoeiro: Na ramificação de seu caráter e sensualidade era o galho único desenvolvido e enfolhado, porque de todos só esse podia crescer e medrar sem auxílios exteriores."
A casa de pensão era um amontoado de gente, em promiscuidade generalizada, apesar da hipócrita moralidade pregada pelo seu dono: havia miséria física e moral, clara e oculta. Com a chegada de Amâncio, a pensão passou a arapuca para prender nos seus laços o jovem, inesperto e rico estudante: pegar o seu dinheiro e casá-lo com a irmã do Coqueiro. Para alcançar o fim, todos os meios eram absolutamente lícitos. Amélia, principalmente quando da doença do rapaz, se desdobrou nos mais íntimos cuidados. Até que se tornou, disfarçadamente, sua amante. Sempre mantendo as aparências do maior respeito exigido dentro da pensão pelo João Coqueiro...
O pai de Amâncio morre no Maranhão. A mãe chama o filho. Ele pretendo voltar, logo que terminarem os seus exames de medicina. Era preciso que o filho voltasse para vê-la e ver os negócios que o pai deixara. Mas o rapaz está preso à casa de pensão e a Amélia: este o ameaça e só permite sua ida ao Maranhão, depois do casamento. Amâncio prepara sua viagem às escondidas. Mas, no dia do embarque, um oficial e justiça acompanhado de policiais o prende para apresentação à delegacia e prestação de depoimentos. Amâncio é acusado de sedutor da moça. João Coqueiro prepara tudo: o caso foi entregue ao famigerado e chicanista Dr. Teles de Moura. Aparecem duas testemunhas contra o rapaz. Começa o enredado processo: uma confusão de mentiras, de fingimentos, de maucaratismo contra o jovem rico e desfrutável para os interesses pecuniários de Mme. Brizard e marido. Há uma ressonância geral na imprensa e, na maioria, os estudantes se colocam ao lado de Amâncio. O senhor Campos prepara-se para ajudar o seu protegido, mas Coqueiro lhe faz chegar às mãos uma carta comprometedora que Amâncio escrevera à sua senhora, D. Hortênsia. E se coloca contra quem não soube respeitar nem a sua casa...
Três meses depois de iniciado o processo, Amâncio é absolvido. O rapaz é levado em triunfo para um almoço, no Hotel Paris.
"Amâncio passava de braço a braço, afagado, beijado, querido, como uma mulher famosa." Todo mundo olhava com curiosidade e admiração o estudante absolvido. E lhe atiravam flores, Ouviam-se vivas ao estudante e à Liberdade. Os músicos alemães tocaram a Marselhesa. Parecia um carnaval carioca.
Em outro plano, Coqueiro, sozinho, vendo e ouvindo tudo. A alma envenenada de raiva. Em casa o destampatório da mulher que o acusava de todo o fracasso. As testemunhas reclamavam o pagamento do seu depoimento. Um inferno dentro e fora dele. Chegaram cartas anônimas com as maiores ofensas. Um homem acuado...
Pegou, na gaveta, o revólver do pai. E pensou em se matar. Carregou a arma. Acertou o cano no ouvido. Não teve coragem. Debaixo da sua janela, gritavam injúrias pela sua covardia e mau caráter... No dia seguinte, de manhã, saiu sinistro. Foi ao Hotel Paris. Bateu no quarto II, onde se encontrava o estudante com a rapariga Jeanete. Esta abriu a porta. Amâncio dormia, depois da festa e da bebedeira, de barriga para cima. Coqueiro atirou a queima-roupa. Amâncio passa a mão no peito, abre os olhos, não vê mais ninguém. Ainda diz uma palavra: "mamãe" ... e morre.
Coqueiro foi agarrado por um policial, ao fugir. A cidade se enche de comentários. Muitos visitam o necrotério para ver o cadáver de Amâncio. Vendem-se retratos do morto. Um funeral grandioso com a presença de políticos, notícias e necrológicos nos jornais, a cidade toda abalada. A tragédia tomou conta de todos.
A opinião pública começa a flutuar, a mudar de posição: afinal, João Coqueiro tinha lavado a honra da irmã...
Quando D. Ângela, envelhecida e enlutada, chega ao Rio de Janeiro, se viu no meio da confusão, procurando o filho. Numa vitrine, ela descobriu o retrato do filho "na mesa do necrotério, com o tronco nu, o corpo em sangue. Uma legenda: "Amâncio de Vasconcelos, assassinado por João Coqueiro, no Hotel Paris...
è 2ª Análise:
ROTEIRO
BIOGRÁFICO
Aluísio
Azevedo (Aluísio Tancredo Gonçalvez de Azevedo), irmão do teatrólogo
Arthur Azevedo, nasceu em S. Luís do Maranhão, em 14 de abril de 1857 e morreu,
com 56 incompletos, em 21 de janeiro de 1913, na capital argentina. Era
diplomata, por concurso, desde 1895, tendo exercido funções em várias partes do
mundo.
O
desenho e a caricatura eram a sua grande vocação. Acabou romancista.
"Fiz-me romancista, não por pendor, mas por me haver convencido da
impossibilidade de seguir a minha vocação que é a pintura. Quando escrevo,
pinto mentalmente. Primeiro desenho os meus romances, depois redijo-os."
(Aluísio Azevedo – Uma vida de romance – Raimundo de Menezes –
Liv. Martins Edit. P. 146). Foi um dos primeiros, entre nós, a procurar viver
ou sobreviver de sua profissão de escritor.
"Escrever tem sido até hoje aqui no Rio de Janeiro a minha grilheta, muito
pesada e bem pouco lucrativa..." (Apud Prosa de Ficção –
Lúcia Miguel Pereira – Liv. José Olympio Edit. – 1957 – 2ª ed. Pág. 143).
"Aluísio Azevedo é no Brasil talvez o único escritor que ganha o pão
exclusivamente à custa da sua pena, mas note-se que apenas ganha o pão: as
letras no Brasil ainda não dão para a manteiga..." (Valentim Magalhães –
apud Raimundo de Menezes – o.c.. pág. 29).
Por
isso, muitas vezes fabricou os seus romances para
(sobre)viver. Alguns de seus livros são de "pura inspiração
industrial", segundo expressão de José Veríssimo. (História de
Literatura Brasileira – Liv. Francisco Alves – Rio – 1916 – pág. 357).
Com alguma facilidade se pode notar o desnível que existe entre os seus
romances. De sua obra ficcional, bastante numerosa, o tempo,
crítico severo, selecionou algumas que ficaram e ficarão na literatura
naturalista brasileira. "De tudo isso só ficaram O Cortiço, O
Coruja, Filomena Borges e O Livro de uma Sogra,
são hoje a bem dizer, ilegíveis. Mas O Cortiço basta para lhe
assegurar a posição de primeiro plano da nossa literatura." (Prosa de
Ficção – Lúcia Miguel Pereira – Liv. José Olympio Edit. – Rio – 1957 –
2ª ed. Pág. 144).
"Casa
de Pensão e O Cortiço, assinalemos desde já, situam-se no
ponto mais alto da curva que descreve a evolução da obra de Aluísio
Azevedo." (Josué Montello – in A Literatura no Brasil –
vol II – pág. 61).
"Quer em O Cortiço quer em Casa de Pensão,
pôde realizar criações romanescas notáveis pela excelente fixação de alguns
tipos, pela movimentação das cenas e pelo jogo das situações dramáticas."
(Aspectos de Romance Brasileiro – Eugênio Gomes – Liv. Progresso
Edit. – Salvador – s.d. pág. 129).
Há
alguma concordância na seleção das duas melhores obras de Aluísio Azevedo,
conforme se pode ver pela crítica citada. Talvez o tempo tenha cometido uma
injustiça, esquecendo O Coruja, uma estória muito humana de uma
personagem tão bonita de alma e tão feia de corpo. Corre no livro uma lírica
visão do homem.
Diz
Josué Montello que "Alcides Maia foi o único grande crítico a chamar a
atenção para a alta importância de O Coruja, não apenas no panorama
restrito da bibliografia de Aluísio, mas dentro do panorama geral de nossa
literatura, ao afirmar que, na sua estranha personagem central, há uma criatura
de arte que roça pelo símbolo e não tem rival no romance brasileiro." (A
Literatura no Brasil – vol. II – pág. 62).
Mas não
há dúvida para a crítica atual que O Cortiço ficou
definitivamente como sua obra-prima: apesar do caráter documental que o livro
apresenta, como romance, supera o ocasional e o informativo, pela criação de
personagens vivos, pela linguagem expressiva, pela superação das exagerações da
escola naturalista.
No
melhor da obra literária de Aluísio Azevedo, nota-se a influência, quase sempre
benéfica, dentro do campo de criação romanesca, de Zola e do autor de O
Crime do padre Amaro, Eça de Queirós. Quando o autor parece escapar dos
dois, torna-se um pobre "produtor de folhetins". (Alfredo Bosi
– História Concisa da Literatura Brasileira – Cultrix – S.
Paulo – 1970 – pág. 209).
Pode-se
classificar a obra de ficção do autor no seguinte quadro didático:
Românticos:
Uma Lágrima
de Mulher (1879)
Condessa
de Vésper (1882) (com o título de Memórias de um Condenado)
Girândola de Amores (1882) (com o título de Mistério da Tijuca)
Filomena
Borges (1884)
A
Mortalha de Alzira (1894)
Demônios
(1893) (Contos)
Realistas
O Mulato
(1881)
Casa de
Pensão (1884)
O Coruja
(1885)
O Homem
(1887)
O
Cortiço (1890)
Livro de
uma Sogra (1895)
Entrando
para a diplomacia em 1895, encerrou definitivamente a sua carreira literária,
em completo desencanto. Hoje, o que lhe dá renome, é a sua obra literária...
Enredo
de Casa de Pensão
Amâncio (Da
Silva Bastos e Vasconcelos), rapaz rico e provinciano, abandona o Maranhão e
segue de navio para o Rio de Janeiro (a Corte) a fim de se encaminhar nos
estudos e na vida. É um provinciano que sonha com os deslumbramentos da Corte.
Chega cheio de ilusões e vazio de propósitos de estudar... A mãe fica chorosa e
o pai, indiferente, como sempre fora no trato meio distante com o filho. O
rapaz tinha que se tornar um homem.
Amâncio
começa morando em casa do sr. Campos, amigo do Pai, e, foçado, se matricula na
Escola de Medicina. Ia começar agora uma vida livre para compensar o tempo em
que viveu escravizado às imposições do pai e do professor, o implacável Pires.
Por
convite de João Coqueiro, co-proprietário de uma casa de pensão, junto com a
sua velhusca mulher Mme. Brizard, muda-se para lá. É tratado com as maiores
preferências: os donos da pensão queriam aproveitar o máximo de seu dinheiro e
ainda arranjar o seu casamento com Amélia, irmã de Coqueiro. Um sujo jogo de
baixo interesses, sobretudo de dinheiro. Naquele ambiente, tudo concorreria
para fazer explodir a super-sensualidade do maranhense.
"Ele, coitado, havia fatalmente de ser mau, covarde e traiçoeiro: Na
ramificação de seu caráter e sensualidade era o galho único desenvolvido e
enfolhado, porque de todos só esse podia crescer e medrar sem auxílios
exteriores." (pág. 166)
A casa
de pensão era um amontoado de gente, em promiscuidade generalizada, apesar da
hipócrita moralidade pregada pelo seu dono: havia miséria física e moral, clara
e oculta. Com a chegada de Amâncio, a pensão passou a arapuca para prender nos
seus laços o jovem, inesperto e rico estudante: pegar o seu dinheiro e casá-lo
com a irmã do Coqueiro. Para alcançar o fim, todos os meios eram absolutamente
lícitos. Amélia, principalmente quando da doença do rapaz, se desdobrou nos
mais íntimos cuidados. Até que se tornou, disfarçadamente, sua amante. Sempre
mantendo as aparências do maior respeito exigido dentro da pensão pelo João
Coqueiro...
O pai de
Amâncio morre no Maranhão. A mãe chama o filho. Ele pretendo voltar, logo que
terminarem os seus exames de medicina. Era preciso que o filho voltasse para
vê-la e ver os negócios que o pai deixara. Mas o rapaz está preso à casa de
pensão e a Amélia: este o ameaça e só permite sua ida ao Maranhão, depois do
casamento. Amâncio prepara sua viagem às escondidas. Mas, no dia do embarque,
um oficial e justiça acompanhado de policiais o prende para apresentação à
delegacia e prestação de depoimentos. Amâncio é acusado de sedutor da moça.
João Coqueiro prepara tudo: o caso foi entregue ao famigerado e chicanista Dr.
Teles de Moura. Aparecem duas testemunhas contra o rapaz. Começa o enredado
processo: uma confusão de mentiras, de fingimentos, de maucaratismo contra o
jovem rico e desfrutável para os interesses pecuniários de Mme. Brizard e
marido. Há uma ressonância geral na imprensa e, na maioria, os estudantes se
colocam ao lado de Amâncio. O senhor Campos prepara-se para ajudar o seu
protegido, mas Coqueiro lhe faz chegar às mãos uma carta comprometedora que
Amâncio escrevera à sua senhora, D. Hortênsia. E se coloca contra quem não
soube respeitar nem a sua casa...
Três
meses depois de iniciado o processo, Amâncio é absolvido. O rapaz é
levado em triunfo para um almoço, no Hotel Paris.
"Amâncio passava de braço a braço, afagado, beijado, querido, como uma
mulher famosa." (317). Todo mundo olhava com curiosidade e admiração o
estudante absolvido. E lhe atiravam flores, Ouviam-se vivas ao estudante e à
Liberdade. Os músicos alemães tocaram a Marselhesa. Parecia um carnaval
carioca.
Em outro
plano, Coqueiro, sozinho, vendo e ouvindo tudo. A alma envenenada de raiva. Em
casa o destampatório da mulher que o acusava de todo o fracasso. As testemunhas
reclamavam o pagamento do seu depoimento. Um inferno dentro e fora dele.
Chegaram cartas anônimas com as maiores ofensas. Um homem acuado...
Pegou,
na gaveta, o revólver do pai. E pensou em se matar. Carregou a arma. Acertou o
cano no ouvido. Não teve coragem. Debaixo da sua janela, gritavam injúrias pela
sua covardia e mau caráter... No dia seguinte, de manhã, saiu sinistro. Foi
ao Hotel Paris. Bateu no quarto II, onde se encontrava o estudante
com a rapariga Jeanete. Esta abriu a porta. Amâncio dormia, depois da festa e
da bebedeira, de barriga para cima. Coqueiro atirou a queima-roupa. Amâncio
passa a mão no peito, abre os olhos, não vê mais ninguém. Ainda diz uma
palavra: "mamãe" ... e morre.
Coqueiro
foi agarrado por um policial, ao fugir. A cidade se enche de comentários.
Muitos visitam o necrotério para ver o cadáver de Amâncio. Vendem-se retratos
do morto. Um funeral grandioso com a presença de políticos, notícias e
necrológicos nos jornais, a cidade toda abalada. A tragédia tomou conta de
todos.
A
opinião pública começa a flutuar, a mudar de posição: afinal, João Coqueiro
tinha lavado a honra da irmã...
Quando
D. Ângela, envelhecida e enlutada, chega ao Rio de Janeiro, se viu no meio da
confusão, procurando o filho. Numa vitrine, ela descobriu o retrato do filho
"na mesa do necrotério, com o tronco nu, o corpo em sangue. Uma legenda:
"Amâncio de Vasconcelos, assassinado por João Coqueiro, no Hotel
Paris..."
O
Estilo da Época
A obra
de Aluísio de Azevedo que ficou na literatura brasileira é o seu romance
naturalista. "Dominava a cena artística brasileira o sistema de idéias
estéticas implantado pela poderosa geração de 1870, e que constituíram o complexo
estilístico do Realismo-Naturalismo-Parnasianismo." (Afrânio Coutinho
– Introdução à Literatura Brasileira – Rio de Janeiro – 1964 –
2ª ed.-pág. 207).
O
realismo tende para uma visão biológica do homem; o naturalismo,
para uma visão patológica: um homem dominado pelo animalesco,
marcado por taras e degenerecências, produto fatal da hereditariedade, uma
apenas máquina sujeita às leis físico-químicas. Os greco-latinos acreditavam na
fatalidade (Moira) a quem estavam sujeitos os mesmos deuses. A ciência
pseudo-ciência do século XIX ensinou ao naturalistas a crença na hereditariedade.
O personagem de tragédia que era escravo da fatalidade se torna escravo da
hereditariedade para os naturalistas. Uma das confusões mais comuns entre eles
era a da ciência com a literatura. Se o realismo nos deu um romance-documental,
o naturalismo - verdadeiro laboratório – nos deu um romance-experimental,
na mesma linha do Roman expérimental de Zola (1880).
"Entendemos que um romancista deve ser ao mesmo tempo um observador e
um experimentador. O observador expõe os fatos tais quais os
observou, estabelece o terreno sólido em que se vão mover os personagens e
acontecimentos; em seguida surge o experimentador e faz experiências, isto é,
faz seus personagens se movimentarem em determinado enredo, de modo a patentear
que a sucessão dos fatos é a exigida pelo determinismo das coisas
estudadas." (Zola – apud Nelson Werneck Sodré – O Naturalismo no
Brasil – Edit. Civilização Brasileira – Rio de Janeiro – 1965 – pág.
33).
Nessa
fidelidade a uma pseudo-realidade está o erro fundamental de um naturalista
como Aluísio de Azevedo. A pressa com que realizou a sua obra romanesca –
apesar do seu inegável talento – o fez fiel demais às formas e fórmulas do
naturalismo a tal ponto que o romance mostre nitidamente os andaimes e as
outras marcas de sua fabricação. Os personagens se movem dentro do
romance como verdadeiros robôs, teleguiados por forças mecânicas,
dentro do seu meio, obedientes às forças atávicas, sem nenhuma liberdade de ser
e de agir. O naturalista se esqueceu de "que os sinais exteriores são
apenas uma parte da realidade, não podendo a literatura, pois, pelo
levantamento apenas dos dados colhidos pela observação, dos dados exteriores,
reproduzir a realidade; em segundo lugar, não compreendia que a realidade
humana, que é o domínio de que a literatura se ocupa, não está nos indivíduos,
mas na sociedade; finalmente, que a realidade não está no patológico, no
anormal, no excepcional, mas no normal, no comum, no típico." (Nelson
Werneck Sodré – ib. pág. 37-38).
Dentro
do naturalismo, cabem afirmações tão dogmáticas quanto incompletas e, hoje,
erradas, para uma concepção moderna do homem, como estas:
"O
romance deve ser um estudo de um curioso caso fisiológico"; "dados um
homem forte e uma mulher insatisfeita, procurar neles as besta...";
"fazer em dois corpos vivos o que o cirurgião faz em cadáveres..."
(Zola – Apud Nelson Werneck Sodré – ib. pág. 19). Ou: "o vício e a virtude
são os produtos químicos como o açúcar e o vitríolo" (Taine);
"precisamos acanalhar a arte" (Courbet) (apud id. Ib. pág. 19).
O
naturalismo está plenamente representado
em Casa
de Pensão:
1)
Desde a abertura do romance, Amâncio aparece marcado fatalisticamente
pela escola e pela família: uma e outra o encheram de revolta. Por causa de um
castigo justo ou injusto, "todo o sentimento de justiça e da honra que
Amâncio possuía, transformou-se em ódio sistemático pelos seus semelhantes..."
(Casa de Pensão – pág. 25). O leite que o menino mamou na ama negra
também está contagiado e irá marcá-lo. O médico dizia: "Esta mulher tem
reuma no sangue e o menino pode vir a sofrer para o futuro." (ib. pág.
28). Amâncio é uma cobaia, um campo de experimentação nas mãos do romancista.
Nele o fisiológico é muito mais forte do que o psicológico. É o determinismo que
vai acompanhar toda a carreira do personagem.
2)
O sentido documental e experimental do romance naturalista, renunciando
ao sentimentalismo e à evasão, procura construir tudo sobre a realidade. A
estória do romance se baseia num caso real, o caso do estudante
Capistrano, até nos pormenores. Leiamos um resumo dos acontecimentos.
"O
emocionante caso de polícia, logo conhecido e popularizado sob a epígrafe de
"Questão Capistrano", envolve dois jovens e estudantes da Escola
Politécnica, antes da tragédia, grande e inseparáveis amigos: João Capistrano
da Cunha e Antônio Alexandre Pereira.
O tão
debatido "Affaire Capistrano", que o povo e os jornais da época
consagram, divide o público e nascem então acesas polêmicas. O carioca da época
não fala noutra coisa, não discute outro assunto , não se preocupa senão com os
dois processos criminais apesar de rotineiros, em que se misturam a honra de
uma moça e o homicídio do seu sedutor.
O caso
principia trivialmente assim: dona Júlia Clara Pereira é modesta professora de
piano, que, naquele ano de 1875, mora com os dois filhos Antônio Alexandre
Pereira, estudante de engenharia, e Júlia Pereira, de 20 anos, em pequena casa
da Rua Silva Manuel, nº 10. A pobre viúva baiana luta com inauditas
dificuldades para prover a pequena família. As aulas de piano é que lhes mantêm
as despesas da casa e dos estudos. A habitação apresenta-se em péssimo estado e
resolvem alugar outra, no ano seguinte, bem maior e mais cômoda, na Rua do
Alcântara, nº 71, e que, além do pavimento térreo, tem o sótão em forma de
chalé.
Como a
nova moradia possui alguns quartos a mais, deliberam alugá-los, montando assim
uma casa de pensão, muito comum naqueles tempos. Dessa maneira podem auferir
outros lucros para os gastos sempre crescentes. Os dois primeiros pensionistas
são colegas do filho: Mariano de Almeida Torres e João Capistrano da Cunha,
rapazes procedentes do Paraná, tidos e haviados como de bom comportamento e
acolhidos no seio da família Pereira sob o maior carinho e confiança.
Em
pouco, no convívio diário, nasce o namoro entre o estudante Capistrano e a
jovem Júlia. O idílio pega fogo... Voraz concupiscência encarrega-se do
resto... Uma noite – naquela de 13 para 14 de janeiro de 1876 – acontece o
imprevisto: o rapaz não se contém e demanda o quarto da moça, desonrando-a às
brutas, violentado-a...
Na manhã
seguinte, a jovem, entre lágrimas, conta à mãe o que lhe acontecera. A viúva
não tem dúvidas: vai às falas com o moço. Este, como sói acontecer em casos
desse jaez, dá um pretexto qualquer, procura adiar o compromisso do enlace para
data bem remota, quando, então, reparará o dano causado. Enquanto isso, dias e
meses decorrem sem nenhuma atitude do namorado, frio e indiferente ao
cumprimento da palavra empenhada.
Quando
menos se espera, sai de casa e não volta mais. Some de uma vez. Todos
ignoram-lhe o paradeiro. Deixa, apenas, na pensão a roupa, os livros, a mala...
A mãe e o tutor da vítima apressam-se em procurar a delegacia de polícia mais
próxima para a respectiva queixa. Comparecem acompanhados do advogado dr.
Jansen de Castro Júnior, e exigem 50 contos de indenização pelos danos causados!
O
inquérito tem o seu seguimento natural. Concluído, é enviado a Juízo. Os
jornais se encarregam de divulgá-lo num noticiário pormenorizado e profuso,
enchendo colunas e colunas, dias e dias seguidos, a explorar morbidamente a
curiosidade pública. A população apaixona-se pelo caso, tornado assim de
repente, para conseguir fácil casamento... Outros, mais exaltados, são de
opinião contrária, julgam-no digno de pena severíssima.
O
indiciado João Capistrano da Cunha, acolitado por três bons advogados, drs.
Busch Varela e Duque Estrada Teixeira e conselheiro Saldanha Marinho, comparece
à barra do Tribunal, no dia 17 de novembro. Figura como promotor público
interino o dr. Ferreira de Oliveira, que produz veemente acusação. A colossal
massa popular, que enche o salão, vibra. Contradita-se o defensor do réu, dr.
Busch Varela. À réplica do promotor, respondem os outros dois patronos: dr.
Duque Estrada Teixeira e conselheiro Saldanha Marinho, que conseguem a
absolvição do seu constituinte, após calorosos debates, ovacionando os diversos
advogados, e, à saída, prorrompe em palmas ao absolvido, carregado em triunfo
pelos colegas. Oferecem-lhe ainda um banquete em regozijo, no Hotel Paris
O
desfecho tem viva repercussão na sociedade fluminense. A viúva e o irmão da
vítima não se conformam com tão injustiça e iníqua sentença. Desesperado, o
jovem Antônio Alexandre Pereira passa três dias pensando no que deve fazer.
Precisa
tomar atitude. A idéia fixa aflige-o, mortifica-o: necessita lavar a honra da
família tão rudemente ofendida. Resolve fazer justiça com as próprias mãos.
Impõe-se uma lição de mestre ao impune autor da desgraça da irmã, que chora,
dia e noite, envergonhada e entre a profunda prostração.
O
acadêmico adquire uma arma de 25 cápsulas por 22$000 – uma tragédia atrai outra
tragédia – e sai à procura do amigo da véspera. Encontra-o em olena na Rua da
Quitanda, fronteiro ao nº 128, cerca das 10 da manhã, quando se dirige à casa
do seu correspondente, um negociante da Rua de São Pedro. Pelas costas alveja-o
com cinco tiros e fere-o gravemente com apenas um no pulmão esquerdo. O rapaz
corre para o interior do armazém, fugindo a novo disparo e logo cai sem forças
ao chão. Está morto!
O
agressor tenta, em vão, escapar, quando é preso em flagrante por Augusto César
de Mascarenhas, que passa na ocasião, e entrega-o à Justiça.
O pulmão
da vítima achava-se atrofiado, podendo morrer em breve tempo, constataram os
médicos na autópsia.
A
rapaziada da Politécnica exalta-se e promove uma série de homenagens ao colega
morto: veste-se de luto, chora, vai incorporada ao enterro, que se transforma
em apoteose pública, carregado a mão, por estudantes e políticos que comparecem
concitados pela astúcia partidária de Saldanha Marinho, um dos advogados do
morto. O próprio Visconde do Rio Branco, diretor da Escola, suspende as aulas
por dois dias.
O
processo de homicídio corre os trâmites legais. O acadêmico Antônio Alexandre
Pereira senta-se no banco dos réus a 20 de janeiro de 1877. É defendido pelo
mesmo advogado que figurara no caso da irmã, o dr. Jansen de Castro Júnior. Os
debates atraem mais gente que no episódio anterior do defloramento. Agora a
coisa é outra: as antipatias populares, até ontem contra a família Pereira, transforma-se
então em simpatias pelo assassino... O mesmo júri, que absolve o primeiro,
absolve o segundo! Inocenta-o por unanimidade de votos! Também uma salva de
palmas acolhe o veredictum no Tribunal. É o acusado carregado em triunfo pelos
mesmos colegas, que ovacionaram o morto da véspera...
Em
rápidos traços, eis as duas tragédias que abalam o Rio de Janeiro daqueles
tempos: a famosa "Questão Capistrano", que vai, sete anos depois,
inspirar o romancista Aluísio Azevedo no enredo do livro a que dará a epígrafe
de "Casa de Pensão".
(Raimundo de Menezes – Aluísio de Azevedo – Uma vida de romance –
Liv. Martins Editora – S. Paulo – 1958 – pág. 147 a 150).
3)
Os personagens, na sua totalidade, são retratados sob o ângulo patológico:
são casos anormais.
Amâncio
aparece como um super-excitado sexualmente, condicionando proximamente pelo
ambiente da casa de pensão e remotamente pelo sangue e pela educação; Mme.
Brizard e Coqueiro se apresentam como gananciosos a ponto de fazerem negócio à
base da cunhada e irmã; Nini sofre de crises agudas de loucura histérica,
estrebuchando e caindo diante de Amâncio; Lúcia e o marido se mostram também
tipos esquisitos, ela pelo sexo e ele por estranho alheamento. Amélia também se
mete, de cambulhada, nessa enxurrada de sujeiras tentando um bom negócio de
sexo e dinheiro... A própria D. Hortênsia, mulher do Campos, manifesta sinais
de insatisfação sexual: apesar das negativas iniciais diante das propostas...
Essas personagens, quase todas, poderiam mudar-se da Casa de Pensão para
outro romance do autor, mais exagerado, ao sentido naturalista: O Homem.
E se dariam muito bem no novo ambiente ainda mais patológico. A
casa de pensão não se parece com um pequeno e confuso hospital? Os seus
moradores são, em geral, verdadeiros doentes;
4)
Quebra-se o esquema romântico da vitória do bem sobre o mal, do triunfo do(s)
herói(s). Tudo se mistura na vida, trigo e joio, ninguém consegue separá-los,
perde-se a consciência do bem e do mal. Afinal, quem é o bom e quem é o mau?
Se, até certo momento, a opinião pública esteve ao lado de Amâncio, quem nos
garante que, para o final, não estaria já mudando para o apoio a João Coqueiro?
Se o assassino for a julgamento, defendido pelo inteligente e chicanista Dr.
Teles, certamente será também absolvido...
Além
disso, não existem ideais a que aspiram os personagens: eles
ficam reduzidos ao terra a terra, aos aspectos, fisiológicos e animalescos, aos
grandes egoísmos que fazem os homens sórdidos e vis. Não há, em ninguém, traço
algum de grandeza, nem nos personagens principais, nem nos secundários. Essa
visão negativista e materialista exclui qualquer consciência moral no
julgamento dos atos e personagens. E, dentro do quadro de pensamentos e ações
do casal Mme. Brizard e João Coqueiro, o que se faz é praticar o princípio de
que os fins justificam os meios. Assim, o homem ficar reduzido a um amontoado
de contradições, de secreções, de completo materialismo e mecanicismo. Tudo é
esquematizado de acordo com uma obediência cega à lei de causalidade:
ficam eliminadas as ações e reações pessoais para dar lugar às reações de
massa, sem liberdade. Os personagens não se movem, são movidos e levados, cada
um, para o seu desenlance.
5) Uma
técnica comum ao escritor naturalista é o abuso dos pormenores
descritivo-narrativos de tal modo que a estória caminha devagar, lerda e até
monótona. É a necessidade de ajuntar detalhes para se dar ao leitor uma
impressão segura de que tudo é pura realidade. Essas minúcias se estendem a
episódios, a personagens e a ambientes. Num episódio, por exemplo, há minúcias
de tempo, local e personagens. E móveis de uma sala até os objetos mais miúdos.
"Campos entrou no seu escritório e foi sentar-se à secretária. Defronte
dele, com uma gravidade oficial, empilhavam-se grandes livros de escrituração
mercantil. Ao lado, uma prensa de copiar, um copo de água, sujo de pó, e um
pincel chato; mais adiante, sobre um mocho de madeira preta muito alto, via-se
o Diário deitado de costas e aberto de par em par..." (pág. 13).
Um
retrato:
"Seus olhos, pequenos e de cor duvidosa, conservavam a mesma penetração e
a mesma fluidez incisiva de ave de rapina; sua boca, estreita, bem guarnecida e
quase sem lábios, tinha o mesmo riso arqueado, mal seguro e frio, de quem
escuta e observa. Era de altura regular, compleição ética, rosto comprido, de
um moreno embaciado, pouca barba, pescoço magro, nariz agudo, mãos pálidas e
secas, voz doce e cabelo muito crespo, de colorido incerto, entre castanho e
ruivo. Tinha vinte e sete anos, mas aparentava, quando muito, vinde e
dois..." (pág. 55, 56 – É João Coqueiro).
Descrição
da casa de pensão:
"A
casa tinha dois andares e uma boa chácara no fundo. O salão de visitas era no
primeiro. Mobília antiga, um tanto mesclada; ao centro, grande lustre de
cristal, coberto de filó amarelo. Três largas janelas de sacada, guarnecidas de
cortinas brancas, davam para a rua; do lado oposto, um enorme espelho de
moldura dourada e gasta, inclinava-se pomposamente sobre um sofá de molas; em
uma das paredes laterais, um detestável retrato a óleo de Mme. Brizard, vinte
anos mais moça, olhava sorrindo para um velho piano, que lhe ficava fronteiro;
por cima dos consolos, vasos bonitos de louça da Índia, cheios de areia até à
boca..." (pág. 96). E a descrição continua pela página seguinte.
Ainda
um outro retrato: Amélia em dia de festa:
"E
de fato Amélia nesse dia estava encantadora. Vestia fustão branco, sarapintado
de pequenas flores cor-de-rosa. O cabelo, denso e castanho, prendia-se-lhe no
toutiço por um laço de seda azul, formando um grande molho flutuante, que lhe
caía elegantemente sobre as costas. O vestido curto, muito cosido ao corpo,
enluvava-lhe as formas, dando-lhe um ar esperto de menina que volta do colégio
a passar férias com a família. Era muito bem feita de quadris e de ombros.
Espartilhada, como estava naquele momento, a volta enérgica da cintura e a
suave protuberância dos seios, produziam nos sentidos de quem a contemplava de
perto uma deliciosa impressão artística..." (pág. 97 – E a descrição
continua...)
E
o tísico do quarto nº 7:
"O
homem estava muito aflito, debatendo-se contra os lençóis, no desespero da sua
ortopnéia.
A cabeça
vergada para trás, o magro pescoço estirado em curava, a barba tesa, piramidal,
apontando para o teto; sentiam-se-lhe por detrás da pele empobrecida do rosto
os ângulos da caveira; acusavam-lhe os ossos por todo o corpo; os olhos,
extremamente vivos e esbugalhados, de uma fixidez inconsciente, pareciam saltar
das órbitas, e, pelo esvazamento da boca toda aberta, via-se-lhe a língua dura
e seca, de papagaio, e divisavam-se-lhe as duas filas da dentadura..."
(pág. 219 – A descrição continua...)
O
capítulo XVI começa com um longo e minucioso pesadelo de Amâncio...
6)
O naturalista manifesta tendência reformadoras: quando
apresenta um mundo inferior, cheio de taras e doenças, com os seus personagens
marcantemente anormais, a sua preocupação é a melhoria das condições sociais e
geradoras de todo esse quadro clínico muito ruim. O narrador em terceira
pessoa, onisciente e onipotente, de vez em quando faz seus comentários à
margem.
"O
que se lança ao peito da amante desde logo arde e evapora, porque aí o fogo é
por demais intenso; o que se atira ao de um estranho gela-se de pronto na
indiferença e na aridez; mas, tudo aquilo que um filho semeia no coração
materno, brota, floreja e produz consolações. Neste não há chama que devore,
nem frio que enregele, mas um doce amornecer, suave e fecundo, como a palidez de
um seio intumescido e ressumbrante de leite..." (pág. 43).
"Assim sucede sempre aos filhos educados à portuguesa, cujos pais sentem
vexames de lhes patentear o seu amor." (pág. 167)
7) Com
relação ao vocabulário o romancista naturalista manifesta preferências por
palavras científicas ou pseudo-científicas na busca de exprimir-se com o máximo
de exatidão. Vejamos alguns exemplos:
"Conseguiram fazê-lo viver, mas sempre fraquinho, anêmico, muito propenso
aos ingurgitamentos escrofulosos..." (pág. 29).
"... não se contrai ao fartum insalubre das variolóides..."
(190)
"... no desespero de sua ortopnéia..." (219)
"... na sua distanasia." (220)
"... desde a ponta dos dedos até os bíceps" (237)
"... boca devastada por uma anodontia horrorosa."
(299)
Aspectos
Sociais
Como
em O Cortiço, Aluísio de Azevedo se torna excepcionalmente rico na
criação de personagens coletivos: a casa de pensão, tão comum ainda
hoje, no Brasil inteiro, tem vida, uma vida estudante, nas páginas do romance.
Aluísio conhecia, de experiência própria, esse ambiente feito de tantos quartos
e tantos inquilinos, tão numerosos e tão diferentes, nivelados pela
mediocridade e em fácil decadência moral. O autor faz alguns retratos com
evidentes traços caricaturais (a sua velha mania ou vocação para a
caricatura...), mas fiéis e verdadeiros. Tudo se movimenta diante do leitor: a
casa de pensão é um mundo diferente, gente e coisas tomam aspectos novos, as
pessoas adquirem outros hábitos, informadas ou deformadas por essa vida
comunitária tão promíscua. Aí se encontram e se desencontram, se amontoam e se
separam tantos indivíduos transformados em tipos, conhecidos, às
vezes, apenas pelo número do quarto. No "Cortiço" o meio
social é mais baixo; na "Casa de Pensão" é médio.
Às
doenças morais (promiscuidades, hipocrisia, desonestidades, sensualismos
excitados e excitantes, ódios, baixos interesses, dinheiro...) se misturam
também doenças físicas (o tuberculoso do quarto 7 que morre na casa de pensão,
a loucura e histerismo de Nini...). Foi o que encontrou Amâncio na "Casa
de Pensão" de Mme. Brizard. Fora para o Rio de Janeiro, para estudar.
E, num ambiente como esse, quem seria capaz de estudar? É verdade que o rapaz
já trazia a sua mentalidade burguesa do tempo: o que ele buscava não era
uma profissão, mas apenas um diploma e um título
de doutor. Ele, sendo rico, não precisaria da profissão, mas, por vaidade, de
um status, de um anel no dedo e de um diploma na parede. Essa mania
de doutor, doença que pegou no Brasil, já foi magistralmente
caricaturada em deliciosa carta de Eça de Queirós ao nosso Eduardo Prado:
"A nação inteira se doutorou. Do norte ao sul do Brasil, não há, não
encontrei senão doutores! Doutores com toda a sorte de insígnias, em toda a
sorte de funções!! Doutores com uma espada, comandando soldados; doutores com
uma carteira, fundando bancos: doutores com uma sonda, capitaneando navios;
doutores com uma apito, comandando a polícia; doutores com uma lira, soltando
carnes; doutores com um prumo, construindo edifícios; doutores com balanças,
ministrando drogas; doutores sem coisa alguma, governando o Estado! Todos
doutores..." (A Correspondência de Fradique Mendes – Lello e
Irmão Edit. Porto – 1952 – pág. 235). O próprio Aluísio de Azevedo abandonou a
Província para buscar sucessos na Corte (Rio de Janeiro) e, certamente também,
um título de doutor...
Que
vocação tinha Amâncio para a medicina?
"Não se trata aqui de fazer um médico, trata-se de fazer
um doutor, seja ele do que bem quiser! Não se trata de ganhar
uma profissão, trata-se de obter um título. Tu não
precisas de meios de vida, precisas é de uma posição na sociedade." (Casa
de Pensão – pág. 43). A saída de Amâncio de seu meio provincial, por
necessidade de estudar, produz uma pletora no Rio de Janeiro de tantos e tão
diversos tipos de estudantes, provenientes dos mais variados pontos do nosso
imenso país: no Rio eles aprendem com facilidade, com verdadeiros professores,
as artes não de estudar, mas de passar de ano. Coqueiro foi quem instruiu seu
protegido Amâncio nos truques dos apadrinhamentos e protecionismos especiais
(pistolões) para ser aprovado, apesar da maré cheia de sua ignorância.
Como
conseqüência do meio e das intenções dos donos da pensão, acontece, de modo
fatalístico, a sedução de Amélia. O fato tem repercussões sociais: quase toda a
classe estudantil fica a favor do estudante, vítima do meio, dos ardis de todos
(Mme. Brizard e Coqueiro), da própria Amélia... dos camarões. No apoio a
Amâncio estava um apoio também ao machismo, mas de ... conquistador.
Amâncio aparece sempre condicionado e pré-determinado para o seu final trágico,
por causa do extremo sensualismo. É o erótico que tenta conquistar
até a mulher de seu protetor, o Campos. O erotismo é apontado como um dos
nossos defeitos, por excesso, em Bandeirantes e Pioneiros (Paulo
Prado). Sobre os excessos sexuais e suas doenças, Gilberto Freyre (Casa
Grande e Senzala) faz um trocadilho muito significativo: "no Brasil,
antes da civilização, tivemos a sifilização..."
Mme. Brizard e João Coqueiro são apresentados ao leitor como antipáticos e
condenáveis, pela sua ganância de dinheiro, pelo seu mau caráter: ambos estão
comprometidos gravemente no verdadeiro negócio de vender ou
alugar Amélia. Ela era o meio de arrancar dinheiro fácil do rico Amâncio. A
culpa principal é, sem dúvida, a própria Amélia, pivô da tragédia. Refletindo
os seus próprios problemas familiares, Aluísio Azevedo aponta também erros da
educação caseira e escolar. O pai do autor o tratava com certa distância, como
o pai de Amâncio que era secarrão, sem diálogo, duro em apoiar os métodos
coercitivos e antipedagógicos do prof. Pires. Tanto o pai como o professor
ficaram como verdadeiros espantalhos e deixaram marcas na formação do rapaz,
tornando-o recalcado e hipócrita. Por seu lado, D. Ângela se mostra sempre
muito submissa ao marido, à moda antiga, e muito sentimental no relacionamento
com seu filho. Então, os extremos, materno e paterno, se juntam para deformar
para sempre a educação de Amâncio.
Outro
fator decisivo na corrupção final do estudante é o dinheiro fácil com que ele
se engolfa em farras e boêmia e se afasta dos livros. É com razão que Lúcia
Miguel Pereira sintetiza toda a dinâmica do romance em duas palavras fundamentais:
"Na Casa de Pensão, tudo gira em torno da cupidez da
carne ou do dinheiro, inoculada em todas as personagens
pela herança mórbida ou pela sociedade". (Prosa de Ficção –
Liv. José Olympio Edit. – Rio de Janeiro – 1957 – 2ª ed. – pág. 152).
Ainda
como exemplo desse vento social que sopra por todo o romance e pelos outros
melhores do autor, note-se o estudo que faz dosmovimentos de massa, as
flutuações da opinião pública, a posição a favor de Amâncio e, para o fim, uma
clara insinuação de que já começa a tomar partido a favor de Coqueiro e sua
irmã. O autor não aprofunda esse seu estudo de psicologia de massa,
mas apresenta, apesar de superficial, um quadro interessante e válido.
Se o
romance continuasse..., o leitor pode deduzir, com bastante garantia, a massa
popular estaria pressionando o júri para a absolvição de João
Coqueiro, por legítima defesa da honra da irmã.
Linguagem
Não se
pode dizer que a lingua(gem) do romance é regionalista; pelo
contrário, o padrão da língua usada é geral e o torneio frasal, a estrutura
morfo-sintática é completamente fiel aos padrões da velha gramática portuguesa.
Como
Machado de Assis, Aluísio Azevedo também usa alguns recursos desconhecidos da
língua portuguesa do Brasil, principalmente na língua oral. Assim, por exemplo,
o caso da apossínclise. É uma posição especial do pronome oblíquo
que não escutamos no Brasil, mas é comum até na língua popular de Portugal. São
exemplos de apossínclise: "Há anos que me não encontro
com o amigo." (Há anos que não me...) "Seme não
engano, você está certo." Creio que este lusitanismo reflete o tempo: era
moda brasileira imitar a sintaxe portuguesa. Tenho exemplos de Alencar, Joaquim
Manuel de Macedo, Martins Pena, Machado de Assis... Em Casa de Pensão essa
posição pronominal é um hábito comum. Pode-se definir o fenômeno de colocação
como o faz Caldas Aulete:
"Apossínclise:
intercalação de alguma ou algumas palavras entre o verbo e o pronome
complemento átono, como, por exemplo: "o que lhe eu contei, em vez
de: o que eu lhe contei..." (Edit. Delta S.A. – Rio – 1964 –
5ª ed. in verbete).
O hoje
esquecido gramático português, antigamente muito em voga, Cândido de
Figueiredo, publicou uma obra em três volumes com este título: "O que
se não deve dizer".
Como
são muitos os exemplos colhidos no romance, exemplifiquemos apenas:
"Que se não deixasse levar pelos pândegos..." (55)
"... o que lhe não desejo" (56)
"Amâncio já se não lembrava" (62)
"... porque ela se não desprendesse logo" (73)
"São dessas coisas que se não explicam" (103)
"... hás de ver que te não faltará nada" (104)
"Amâncio já os não distinguia" (119)
"... já se não preocupa" (127)
"... já se não podia conter" (143)
"... de tal modo que se não pode levantar da cama" (169)
"... que se não deixasse visgar..." (205)
"Que ela já o não deixava sair" (234)
"Se
me não engano" (334)
O
tratamento usado pelo autor também é diferente do comum no Brasil (exceto Rio
Grande do Sul, por exemplo): tu em vez de você. Os
personagens, quando se ratam por iguais, empregam sempre a Segunda pessoa do
singular.
"Bem, de acordo, respondeu Coqueiro, mas é preciso deixar esse tratamento
de senhor. Entre rapazes não deve haver cerimônias mal entendidas;
somos colegas, temos de ser amigos, por conseguinte tratemo-nos desde já
por tu" (56).
"Mesmo escrevendo o diálogo quase sempre em norma culta,
Aluísio soube fixar algumas características dos níveis mais
baixos..." (Dino Preti – Siciolinguística – Cia Edit.
Nacional – S. Paulo – 1974 – pág. 137). Conforme a situação e o status do
personagem, a linguagem desce a níveis inferiores.
O
vocabulário do autor, às vezes, soa esquisito aos nossos ouvidos. Maria de
Lourdes Teixeira cita alguns exemplos:
À página
56 encontramos esta frase: "... continuava a parolar com embófia".
Ora, o substantivo embófia ou sua variante, empófia,
de origem asiática e muito encontrável em frei João dos Santos, em sua
obra Etiópia Oriental, não me parece usado no Brasil. Da mesma
forma, o verbo aiar (gemer), particularmente caro a
Castilho, e que jamais vi em nossos autores, lá está na página 63:
"Amâncio, muito prostrado, mole, a virar-se de uma para outra banda,
aia-va sempre". Na página 65 aparece o adjetivo retardia (empregado
com freqüência por Filinto Elíseo), em lugar de retardatário, tardo, vagaroso.
Na página 66: "o homem do lixo entrava, e saía, familiarmente, com o seu
gigo às costas".
Gigo,
em vez de cesto ou cabaz, vocábulo aquele muito
usado por Ramalho Ortigão nas Farpas. Na mesma página se refere a
"uma escova de fato", em lugar de escova de roupa, forma aquela não
brasileira e que dá azo a duplo sentido. E linhas abaixo: "encontrou uma
rapariguita de alguns dezesseis anos", frase cuja construção nada tem de
brasileira, parecendo antes coligida de autor português. Na página 105 o
romancista menciona uma "corbelha de farinha"; isto é, a nossa
familiar e nacionalíssima farinheira. Lembre-se a propósito que tal
expressão, corbelha, de boa linhagem vernácula mas admitida em uso
no Brasil através do francês, é encontrada em Diniz, no Hissope, e
em Castilho, nas Geórgicas. Na página 121 lá está, por sinal que na
boca de uma francesa – Madame Brizard – certo ditado arcaico português que se
encontra na Eufrosina, de Jorge Ferreira de Vasconcelos: "por
aí não irá o fato às filhoses". No clássico citado: "não vay por ahi
o gato aos filhós." Logo na página seguinteAluísio emprega o
substantivo godilhão, em lugar de nó, grumo,
ou qualquer outro sinônimo de uso corrente no Brasil: "formar-lhe
godilhões na garganta". Na página 192 ressalta em certa frase outro
vocábulo estranho e ouvidos nacionais: "A sua primeira idéia foi chamar o
Pereira e mostrar-lhe a mulher no latíbulo do amante". O substantivo latíbulo,
que me lembre nunca encontrado em outro autor brasileiro (e que significa
"antro de pecado, esconderijo da perdição), é muito
usado por Bernardes da Nova Floresta e por outros clássicos
portugueses.
(Esfinges de Papel – Edart – S. Paulo – 1966 – pág. 138).
"A
obra de Aluísio Azevedo, portanto, revela-se útil, sobretudo como documento da
língua e da cultura de nossa sociedade, nas décadas de 80 e 90, ainda muito
impregnadas da influência portuguesa. Além disso a rudeza dos temas que abordou
nos permite o conhecimento de uma linguagem afetiva popular, que em muito
contribui para a retratação dos níveis de fala de suas personagens". (Dino
Preti – ib. pág. 140).
Técnicas
Narrativas
O
problema da criação de um personagem romanesco vira mistério até para o próprio
autor. Criado o personagem, ninguém sabe, nem o seu criador, até onde trabalhou
a sua imaginação e onde começa a simples observação da realidade circunstante.
O personagem se pode identificar com esta ou aquela pessoa real? Ou nasceu
totalmente da imaginação onipotente do romancista? Nem um extremo nem outro
pode corresponder à realidade da criação literária
"O
ficcionista pode usar uma pessoa que conheceu como ponto de partida para a
composição duma personagem, mas tendo o cuidado de evitar a fotografia servil.
É justamente durante esse processo de despistamento ou então
no minuto em que o autor resolve criar uma personagem sua, sua mesmo, que
o computador insidiosamente começa a mandar-lhe mensagens, e o
autor corre o risco de usar esses elementos com orgulho demiúrgico, convencido
de que está mesmo criando do nada..." (Érico Veríssimo – Aguilar – vol.
III – pág. 83). Note-se que o computador a que se refere Érico
Veríssimo é o fantástico inconsciente...
Em Casa
de Pensão, o autor escolheu o seu ponto-de-vista narrativo: a terceira
pessoa do singular, um narrador onisciente e onipotente, fora do elenco dos
personagens. Como um observador atento e minucioso dentro das próprias fórmulas
apertadas do naturalismo. No caso deste romance, Aluísio Azevedo trabalhou
muito servilmente sobre os fatos absolutamente reais. (Ver Estilo de
época). Temos portanto um romance à clef, romance de chave,
porque os personagens, sob nomes fictícios, escondem pessoas reais. Assim
podemos identificar os figurantes principais.
Amâncio
da Silva Bastos e Vasconcelos = João Capistrano da Silva,
estudante, acusado de sedução. Foi absolvido.
Amélia
ou Amelita = Júlia Pereira, a moça seduzida, pivô da tragédia.
Mme.
Brizard = é uma viúva, dona da casa de pensão: D. Júlia Clara Pereira, mãe
da moça e do rapaz, assassino.
João
Coqueiro = Janjão = Antônio Alexandre Pereira, irmão da moça Júlia Pereira
e assassino de João Capistrano. Foi também absolvido.
Dr.
Teles de Moura = Dr. Jansen de Castro Júnior, advogado da família da moça.
João
Capistrano foi acusado como incurso nas penas do art. 222, do Código Criminal
do Império: "Ter cópula carnal por meio violento ou ameaças, com qualquer
mulher honesta. Penas: de prisão por três ou doze anos, e de dotar a
ofendida."
O autor
toma visível posição a favor de Amâncio e contra Amélia, João Coqueiro e Mme.
Brizard: (Raimundo de Menezes – Aluísio Azevedo – Uma vida de romance –
Liv. Martins Edit. – S. Paulo – 1958 – pág. 151). O mesmo autor me informa que
o romance já estava, em semente, em Casa de Cômodos (pág.
342).
A
narrativa não obedece a uma ordem cronológica: o cap. I coloca o leitor diante
de Amâncio e Campos, já no Rio de Janeiro. Depois é que o autor volta ao
Maranhão para contar alguma coisa, o que é fundamental dentro das fórmulas
naturalistas, da vida e da educação do personagem. Recorda a escola e a
família, o leite que mamou da ama negra, leite contaminado, a dura opressão do
professor e do pai... tudo para condicionar fatalisticamente o
personagem e fazê-lo chegar, sem liberdade, aonde tinha que chegar. São os
truques repetidos pela escola naturalista. (Veja-se, por exemplo, o mesmo determinismo em O
Missionário de Inglês de Sousa). Essa volta é uma técnica comum que
hoje se chama flash back, palavra tomada de empréstimo ao cinema.
Depois,
a narrativa caminha, de modo geral linearmente e os episódios se passam só no
Rio de Janeiro. Amâncio não faz viagens, planeja apenas a volta à Província:
viagem que não chega a realizar pelos incidentes que o leitor conhece. Um
pequeno paralelo que se fizesse entre o autor e Machado de Assis (lembrem-se de
que Memórias Póstumas de Brás Cubas é da mesma data que O
Mulato (1881) mostraria que Aluísio, diferente do romancista carioca,
não faz descidas em profundidade na alma dos personagens. Eles se forma
superficialmente sem pesquisas psicológicas, uma das características do autor
de D. Casmurro. Sem desvalorizar o maranhense, pode-se afirmar que
Machado de Assis realizou uma obra muito mais orgânica, até mesmo por vocação,
por maior talento. Aluísio escreveu sob pressão ou opressão, enquanto tinha
necessidade de sobreviver e até contrariado porque, segundo sua própria
confissão, tina a vocação da pintura, do desenho, da caricatura, não da
literatura. Acabada a necessidade premente de sobreviver, parou de escrever,
definitivamente, engolfando-se na diplomacia.
Como
narrador fora da estória, como já foi observado em outro lugar, o autor costuma
fazer algumas observações marginais, inclusive como intenções críticas, sobre
educação, sobre os personagens, sobre os fatos.
Pareceu-me feliz o corte final na narrativa para fechar o romance: não fez
nenhum comentário a mais, o que seria excrescente. Já noCortiço, Aluísio
Azevedo ainda acrescenta à tragédia final de Bertoleza um pequeno e inútil
comentário. Terminando como terminou deixa ao leitor o trabalho de perguntar o
que irá acontecer ainda, como ficarão as coisas, sobretudo a situação de João Coqueiro.
Será ou não absolvido? Se os fatos reais nos dão uma resposta (o assassino foi
absolvido), o romance deixa em aberto. A mãe de Amâncio também desaparece com o
final do romance numa atitude indecifrável: quais foram as suas reações diante
do retrato do filho morto? Indecifrável no texto da narrativa e mito fácil para
o sentimento e a imaginação de qualquer leitor.
Como um
naturalista jura fidelidade à vida e à realidade, segundo as suas concepções de
vida e de realidade, o final está de acordo: não há uma vitória do(s) herói(s),
não há um fecho feliz. Quem é que diz que a vida obedece aos nossos desejos
planos?
Crítica
1)
"O autor começa entrando logo em cheio na ação do seu romance e, uma vez
penetrando no círculo em que vivem os seus personagens, não se afasta mais
deles, como que saturado de todos os elementos constitutivos do ambiente físico
e moral da famosa casa de pensão, assunto do seu livro. Como trabalho de
observação, o romance tem tudo quanto é lícito desejar em uma composição desta
ordem. Fundando-se em um fato verdadeiro, que a cidade do rio de Janeiro
presenciou há anos, compreende-se que a lógica dos caracteres mais dramáticos
dessa história não podia falhar. Tendo, além disto, o romancista vivido em
estabelecimentos da natureza do que descreve, estava perfeitamente habilitado a
dar toda a unidade possível à vida do grupo humano que se encarregou de
estudar................................"
"A
Casa de Pensão é um microcosmo: todos os elementos que o constituem,
por um processo felicíssimo de cerebração inconsciente, atraem-se, repelem-se,
aglutinam-se e dão, por último, uma sensação que pode muito bem ser comparada à
reminiscência, em dias febricitantes e de hiperestesia mnemônica, de sucessos
presenciados em alguma parte." (Obra Crítica de Araripe Jr. –
M.E.C – Casa de Rui Barbosa – Rio – 1960 – vol. II – pág. 84 e 85).
2)
"Ele trouxe à nossa ficção mais justo sentimento da realidade, arte mais
perfeita de sua figuração, maior interesse humano, inteligência mais clara dos
fenômenos sociais e da alma individual, expressão mais apurada, em suma, uma
representação menos defeituosa da nossa vida, que pretendia definir. Dos que
aqui por vocação ou mero instinto de imitação demasiado comum das nossas
letras, seguiram o naturalismo e se nele ensaiaram, o que mais cabalmente
realizou este feito da nossa doutrina literária foi Aluísio Azevedo, com uma
obra de mérito e influência consideráveis..." (História da Literatura
Brasileira – José Veríssimo – Liv. Francisco Alves – Rio – 1916 – pág.
336).
3)
"Na Casa de Pensão, tudo gira em torno da cupidez da
carne ou do dinheiro, inoculada em todas as personagens pela herança mórbida ou
pela sociedade. Entretanto, e nisso reside a prova do talento de romancista de
Aluísio Azevedo, tomados em conjunto, esses bonecos de engonço adquirem
inesperada vitalidade. Se a vida interior é quase nula, a vida de relação é
ativa e real. Desde que se trate de contatos superficiais, a narrativa se
movimenta, ganha força e nervo... Da soma das criaturas e duas dimensões surge
uma entidade nova – a casa de pensão, com os seus moradores de uma psicologia
especial, pobres criaturas desenraizadas pela enxurrada da vida, provenientes
dos meios os mais diversos, que adquirem uma espécie de alma comum, feita pela
solidariedade negativa que as une." (Prosa de Ficção – Lúcia
Miguel Pereira – Liv. José Olympio Edit. – Rio – 1957 – 2ª ed. pág. 152 – 153).
4)"
Em Casa de Pensão, realmente, há qualidades marcantes de
ficcionista, e o ambiente, o das habitações coletivas, conhecido do autor, e a
marca que deixa nas criaturas, também por ele experimentada, ficam
excelentemente representadas.".....
"Aluísio Azevedo é um exemplo, no naturalismo brasileiro, do escritor que
trabalha constrangido pela fórmula e que vacila entre o desgregamento
romântico, a que se submete demasiado facilmente, embora lamentando o fato, e o
espartilho naturalista, que o deixa peado, a que obedece a contragosto." (História
da Literatura Brasileira – Nelson Werneck Sodré – Liv. José Olympio
Edit. – Rio – 1960 – 3ª ed. – pág. 360 – 361).
5)
"Em Casa de Pensão – cronologicamente, o
primeiro grande romance de Aluísio, depois de O Mulato, o
romancista marca a transição de dois ambientes: o do Maranhão, de que provinha,
e o do Rio de Janeiro, a que se adaptara. Este livro, pelo aglomerado humano
que esboça, é uma espécie de preparação para a experiência mais profunda e mais
ampla de O Cortiço. Nele encontramos o Aluísio aprimorado, senhor
da técnica da narração, mestre da fixação de tipos e caracteres, a conduzir o
drama ou aventura de seus personagens com o rigor da justa medida. Não há
excessos em suas páginas. O próprio desfecho que poderia parecer arbitrário, é
uma transposição do caso real para o romance." (Aluísio Azevedo – Josué Motello – Agir – 1963 – pág. 11 –
12).
6)
"Em Casa de Pensão, de 1884, que firmam melhor as
qualidades do escritor. Nesse romance mostra-se ele mais senhor do ofício. A
apresentação dos personagens, a descrição das cenas, a evolução do enredo, são
realizados com maior senso de objetividade e equilíbrio. Reveste-se de toda a
sobriedade o momento em que Amâncio se apresenta a Campos, interrompendo-lhe a
correspondência para o norte. Nem são destituídos de vida episódios de boêmia
carioca. Muitos personagens exsudam vida, como aquele Campos ou a esposa,
Hortênsia. Não se isenta, entretanto, de lacunas. Há criaturas, como João
Coqueiro ou Amelinha, em cujos perfis o autor se gasta em tintas naturalistas e
que acabam por se afogar no convencionalismo. Há outros, como Amâncio, de que
temos a impressão de que vivem de real vida para logo em seguida sentirmos
baldos de realidade." (A Literatura Brasileira – O Realismo –
João Pacheco – Edit. Cultrix – S. Paulo – 1963 – pág. 135).
7)
"Não resta dúvida que a obra de Aluísio Azevedo resiste
ao tempo e ao desgaste das escolas, por revelar força criadora incomum em nossa
ficção e por se conjugarem nela a observação da realidade brasileira com seus
problemas sociais, a experiência humana e o conhecimento artesanal. E todos
esses atributos impulsionados por intensa vibração participante, bem típica não
só do temperamento do autor como de sua filiação naturalista.
Respeitadas as características de cada um e as conseqüentes diferenciações,
pode-se dizer que as obras de Aluísio Azevedo, José de Alencar e
Machado de Assis constituem as colunas de resistência do romance brasileiro do
passado. E nessa trindade de valores o lugar ocupado pelo maranhense tem, além
disso, especial significação historiográfica, sendo ele como é o tal como o
concebeu Zola, com os seus postulados: a crítica da sociedade, "a ciência
dos temperamentos", a anatomia dos caracteres, a patologia das paixões, a
determinação exata das circunstâncias, as finalidades éticas e, de acordo com o
pensamento de Eça de Queirós, os ideais de justiça e verdade."
(Maria
de Lourdes Teixeira – ibidem – pág. 139).
PARNASIANISMO
1 – CONTEXTUALIZAÇÃO
O Parnasianismo é
a manifestação poética do Realismo, embora ideologicamente não tenha todos os pontos
de contato com os romancistas realistas e naturalistas. É uma estética
preocupada com a “arte pela arte”, com seus poetas à margem das grandes transformações
do final do século XIX e início do século XX.
Sua denominação é uma
alusão às antologias publicadas na França a partir de 1866 com o título Le
Parnase Contemporain. O Parnasianismo ocorreu apenas no Brasil e na
França, não tendo sido cultivado em outros países. A origem da palavra
Parnasianismo associa-se ao Parnaso
grego, segundo a lenda, um monte da
Fócida, na Grécia central, consagrado a Apolo (deus do sol da beleza) e às musas,
era freqüentado por poetas em busca de inspiração.
A escolha do nome já
comprova o interesse dos parnasianos pela tradição clássica. Acreditavam
que, assim, estariam combatendo os exageros de emoção e
fantasia do
Romantismo e,
ao mesmo tempo, garantindo o equilíbrio desejado, por se apoiarem nos modelos
clássicos. A presença dos elementos clássicos na poesia parnasiana não ia além
de algumas referências a personagens da mitologia e de um enorme esforço de equilíbrio
formal. Por se afirmar que não passava de um verniz que revestiu
artificialmente essa arte, como forma de
garantir-lhe prestígio entre a camadas
letradas do público consumidor brasileiro. Apesar de contemporâneos, o Parnasianismo
difere do Realismo e do Naturalismo.
Enquanto esses
movimentos se propunham a analisar e a compreender o homem, o Parnasianismo
se distancia da
realidade e se volta para si
mesmo. Defendendo o princípio da “arte pela arte”, os parnasianos
achavam que o objetivo
maior da arte não é tratar de
problemas humanos e sociais, mas alcançar a “perfeição” em sua construção:
rimas, métrica, imagens, vocabulário seleto, equilíbrio e contenção emocional.
A primeira publicação considerada parnasiana é a obra Fanfarras
(1882), de Teófilo Dias, contudo, o
papel de implantação do ideário Parnasianismo
coube à tríade formada por
Olavo Bilac, Raimundo Correia
e Alberto
de Oliveira.
2. CARACTERÍSTICAS DO
PARNASIANISMO
a) Preocupação formal: Revela-se
na busca da palavra exata ou preciosismo vocabular. Há preferência por sonetos
e versos decassílabos ou alexandrinos (com versos de 12 sílabas poéticas);
por rimas ricas ou
raras; e por chaves de
ouro – versos que concluem a idéia com um belo efeito. Todo esse rigor
formal evidencia o tecnicismo dos poetas parnasianos.
b) Contenção lírica: A arte
poética deve estar subordinada à razão e a objetividade; a razão
predomina sobre a emoção, pois esta última pode comprometer a eficiência
técnica do poeta, logo, nada de temas intimistas, confessionais. Vale ressaltar
que alguns
poetas parnasianos deixam-se trair por
uma índole romântica.
c) Arte pela arte: O parnasiano
não admite o caráter utilitário e de engajamento da arte. O único compromisso
assumido é com a beleza que, para eles, está na elaboração formal. Por
isso, os poetas se isolam na “torre de marfim”, alienando-se da realidade de
seu próprio tempo.
d) Preferência por temas
descritivos: A poesia toma
como temas paisagens, vasos, estátuas,
templos, cenas históricas. Esse aspecto faz com que haja uma aproximação entre
a poesia e as artes plásticas. São comuns comparações entre o fazer poético e o
de um escultor, ou pintor, por exemplo. Os temas universais
como o amor, a beleza, as artes, o
tempo são
tratados de maneira impessoal.
e) Revalorização da cultura
clássica: “Na concepção parnasiana, são freqüentes as metáforas inspiradas em
lendas e histórias da Antigüidade Clássica, novamente, a tradição
greco-latina torna-se o ideal de beleza, distinguindo-se os parnasianos dos
românticos.”
f) Metapoesia (Metalinguagem) Falar
da criação poética, da própria poesia artísticas:
g) É importante ressaltar é comum
encontrarmos o predomínio da ordem indireta (hipérbato).
APRECIAÇÃO DOS
TEXTOS.
I - Profissão de Fé –
O Labor Poético.
[...]
Invejo o ourives quando escrevo:
Imito o amor
Com que ele, em ouro, o alto relevo
Faz de uma flor.
Imito-o. E, pois, nem de Carrara
A pedra firo:
O alvo cristal, a pedra rara,
O ônix prefiro.
Por isso, corre, por servir-me,
Sobre o papel
A pena, como em prata firme
Corre o cinzel.
Corre; desenha, enfeita a imagem,
A idéia veste:
Cinge-lhe ao corpo a ampla roupagem
Azul-celeste.
Torce, aprimora, alteia, lima
A frase; e, enfim,
No verso de ouro engasta a rima,
Como um rubim.
Quero que a estrofe cristalina,
Dobrada ao jeito
Do ourives, saia da oficina
Sem um defeito:
E horas sem conta passo, mudo,
O olhar atento,
A trabalhar longe de tudo
O pensamento.
Notas de Vocabulário.
ourives: artesão que fabrica
jóias com metais e pedra preciosas.
Carrara: região da Itália
rica m mármore.
ônix: pedra com variedade
de cores, inclusive a cor preta.
cinzel: instrumento de aço,
com uma das extremidades
cortantes, usado por
escultores.
cingir: rodear, colocar em
torno de.
altear: elevar, tornar
alto.
engastar: encravar em ouro,
prata etc.
rubim: ou rubi, pedra
preciosa vermelha.
lavor: trabalho manual de
caráter artístico e artesanal.
Becerril: nome de um famoso
artesão.
perícia: habilidade.
I - Via Láctea
(soneto XIII) –
Amor e Distanciamento.
“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!” E eu vos direi, no
entanto,
Que para ouvi-las, muitas vezes
desperto
E abro as janelas, pálido de
espanto...
E conversamos toda a noite, enquanto
A via láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e
em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem quando estão contigo?”
E eu vos direi: “Amai para
entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender
estrelas”.
II - Nel Mezzo Del
Camin
Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada
E triste, e triste e fatigado eu
vinha.
Tinhas a alma de sonhos povoada,
E a alma de sonhos povoada eu tinha...
E paramos de súbito na estrada
Da vida: longos anos, presa à minha
A tua mão, a vista deslumbrada
Tive da luz que teu olhar continha.
Hoje, segues de novo... Na partida
Nem o pranto os teus olhos umedece.
Nem te comove a dor da despedida.
E eu, solitário, volto a face, e
tremo.
Vendo o teu vulto que desaparece
Na extrema curva do caminho extremo
III – Satânia –
Sensualidade.
Nua, de pé, solto os cabelos às costas
Sorri. Na alcova perfumada e quente,
Pela janela como um rio enorme
Profusamente a luz do meio-dia
Entra e se espalha palpitante e viva.
Entra, parte-se em feixes rutilantes,
Aviva as cores das tapeçarias,
Doura os espelhos e os cristais
inflama.
Depois, tremendo, como a arfar,
desliza
Pelo chão, desenrola-se, e, mais leve,
Como uma onda vaga preguiçosa e lenta
Vem lhe beijar a pequena ponta
Do pequenino pé macio e branco.
Sobe... cinge-lhe a perna longamente;
Sobe... – e que volta sensual descreve
Para abranger todo o quadril! –
prossegue,
Lambe-lhe o ventre. abraça-lhe a
cintura
Morde-lhe os bicos túmidos dos seios
Corre-lhe a espádua, espia-lhe o
recôncavo
Da axila, acende-lhe o coral da boca,
E antes de se ir perder na escura
noite,
Na densa noite dos cabelos negros,
Pára, confusa, a palpitar diante
Da luz mais bela dos seus grandes
olhos.
E aos mornos beijos, às carícias
ternas
Da luz, cerrando levemente os cílios,
Satânia os lábios úmidos encurva,
E da boca na púrpura sangrenta
Abre um curto sorriso de volúpia...
Notas de Vocabulário
alcova: quarto de dormir;
rutilante: muito brilhante,
resplandecente;
arfar: ansiar, ofegar;
túmido: saliente,
proeminente; espádua: ombro;
recôncavo: cavidade funda;
gruta;
coral: cor
vermelho-amarelada, característica das colônias
de coral;
Satânia: feminino de Satã: o
demônio, o tentador;
volúpia: grande prazer dos
sentidos.
Exercícios
TEXTO 1
Pixinguinha
Tu és divina e
graciosa, / Estátua majestosa do amor / por Deus esculturada /e formada com
ardor / da alma da mais linda flor, / de mais ativo olor, / que na vida é
preferida pelo
beija-flor. / Se Deus
me fora tão clemente
aqui neste ambiente
de luz, / formado numa tela deslumbrante e bela, / teu coração junto ao meu
lanceado / pregado e crucificado sobre a rosa cruz / do arfante peito seu. / Tu
és a forma ideal, / estátua magistral, oh! Alma perenal do meu primeiro amor.
TEXTO 2
SINFONIA
Meu coração, na
incerta adolescência, / outrora, Delirava e sorria aos raios matutinos / Num
prelúdio incolor, como o
allegro da /
aurora,Em sistros e clarins, em pífanos e sinos. / Meu coração, depois pela
estrada sonora / Colhia a cada passo os amores e os hinos, / E ia de beijo em
beijo, em lasciva demora, / Num voluptuoso adágio de harpas e violinos. / Hoje,
meu coração, num scherzo de ânsias, / Arde em flautas e oboés, na inquietação
da tarde, / E entre esperanças foge e entre saudades erra ... (...)
O texto 1 é a letra de uma canção
popular de Pixinguinha, gravada no início do século XX; o texto 2 é um
poema parnasiano de Olavo Bilac, do século XIX. Apesar do tempo
que os separa, o texto 1 aproxima-se do texto 2 pelo registro do
seguinte aspecto:
a) mal-do-século e espiritualismo.
b) nativismo e bucolismo.
c) uso de palavras raras.
d) referências à mitologia.
e) objetividade e racionalismo.
“Torce, aprimora, alteia,
lima
A frase; e, enfim,
No verso de ouro engasta a rima
Como um rubim.
A frase; e, enfim,
No verso de ouro engasta a rima
Como um rubim.
Quero a estrofe
cristalina,
Dobrada ao jeito
Do ourives, saia da oficina
Sem um defeito”.
Dobrada ao jeito
Do ourives, saia da oficina
Sem um defeito”.
(Olavo Bilac, “Profissão de Fé”, Poesias)
2. (FUVEST) Nos versos acima, a atividade poética é comparada ao
lavor do ourives, porque, para o autor:
a) a poesia é preciosa como um rubi;
b) poeta é um burilador;
c) na poesia não pode faltar a rima;
d) o poeta não se assemelha a um artesão;
e) o poeta emprega a chave de ouro.
a) a poesia é preciosa como um rubi;
b) poeta é um burilador;
c) na poesia não pode faltar a rima;
d) o poeta não se assemelha a um artesão;
e) o poeta emprega a chave de ouro.
3. (FUVEST) Pode-se inferir do texto acima que, para Olavo Bilac,
o ideal da forma literária é:
a) a libertação
b) a isometria
c) a estrofação
d) a rima
e) a perfeição
a) a libertação
b) a isometria
c) a estrofação
d) a rima
e) a perfeição
4. (FUVEST) Dentre as seguintes passagens, extraídas de
poemas de outros autores, assinale aquela que pode ser considera-da uma
reiteração da proposta contida no fragmento de “Profissão de Fé”.
a) “Este verso, apenas um arabesco / em torno do elemento essencial - inatingível”.
b) “Assim eu quereria o meu último poema / Que fosse terno dizendo as coisas, mais simples e menos intencionais”
c) “Musa (...) dá-me o hemistíquio d’ouro, a imagem atrativa,/ rima (...) / a estrofe limpa e viva”
d) Mundo mundo vasto mundo,/ se eu me chamasse Raimundo / seria uma rima, não seria uma solução”
e) “Catar feijão se limita com escrever: / joga-se os grãos na água do alguidar / e as palavras na folha de papel”
a) “Este verso, apenas um arabesco / em torno do elemento essencial - inatingível”.
b) “Assim eu quereria o meu último poema / Que fosse terno dizendo as coisas, mais simples e menos intencionais”
c) “Musa (...) dá-me o hemistíquio d’ouro, a imagem atrativa,/ rima (...) / a estrofe limpa e viva”
d) Mundo mundo vasto mundo,/ se eu me chamasse Raimundo / seria uma rima, não seria uma solução”
e) “Catar feijão se limita com escrever: / joga-se os grãos na água do alguidar / e as palavras na folha de papel”
5. (FUVEST) Indique, dentre os versos abaixo, aquele que,
sob o ponto de vista da métrica, tem a mesma contagem de sílabas do verso:
Do ourives, saia da oficina:
a) “A natureza apática esmaece”
b) “Minha terra tem palmeiras”
c) “Dobra o sino... soluça um verso de Direceu...”
d) “Não morrrerás, Deusa sublime”
e) “São Paulo! comoção de minha vida...”
Do ourives, saia da oficina:
a) “A natureza apática esmaece”
b) “Minha terra tem palmeiras”
c) “Dobra o sino... soluça um verso de Direceu...”
d) “Não morrrerás, Deusa sublime”
e) “São Paulo! comoção de minha vida...”
6. (UF-ES) O ideal parnasiano do culto da “arte pela arte”
significa que o objeto do poeta é criar obras que expressem:
a) um conteúdo social, de interesse universal.
b) a noção do progresso de sua época.
c) uma mensagem educativa, de natureza moral.
d) uma lição de cunho religioso.
e) o Belo, criado pelo perfeito uso dos recursos estilísticos.
a) um conteúdo social, de interesse universal.
b) a noção do progresso de sua época.
c) uma mensagem educativa, de natureza moral.
d) uma lição de cunho religioso.
e) o Belo, criado pelo perfeito uso dos recursos estilísticos.
7. (CFET-PA) Todas as afirmações abaixo estão corretas, com
exceção de:
a) O Parnasianismo é a manifestação poética do Realismo, mais voltada para o concreto.
b) Os parnasianos assumiram o sentimentalismo quanto à observação da realidade, pregando uma atitude pessoal.
c) Os parnasianos, negando a emoção, cultuam a Razão e revalorizam a Antigüidade Clássica.
d) O Parnasianismo é uma estética preocupada com a arte pela arte, a poesia pela poesia.
e) Os parnasianos fixam-se na observação de regras poéticas e têm, por isso, uma linguagem rebuscada e artificial.
a) O Parnasianismo é a manifestação poética do Realismo, mais voltada para o concreto.
b) Os parnasianos assumiram o sentimentalismo quanto à observação da realidade, pregando uma atitude pessoal.
c) Os parnasianos, negando a emoção, cultuam a Razão e revalorizam a Antigüidade Clássica.
d) O Parnasianismo é uma estética preocupada com a arte pela arte, a poesia pela poesia.
e) Os parnasianos fixam-se na observação de regras poéticas e têm, por isso, uma linguagem rebuscada e artificial.
8. (UF-PA) À subjetividade romântica os parnasianos contrapuserem
a impessoalidade objetiva; Bilac, parnasiano por exce-lência, por vezes foge do
rigorismo objetivista de sua escola como, por exemplo, nos versos em que o eu
do poeta se manifesta claramente. É o que se vê em:
a) Fernão Dias Paes Leme agoniza. Um lamento / Chora largo, a rolar na longa voz do vento.
b) Pára! Uma terra nova ao teu olhar fulgura! / Detém-te! Aqui, de encontro a verdejantes plagas.
c) E eu, solitário, volto a face, e tremo, / Vendo o teu vulto que desaparece.
d) Chega de baile. Descansa! / Move a ebúrnea ventarola.
e) E ei-la, a morte! E ei-lo, o fim! A palidez aumenta; Fernão Dias se esvai, numa síncope lenta.
a) Fernão Dias Paes Leme agoniza. Um lamento / Chora largo, a rolar na longa voz do vento.
b) Pára! Uma terra nova ao teu olhar fulgura! / Detém-te! Aqui, de encontro a verdejantes plagas.
c) E eu, solitário, volto a face, e tremo, / Vendo o teu vulto que desaparece.
d) Chega de baile. Descansa! / Move a ebúrnea ventarola.
e) E ei-la, a morte! E ei-lo, o fim! A palidez aumenta; Fernão Dias se esvai, numa síncope lenta.
9. (UM-SP) Assinale a alternativa que não se aplica à
estética parnasiana.
a) predomínio da forma sobre o conteúdo.
b) tentativa de superar a sentimento romântico.
c) constante presença da temática da morte.
d) correta linguagem, fundamentada nos princípios dos clássicos.
e) predileção pelos gêneros fixos, valorizando o soneto.
a) predomínio da forma sobre o conteúdo.
b) tentativa de superar a sentimento romântico.
c) constante presença da temática da morte.
d) correta linguagem, fundamentada nos princípios dos clássicos.
e) predileção pelos gêneros fixos, valorizando o soneto.
Outros Poemas
A velhice
Olha estas velhas
árvores, mais belas
Do que as árvores moças, mais amigas
Tanto mais belas quanto mais antigas,
Vencedoras da idade e das procelas...
O homem, a fera e o inseto, à sombra dela
Vivem, livres da fome e de fadigas:
E em seus galhos abrigam-se as cantigas
E os amores das aves tagarelas.
Não choremos, amigo, a mocidade!
Envelheçamos rindo. Envelheçamos
Como as árvores fortes envelhecem,
Na glória de alegria e da bondade,
Agasalhando os pássaros nos ramos,
Dando sombra e consolo aos que padecem!
Do que as árvores moças, mais amigas
Tanto mais belas quanto mais antigas,
Vencedoras da idade e das procelas...
O homem, a fera e o inseto, à sombra dela
Vivem, livres da fome e de fadigas:
E em seus galhos abrigam-se as cantigas
E os amores das aves tagarelas.
Não choremos, amigo, a mocidade!
Envelheçamos rindo. Envelheçamos
Como as árvores fortes envelhecem,
Na glória de alegria e da bondade,
Agasalhando os pássaros nos ramos,
Dando sombra e consolo aos que padecem!
Língua Portuguesa
Última flor do Lácio,
inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amo-te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
Em que da voz materna ouvi: "meu filho!"
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amo-te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
Em que da voz materna ouvi: "meu filho!"
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!
Um beijo
Foste o beijo melhor
da minha vida,
Ou talvez o pior...Glória e tormento,
Contigo à luz subi do firmamento,
Contigo fui pela infernal descida!
Morreste, e o meu desejo não te olvida:
Queimas-me o sangue, enches-me o pensamento,
E do teu gosto amargo me alimento,
E rolo-te na boca malferida.
Beijo extremo, meu prêmio e meu castigo,
Batismo e extrema-unção, naquele instante
Por que, feliz, eu não morri contigo?
Sinto-te o ardor, e o crepitar te escuto,
Beijo divino! e anseio, delirante,
Na perpétua saudade de um minuto...
Ou talvez o pior...Glória e tormento,
Contigo à luz subi do firmamento,
Contigo fui pela infernal descida!
Morreste, e o meu desejo não te olvida:
Queimas-me o sangue, enches-me o pensamento,
E do teu gosto amargo me alimento,
E rolo-te na boca malferida.
Beijo extremo, meu prêmio e meu castigo,
Batismo e extrema-unção, naquele instante
Por que, feliz, eu não morri contigo?
Sinto-te o ardor, e o crepitar te escuto,
Beijo divino! e anseio, delirante,
Na perpétua saudade de um minuto...
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