quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Texto do Realismo e Naturalismo


Realismo/Naturalismo
Texto
O primeiro beijo
                                                     Machado de Assis
Tinha dezessete anos; pungia-me um buçozinho que eu forcejava por trazer a bigode. Os olhos, vivos e resolutos, eram a minha feição verdadeiramente máscula. Como ostentasse certa arrogância, não se distinguia bem se era uma criança, com fumos de homem, se um homem com ares de menino. Ao cabo, era um lindo garção, lindo e audaz, que entrava na vida de botas e esporas, chicote na mão e sangue nas veias, cavalgando um corcel nervoso, rijo, veloz, como o corcel das antigas baladas, que o romantismo foi buscar ao castelo medieval, para dar com ele nas ruas do nosso século. O pior é que o estafaram a tal ponto, que foi preciso deitá-lo à margem, onde o realismo o veio achar, comido de lazeira e vermes, e, por compaixão, o transportou para os seus livros.
Sim, eu era esse garção bonito, airoso, abastado; e facilmente se imagina que mais de uma dama inclinou diante de mim a fronte pensativa, ou levantou para mim os olhos cobiçosos. De todas porém a que me cativou logo foi uma... uma... não sei se diga; este livro é casto, ao menos na intenção; na intenção é castíssimo. Mas vá lá; ou se há de dizer tudo ou nada. A que me cativou foi uma dama espanhola, Marcela, a linda Marcela, como lhe chamavam os rapazes do tempo. E tinham razão os rapazes. Era filha de um hortelão das Astúrias; disse-mo ela mesma, num dia de sinceridade, porque a opinião aceita é que nascera de um letrado de Madri, vítima da invasão francesa, ferido, encarcerado, espingardeado, quando ela tinha apenas doze anos.
Cosas de España. Quem quer que fosse, porém, o pai, letrado ou hortelão, a verdade é que Marcela não possuía a inocência rústica, e mal chegava a entender a moral do código. Era boa moça, lépida, sem escrúpulos, um pouco tolhida pela austeridade do tempo, que lhe não permitia arrastar pelas ruas os seus estouvamentos e berlindas; luxuosa, impaciente, amiga de dinheiro e de rapazes.

1.     Por que se pode afirmar que a visão que o narrador tem da sua personalidade aos 17 anos não é idealizado?

2.     Que observações o narrador faz sobre o romantismo?


3.    “De todas porém a que me cativou logo foi uma... uma... não sei se diga, este livro é casto, ao menos na intenção, na intenção é castíssimo. Mas vá lá; ou se há de dizer tudo ou nada.” Este período nos faz esperar que tipo de descrição da personagem Marcela? Por quê?

4.      Quais os traços marcantes da personalidade de Marcela?

O Realismo/Naturalismo tem início no Brasil em 1881 com os livros “Memórias póstumas de Brás Cubas” (Realismo), de Machado de Assis e “O mulato” (Naturalismo), de Aluísio Azevedo.
Contexto Histórico
A segunda metade do século XIX se caracterizou pela consolidação do poder da burguesia e o crescimento do proletariado.
Se por um lado havia o progresso, representado pelo crescimento das cidades, pela instalação de fabricas, pela utilização de novas fontes de energia, como o vapor, o petróleo, o gás e eletricidade, por outro lado havia o crescimento dos bairros pobres onde residiam os operários e suas famílias.
Enquanto a burguesia lutava pelo dinheiro e pelo poder através da expansão capitalista, o operariado vivendo em condições miseráveis, manifestava a sua insatisfação, promovia as primeiras greves e criava associações que dariam origem aos sindicatos.
A ciência, devendo servir ao progresso industrial e a objetivos práticos, necessitava de novos métodos e, principalmente, de organização.
São alguns avanços desse período: a energia elétrica, a indústria do frio e com ela a conservação de alimentos, a utilização do éter como anestésico, o descobrimento dos micro-organismos responsáveis pela sífilis, pela malária e pela tuberculose etc. somados a isso, há o incremento do transporte ferroviário e marítimo e a expansão da comunicação telegráfica.
O desenvolvimento cientifico fez com que o idealismo e o tradicionalismo fossem substituídos pelo materialismo e pelo racionalismo. O método científico passou a ser o meio de analise e compreensão da realidade.
Algumas teorias, surgidas em decorrência das solicitações matérias da época, deram fundamento ideológico à literatura do Realismo/Naturalismo. São elas:

·         Teoria determinista (Hippolyte Taine): apregoa que o comportamento humano é determinado pela hereditariedade, pelo meio e pelo momento (circunstância).

·         Evolucionismo (Charles Darwin): Defende a tese de que o homem descende de animais inferiores e que na vida animal há uma luta contínua pela existência, da qual resultaria na sobrevivência dos mais aptos, por um processo de seleção natural.

·         Filosofia positivista (August Comte): aplicando o conceito de “evolução” ao pensamento humano, defende a tese de que a humanidade estaria entrando no terceiro ciclo de sua evolução, o ciclo positivo da era cientifica, depois de ter passado pelo teológico e pelo metafísico. Defende ainda que os únicos meios de se atingir o conhecimento válido são a observação, experimentação e comparação.


Características
O Naturalismo não é independente do Realismo. Ambos tem como objeto de observação a realidade exterior; ambos são postos em relevo pela literatura no mesmo período. O Naturalismo incorporou ao Realismo o cientificismo da época, o determinismo e a crença de que os homens estariam condicionados pela hereditariedade, pelo meio e pelas circunstâncias, criando daí romances que são verdadeiras teses cientificas, nos quais o artista cria situações de causa e efeito para melhor descrever atitudes e personalidades, evidenciando preocupações patológicas.
·         Veracidade: desprezando a imaginação romântica, o realista procura narrar fatos que tenham seus correspondentes na realidade exterior, evitando situações que possam parecer artificiais ou improváveis.
·         Contemporaneidade: ao contrario dos românticos, que se evadiam para um mundo situado no passado ou no futuro, o realista procura a realidade que lhe é contemporânea.
·         Retrato fiel das personagens: na busca da verdade, o realista prefere retratar tipos concretos, vivos, não – idealizados. Por coincidir com o desenvolvimento da psicologia, o Realismo, além de retratar, procura interpretar o caráter da personagem e os motivos de suas ações. É comum a caracterização de indivíduos que representem aspectos negativos da natureza humana: o avarento, o covarde, o ambicioso, o fraco, o mesquinho, a adúltera, a prostituta etc.
·         Gosto pelos detalhes específicos: objetivando precisão e fidelidade, o realista não abre mão dos detalhes e minúcias na caracterização das personagens e ambientes, na observação de atitudes e sentimentos, isso também contribui para uma certa lentidão da narrativa.
·         Materialização do amor: ao contrario do romântico, que tem uma visão espiritual e sentimental do amor, o realista se volta para o aspecto físico. O homem passa a ver a mulher como objeto de prazer e é comum a temática do adultério e dos crimes passionais.
·         Denúncia das injustiças sociais: acreditando numa função social da arte, os realistas fazem dela uma arma de combate e denúncia das diferenças sociais, mostrando os preconceitos, a hipocrisia, a ambição dos homens e a exploração das classes menos favorecidas.
·         Determinismo e relação da causa x efeito: o realista procura uma explicação logica para as atitudes das personagens, considerando a soma de fatores que justificam suas ações. Na literatura naturalista, dá-se ênfase no instinto, ao meio ambiente e a hereditariedade como forças determinantes do comportamento dos indivíduos.
·         Linguagem próxima a realidade e preocupação formal: o universo semântico do realista retrata a realidade cotidiana. Enquanto o romântico tem como palavras – chave estrela, sonho, ave, lua, sentimento, mar, etc., o realista utiliza-se de palavras menos nobres e até mesmo vulgares: peixaria, tuberculose, moléstia, moedas, cebolas, carne, podridão etc. A linguagem realista é simples, natural, correta, clara e equilibrada.
·         Visão determinista e mecanicista do homem: o homem é considerado como um animal sujeito a forças que determinam o seu comportamento: o meio, o instinto, a hereditariedade e o momento.
·         Cientificismo: os naturalistas procuravam observar o homem objetivamente, considerando-o como um caso a ser analisado cientificamente.
·         Personagens patológicas: procurando comprovar suas teses deterministas, os naturalistas preferiam personagens mórbidas, adúlteras, psiquicamente desequilibradas, assassinos, bêbados, miseráveis, doentes, prostitutas etc.
·         Crítica social e reformismo: denunciando o drama da existência, os naturalistas visavam modificações que alterassem o quadro negativo da realidade social.
·         Incorporação de termos científicos e profissionais: é comum o vocabulário ligado a medicina, a biologia, a psicologia e as atividades profissionais, sobretudo as exercidas pelas camadas menos favorecidas.
Texto
Conceição
                                      Machado de Assis
A família era pequena, o escrivão, a mulher, a sogra e duas escravas. Costumes velhos. Às dez horas da noite toda a gente estava nos quartos; às dez e meia a casa dormia. Nunca tinha ido ao teatro, e mais de uma vez, ouvindo dizer ao Meneses que ia ao teatro, pedi-lhe que me levasse consigo. Nessas ocasiões, a sogra fazia uma careta, e as escravas riam à socapa; ele não respondia, vestia-se, saía e só tornava na manhã seguinte. Mais tarde é que eu soube que o teatro era um eufemismo em ação. Meneses trazia amores com uma senhora, separada do marido, e dormia fora de casa uma vez por semana.
Conceição padecera, a princípio, com a existência da comborça; mas, afinal, resignara-se, acostumara-se e acabou achando que era muito direito.
Boa Conceição! Chamavam-lhe "a santa", e fazia jus ao título, tão facilmente suportava os esquecimentos do marido. Em verdade, era um temperamento moderado, sem extremos, nem grandes lágrimas nem grandes risos. No capítulo de que trato, dava para maometana; aceitaria um harém, com as aparências salvas. Deus me perdoe, se a julgo mal. Tudo nela era atenuado e passivo. O próprio rosto era mediano, nem bonito nem feio. Era o que chamamos uma pessoa simpática. Não dizia mal de ninguém, perdoava tudo. Não sabia odiar; pode ser até que não soubesse amar.

1.     Como é caracterizada a família descrita no trecho? (Da alta burguesia? Da classe média? Idealizada? Pobre? Rica? De hábitos sofisticados ou simples?)

2.     Por que se pode afirmar que o ambiente doméstico desta família se caracteriza pela dissimulação (disfarce, fingimento, hipocrisia)?

3.     “O próprio rosto era mediano, nem bonito nem feio.” Que avaliação da personalidade de Conceição corresponde a essa descrição física?


4.    O que sobressai no texto a descrição física ou a análise psicológica da personagem?

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